O parecer da Lei das Fake News pode prejudicar o combate à disseminação de informações falsas pelas redes sociais. É o apontam especialistas sobre dois dispositivos que serão apresentados pelo relator da proposta, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), nesta terça-feira (28).
O texto prevê a possibilidade de rápido restabelecimento judicial de contas ou postagens ligadas a políticos e instituições que violem regras das plataformas.
Uma espécie de tratamento especial para políticos com perfis no Facebook, TikTok, Twitter, YouTube e Instagram quando as postagens se tratarem de manifestações oficiais inerentes aos cargos que ocupam.
O que, de acordo com a Folha, poderia beneficiar cerca de 750 mil políticos e instituições e os respectivos perfis – sejam quantos forem.
Porque, aliado a isso, a proposta também prevê a extensão da imunidade parlamentar aos perfis dos detentores de imunidade parlamentar.
O que pode abrir brechas para publicações não apenas de fake news, mas que incitem a violência ou ameacem a democracia.
Relator defende deveres da plataforma
Orlando Silva, relator do projeto, afirma que a intenção é justamente o contrário. Ao prever celeridade judicial, também cria obrigações importantes para as contas consideradas de interesse público.
Elas ficam proibidas de bloquear o acesso de outras contas a esses perfis bem como de monetizar o conteúdo e se submeter aos princípios da administração pública.
“Quem ler o texto verá que o objetivo é o contrário. Nós estabelecemos deveres que devem ser cumpridos pelas contas de interesse público. A lei não é para proteger deputado. Ela apenas dá celeridade a decisões judiciais, pois são contas que, em tese, são de interesse público”, disse à Folha.
Mas especialistas discordam.
“Não se trata de uma mera repetição do que já está na Constituição. Abre margem para uma interpretação do Judiciário de que as plataformas são obrigadas a manter conteúdo de parlamentares, de que esse conteúdo é imune em relação às regras privadas da plataforma”, afirma também à Folha Francisco Brito Cruz, diretor do InternetLab, ao se referir à possibilidade de imunidade parlamentar nas redes.
“E nós sabemos que muitas vezes os parlamentares fazem publicações problemáticas nas redes sociais, que causam danos na vida real, incitam a violência”, completa.
Mas considera que a via rápida judicial para as contas de interesse público, ao contrário da imunidade parlamentar, é uma medida adequada.
“É uma solução inteligente pois, às vezes, as plataformas abusam de seu poder ao remover uma conta de interesse público que está sendo usada de maneira legítima”, ponderou.
‘Caixa preta’ das plataformas contra fake news
No mesmo relatório, o relator também pretende dar mais transparência à forma como é realizada a moderação dos conteúdos pelas plataformas.
O que é temido pelas big techs que alegam que, de posse dessas informações, usuários consigam burlar o sistema. Para pesquisadores, no entanto, é preciso detalhar o funcionamento do que consideram verdadeiras “caixas pretas” das plataformas.
O texto prevê a obrigatoriedade de que as taxas de detecção ativa de conteúdos irregulares – onde se incluem as fake news – por esses sistemas sejam divulgadas. O que inclui os critérios para a operação, o nível de precisão das tecnologias utilizadas, além das informações sobre o treinamento dos sistemas, o chamado machine learning, que é o aprendizado das máquinas.
Plataformas como meios de comunicação
A equiparação das plataformas de internet com os meios de comunicação é outro ponto polêmico.
De um lado, empresas e parte da sociedade civil afirmam que a equiparação vai contra o Marco Civil da Internet e temem a inviabilidade das plataformas no Brasil.
Tomando por base duas decisões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que equiparou as plataformas aos meios de comunicação.
Uma na ação que pedia a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão por disparos em massa durante a campanha eleitoral em 2018, rejeitada pela corte.
E, em outro momento, na ação que resultou na cassação do deputado estadual Fernando Francischini por fazer uma live no Facebook com alegações falsas de fraude na eleição de 2018.
As plataformas avaliam que terão que assumir a responsabilidade por conteúdos de terceiros. Atualmente, a responsabilização só ocorre se as plataformas não tomarem providências diante de ordens judiciais.
O deputado, no entanto, afirma que essa previsão se aplicaria somente ao contexto eleitoral nem viola o Marco Civil da Internet.