Os novos indícios que apontam Damares Alves – a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos – agindo nos bastidores para impedir que uma menina de 10 anos tivesse acesso ao aborto legal após anos de violência doméstica praticada pelo tio mobilizou parlamentares nesta segunda-feira (21).
Na última sexta, Damares já havia suscitado críticas ao defender, em entrevista ao apresentador Pedro Bial, que a criança deveria ter levado a gravidez adiante e feito uma cesárea, apesar do risco para a vida da menina.
A denúncia de hoje, feita pelo jornal Folha de S.Paulo, corrobora a narrativa de Damares. A reportagem revela que apesar de ter mantido silêncio público sobre o assunto, a ministra da Família agiu nos bastidores para transferir a criança de São Mateus (ES), onde vivia, para um hospital em Jacareí (SP), onde aguardaria a evolução da gestação e teria o bebê.
Para cumprir seu objetivo, ela também chegou a enviar representantes da pasta para pressionar os responsáveis por conduzir os procedimentos e revelou o paradeiro da vítima à extremista Sara Giromini. Na época, a bolsonarista mobilizou religiosos para protestar em frente ao hospital, causando um grande estardalhaço.
‘Gravíssimo’
Para o deputado pernambucano Tadeu Alencar (PSB) o relato feito pelo jornal é ‘gravíssimo”. “Gravíssima a denúncia da Folha […]. É um ataque ao Estatuto da Criança e do Adolescente e mais um ataque ao bom senso cometido pelo governo Bolsonaro”, definiu o parlamentar.
Pré-candidato do PCdoB à Prefeitura de São Paulo, o deputado Orlando Silva viu provas incontestáveis do crime cometido pela representante da ala ultraconservadora do atual governo. “Está provado que Damares e seus aliados tentaram impedir o aborto legal da criança abusada pelo tio. Avolumam-se as suspeitas de que vazaram os dados da menina. É uma gente ruim, criminosa. A ministra deve explicações ao Congresso”, afirmou.
Caso no MPF e Comissão de Ética
Líder do PSOL na Câmara, a deputada Sâmia Bomfim (SP) declarou que seu partido tomará providências para pedir punição à ministra. A Folha trouxe à tona provas de que Damares Alves atuou diretamente para tentar impedir a criança de 10 anos estuprada no Espírito Santos de realizar o aborto previsto em Lei. Estamos entrando com ação no Ministério Público Federal (MPF) e acionaremos a Comissão de Ética Pública contra a ministra”, elencou.
Manuela d’Ávila, pré-candidata do PCdoB à Prefeitura de Porto Alegre (RS), resumiu em uma única frase a postura de Damares diante do caso. “A ministra que defende o estuprador e ignora o sofrimento de uma criança de 10 anos”.
PSOL acionará LAI contra Damares
Para o deputado Ivan Valente (PSOL-SP), Damares é movida por “uma mistura de fanatismo com psicopatia”. “Exigimos, via [Lei de Acesso à Informação] LAI, respostas. Caso de prevaricação de inspiração medieval. […] Entraremos também com ação junto à PGR [Procuradoria-Geral da república] por violação da Constituição e do ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente]. […].
O representante do PSOL também recordou mais um caso de violação dos direitos da crianças, desta vez envolvendo o presidente brasileiro, que durante uma transmissão ao vivo no último dia 10 de setembro, fez insinuações sexuais a uma youtuber mirim. “Em conversa com [o apresentador Pedro] Bial, Damares defendeu que menina estuprada de dez anos não fizesse aborto. Ao mesmo tempo em que se recusou a ver o vídeo em que Bolsonaro fez insinuação sexual para uma criança em live. Em nome de supostos valores religiosos, Damares espalha ódio e hipocrisia!”, comentou.
O ex-ministro da Saúde, o deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) disse que, se as acusações forem reais, a representante do governo deve responder pela violação de direitos na Justiça. “Se comprovado que Damares agiu contra a justiça para evitar o aborto legal e amparado pela lei, de uma menina que foi estuprada pelo próprio tio, ela deverá responder por isso. Não podemos normalizar as atitudes da pasta”, comentou.
‘Não podem ficar impunes’
Companheira de partido, a deputada federal Érika Kokay (PT-DF) foi no mesmo caminho. “A Folha revela o que todos nós suspeitávamos: a ministra Damares Alves agiu para impedir a interrupção legal de gravidez da menina de 10 anos. Pior, representantes da ministra seriam os responsáveis por vazar o nome da criança. Cometeram crimes e não podem ficar impunes”.
Enquanto isso, Damares parte para o ataque…
Pela manhã, a ministra conseguiu criar uma nova polêmica envolvendo seu nome. Em resposta à pesquisadora Debora Diniz, que em uma rede social, abordou o caso, Damares ameaçou processá-la.
“1. Matéria desse jornal não é prova de absolutamente nada. 2. Equipe do Ministério vai a várias cidades para realizar o mesmo trabalho, em muitos o abusado é um menino. 3. A Sra. faz acusações sem provas e terá que responder a isso na Justiça, dona Débora”, disse Damares, que foi prontamente respondida.
“Ministra Damares não se enfurece com matéria da Folha, que descreve como sua equipe teria abusado do poder para impedir menina de abortar no Espírito Santo. Se enfurece com mensagem de dona Debora no Twitter. Bem, aqui estou presente para esperar suas explicações, Ministra”, retrucou a professora de Direito da Universidade de Brasília.