Desde que o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou que o Ministério da Saúde adote ações urgentes para evitar o prejuízo de R$ 1,23 bilhão com a perda de 28 milhões de doses de vacinas contra a Covid-19, o governo não apresentou soluções.
A decisão do ministro Vital do Rêgo foi tomada no dia 15 de junho e diz respeito a doses que estão com data de vencimento previstas para os próximos dois meses. Na última segunda-feira (20), o secretário de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde, Arnaldo Medeiro, afirmou que a pasta “trabalha em estratégias” para não perder as doses.
Leia também: 48% dos brasileiros reprovam governo Bolsonaro
A maioria das doses próximas ao vencimento – 26 milhões – são do laboratório AstraZeneca. Outro 1,9 milhão são da Pfizer.
A decisão do TCU considerou como grave o fato de o governo federal estar prestes à perder o montante de imunizantes.
“Num país em desenvolvimento como é o Brasil, em que foram perdidas mais de 668.000 vidas para a Covid-19 até hoje, num momento em que estamos enfrentando uma nova onda de contaminação por esse vírus que vem assolando todo o território nacional indistintamente, termos notícia de que estamos prestes a perder mais de 28 milhões de doses de vacina nos próximos dois meses e meio, num prejuízo de quase R$ 1,23 bilhão, é no mínimo estarrecedor”, escreveu o ministro Vital do Rêgo no despacho.
As 28 milhões de doses vencem em julho e agosto, porém de acordo com a Secretaria de Controle Externo da Saúde (SecexSaúde), do TCU, “outras tantas vencerão nos meses seguintes, vislumbrando-se a iminência de que muitas sejam perdidas sem que cheguem a ser distribuídas para os estados e aplicadas na população a tempo”.
O relatório do TCU mostra que o governo federal tem em estoque 85,7 milhões de doses de vacinas contra a Covid para adultos e outras 4,3 milhões de doses pediátricas.
Leia também: 16 escândalos de corrupção no governo Bolsonaro
Cada dose de AstraZeneca custou aos cofres públicos R$ 41,83, enquanto a Pfizer R$ 66,89.
“Há notícias de que existem mais itens já distribuídos para os estados que não foram integralmente aplicados e podem estar igualmente vencendo sem provável utilização, aumentando o número de perdas de vacinas”, diz o relatório.
Como justificativa para a situação, o Ministério da Saúde chegou a responsabilizar estados e municípios e a própria população, que estaria rejeitando as marcas Oxford/AstraZeneca.
No entanto, durante uma reunião do Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Saúde (Conass), realizada no dia 13 de junho, os gestores estaduais foram surpreendidos com a informação de que haveria tantas doses em estoque.
Contradições entre o sistema público e privado de saúde
Também no despacho, Vital do Rêgo, afirmou que “a rede privada de saúde deverá começar a aplicar a vacina da AstraZeneca, cuja importação dos EUA ultrapassou um milhão de doses, pela qual deverão ser cobrados de R$ 250 a R$ 350 por dose pelas clínicas privadas”.
O ministro destacou o inusitado da situação, que tem, por um lado, um estoque público elevado de vacinas que podem ser perdidas e, por outro, novas aquisições internacionais pelo setor privado de saúde.
De acordo com o secretário Arnaldo Medeiros, o Ministério da Saúde vai distribuir as doses aos estados e municípios. Porém, ele não detalhou como será realizada essa distribuição.
Apenas convocou a população para ir até os postos de saúde e completar o esquema vacinal. O próprio Ministério da Saúde informou que 22 milhões de brasileiros ainda não tomaram a segunda dose da vacina. Outros 62 milhões ainda não receberam o primeiro reforço.
Leia também: Com Pix para caminhoneiros e aumento do Auxílio Brasil, Bolsonaro viola lei eleitoral
Além de 27 milhões que estão com a segunda dose de reforço em atraso. “A gente está cada vez mais procurando distribuir todas essas doses com estratégias para avançarmos nesta campanha. O Ministério da Saúde está fazendo todo o trabalho para que nenhuma dose seja perdida. Estamos convocando a população brasileira para tomar essas doses. Se quem é apto a tomar seu primeiro e segundo reforço procurar o posto de vacinação, certamente nenhuma dose será perdida”, disse o secretário.
O secretário disse, ainda, que cabe às farmacêuticas buscarem a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para pedir a ampliação do prazo de validade das vacinas.
Ajuda humanitária dos EUA que se tornou prejuízo para o Brasil
Outra questão que o TCU questionou ao Ministério da Saúde é porque a pasta aceitou receber 85 milhões de itens chineses doados por uma distribuidora de equipamentos hospitalares dos Estados Unidos e que se tornaram um prejuízo milionário ao Brasil.
A doação de aventais hospitalares, oferecidos como ajuda humanitária para o combate do coronavírus pela distribuidora estadunidense, Mackesson Medical Surgical, e que mofaram.
As peças viriam ao Brasil em 900 contêineres até o Porto de santos, onde o governo brasileiro assumiria os custos de desembaraço alfandegário, o que inclui, transporte, estocagem e distribuição.
A ajuda tem valor estimado em 155 milhões de dólares (aproximadamente R$ 810 milhões), mas o material se mostrou imprestável e a incineração deste vai custar R$ 10 milhões ao governo federal e demorar sete meses. Enquanto isso, o Brasil banca os custos de armazenamento.
Leia também: Com sigilos, governo Bolsonaro joga escândalos para debaixo do tapete
O ministro Vital do Rêgo pediu que o Ministério da Saúde explique o processo de tomada de decisões para aceitação dos aventais cirúrgicos.
Técnicos do TCU questionam sobre a qualidade do material. “As evidências não deixam dúvidas quanto ao péssimo estado de algumas caixas de aventais, sendo possível verificar que estão molhadas, rasgadas, com exposição de alguns itens sem qualquer invólucro protegendo-os, de maneira que não se contesta a decisão de descartar essa parte do material”, diz a instrução processual.
Em nota o Ministério da Saúde confirmou que o material não tem condições de uso e será descartado.