Lideranças indígenas como Sonia Guajajara, entidades e antropólogos reiteram alerta de que a situação é muito grave
Os últimos dados, coletados por associações indígenas e pesquisadores mostram que nessa segunda-feira (1/6) havia 178 mortes entre 78 povos que vivem em 14 Estados brasileiros. Os números são da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), referência do movimento indígena no país, e apontam que a doença se alastra entre os indígenas, que somam 1.809 contaminados.
Os dados oficiais, do governo, estão defasados e isso preocupa lideranças indígenas, entidades e antropólogos, que alertam: a situação é muito grave.
O Ministério da Saúde alega não divulgar as etnias e as localidades de cada caso, “por respeito ético”, diz em nota ao Valor. “Não queremos ser invisíveis. São vidas que foram interrompidas”, rebate Sonia Guajajara, coordenadora-executiva da Apib.
“A alguns foi negada a vida, a história e agora está sendo negada a morte. Vamos fazer registros”, promete a líder indígena ao mencionar o Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena.
Sonia destaca que a reação inicial da Apib foi rápida. “Trouxemos muitas orientações, desde os cuidados de higiene até o bloqueio na entrada das aldeias, para que ninguém entrasse ou saísse. Pedimos para quem estivesse circulando voltasse imediatamente às aldeias”, diz. “O pessoal entendeu que era grave”.
Ela diz que a entidade que coordena agiu de forma a sensibilizar os povos a permanecerem em suas aldeias e para que não recebessem visitas externas. “Nas aldeias próximas às cidades, entram muitos vendedores ou missionários. A ideia era só deixar entrar as equipes de saúde”.
Sonia Guajajara, que em 2018 foi candidata a vice-presidente da República pelo PSOL, explica que tudo “estava indo bem até que o presidente Bolsonaro disse que (a pandemia) era histeria da imprensa. Isso gerou confusão na cabeça das pessoas”, reportou Sonia, que questiona: “Como a Apib diz que não pode sair, mas o presidente diz que sim?
Mais de 250 povos indígenas no Brasil
A líder indígena reitera a diversidade que existe entre os mais de 250 povos indígenas no Brasil, de diferentes níveis de contato e situação territorial. “Os que estão mais próximos de cidades são mais dependentes da vida urbana, onde estudam, trabalham e vendem artesanatos”,explica.
“A contaminação está chegando agora e pode significar o extermínio de povos. Precisamos agir para evitar um genocídio”, diz ela.
Na mesma linha, Tiago Moreira, pesquisador do programa de monitoramento de áreas protegidas do Instituto Socioambiental (ISA), diz que “Quando se fala em povos indígenas, estamos falando em microsociedades, com língua, conhecimento e tradições próprias”.
“Se a pandemia tiver o impacto europeu entre os índios, atingindo os mais velhos, matará os guardiões da cultura de muitos povos. A morte destas pessoas representa uma perda muito grande”, lamenta ele.
Sesai
Segundo a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), braço do SUS criado em 2010 para dar atenção básica aos índios, em 31 de maio havia 51 mortes e 1.312 contaminados. Ao Valor, a secretaria informou que atende apenas aos “habitantes de terras indígenas homologadas”, com assistência médica básica aos índios “aldeados”. Quando o caso se agrava, como acontece entre os doentes de covid-19, essa população precisa aos hospitais nas cidades.
O Amazonas, Estado mais indígena do país e que vem sofrendo duramente com a pandemia, lidera o número de mortes também entre os índios. O Pará vem na sequência, com 29 mortes, e Pernambuco, com 10. E como se sabe, a logística na Amazônia é difícil, as distâncias, longas, e a infraestrutura, precária.
Com informações do Valor.