Tão fantasiosa quanto a existência de uma realeza brasileira, extinta há mais de um século no Brasil, está a negação do racismo no país. “Não há problema racial’ no Brasil disse Bertrand de Orleans e Bragança, herdeiro da família imperial. A opinião foi dada durante seminário realizado pelo Itamaraty, do chanceler Ernesto Araújo, na terça-feira (16).
A afirmação do remanescente do período colonial acontece em meio a debates acalorados sobre a violência policial e aumento de protestos contra o racismo no mundo.
Como registra o colunista do Uol, Jamil Chade, para Bertrand “estão tentando criar esse problema”, porque “Aqui [Brasil], todos nos damos bem”, sugeriu. Ao falar das qualidades do país, ele citou a existência de um povo “pacífico”, mas também marcado pela “doçura e lealdade”, disse na palestra.
“Sua Alteza Imperial Real“
O colunista destaca que no material de promoção do evento, Orleans e Bragança foi apresentado como “S. A. I. R.”, que significa “Sua Alteza Imperial Real”, um título que desapareceu no país com a chegada da República (1889). No evento, Bertrand foi apresentado como um descende da casa real francesa, austríaca e portuguesa, além de uma “longa tradição de heróis, reis e santos”. Por ter sido apresentado assim, dom Bertrand foi parar nos “trends topics” (assuntos mais comentados) do Twitter.
Todo mundo ja sabe, so falta os Orleans e Bragança pic.twitter.com/npp1K0b3Wq
— Rainha do Mundo (@Thirasga) June 17, 2020
O autodenominado “príncipe” ainda avaliou que o movimento monárquico “nunca foi tão forte como hoje”, no Brasil. Orleans e Bragança tem como um de seus feitos, anunciado na cerimônia, a publicação de um livro sobre a “psicose ambientalista”, em que critica o movimento verde.
Vidas negras importam
No mesmo dia do discurso no Itamaraty, mais de cem entidades brasileiras foram à ONU para denunciar o racismo no país. Segundo a Coalizão Negra por Direitos, em 2017, dos mais de 65.000 homicídios no Brasil, 49.500 eram afro-brasileiros.
“Entre 2007 e 2017, mais de 400.000 afro-brasileiros foram mortos sob violência policial, disputas entre gangues, mas acima de tudo, vítimas de discriminação racial histórica e racismo estrutural no Brasil”, denunciaram as entidades que também lançaram, domingo (14), o manifesto “Com Racismo Não Há Democracia”.
“O brutal assassinato de George Floyd demonstra isso através das revoltas e manifestações nas ruas, e a demanda por justiça racial é global”, afirmam as organizações.
Pelo seu Twitter, a deputada federal Fernanda Melchionna (Psol-RS), lamentou a atitude do herdeiro imperial.
Lamentável que se dê espaço no Itamaraty para um arremedo de elite caricata que não aceitou o fim da monarquia e da escravidão. Orleans e Bragança diz que não existe racismo no Brasil. O que não existe é paciência p/ gente lunática e racista aqui. E nem príncipe em uma República.
— Fernanda Melchionna (@fernandapsol) June 17, 2020