A economia circular tem como fundamento o melhor aproveitamento dos recursos naturais, evitando desperdícios e descartes. Ela pode ser aplicada para indivíduos, organizações e cidades. A produção de bens com o recírculo dos recursos utilizados, surgirão novas oportunidades de trabalho e negócios. A transição para o atual modelo econômico circular exige políticas públicas, linhas de financiamento e novos modelos de negócio.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) acaba de lançar a publicação Economia Circular: Caminho Estratégico para a Indústria Brasileira, que analisa o atual cenário do país em relação à economia circular, as perspectivas e quais ações poderiam conduzir a transição de um modelo de economia linear para o circular.
O lançamento da publicação foi feito durante o Encontro Economia Circular e a Indústria do Futuro, realizado dia 24 de setembro de 2019 em São Paulo (SP). O evento promoveu o debate sobre a adoção de princípios de circularidade e o desenvolvimento de novos mercados e cadeias produtivas para a indústria do futuro.
A economia circular tem sido objeto de atenção nos principais fóruns de governança global (G7 e G20) e nas decisões estratégicas das empresas. O Brasil enfrenta, no entanto, desafios institucionais para incluir novos modelos de negócios no processo produtivo. É preciso avaliar o potencial de inserção de práticas circulares na economia, identificar os obstáculos para a implementação dessa agenda e agir para viabilizá-la.
O encontro promovido pela CNI abordou três temas e seus objetivos: Políticas públicas, para fomentar o diálogo sobre a qualidade do ambiente regulatório favorável à transição para a economia circular; Modelos de negócio, para compartilhar experiências empresariais do Brasil e de outros países que gerem novos valores e maior competitividade para a indústria; e Financiamento, para identificar linhas de crédito que estimulem investimentos em inovação e novos modelos de negócios.
Um dos principais desafios ambientais do planeta é o atual modelo de produção-consumo-descarte, que tem elevado a cada ano o uso de recursos naturais e provocado o aumento do lixo em todo o mundo. O setor industrial avalia que o caminho para reverter esse cenário passa essencialmente pela economia circular, que é uma tendência mundial que engloba ações como reciclagem, reuso de água, logística reversa e medidas voltadas para o melhor aproveitamento de matérias-primas.
Na avaliação da diretora de Relações Institucionais da CNI, Mônica Messenberg, o avanço da economia circular no Brasil só será possível a partir do estabelecimento de um conjunto de políticas públicas e do aprimoramento de linhas de financiamento voltadas para estimular investimentos em inovação e novos negócios. Ela apontou como imprescindível a responsabilidade compartilhada entre setor produtivo, poder público, academia e consumidor.
“As políticas públicas são essenciais para criarmos um ambiente propício aos negócios, com regras claras e segurança jurídica para investimentos em economia circular”.
Mônica Messenberg, diretora da CNI
Para o primeiro-conselheiro da Delegação da União Europeia no Brasil, Rui Ludovino, o caminho para o país avançar em direção à economia circular começa pela ampliação da coleta seletiva e do tratamento de resíduos.
“Se não fizermos esse elo, o resto do ciclo não vai girar. Queremos colaborar e trabalhar em cooperação com o Brasil em diversos temas, como a economia circular”.
Rui Ludovino, primeiro-conselheiro da Delegação da União Europeia no Brasil
O coordenador-geral do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict), Tiago Braga, afirmou que a entidade tem trabalhado para adotar de forma estruturada a economia circular.
“Essa discussão tem se organizado em quatro pontos: capacitação, infraestrutura informacional, financiamento e, por fim, temos trabalhado em um mapa com a perspectiva de como o Brasil pode caminhar para promover a economia circular”.
Tiago Braga, coordenador-geral do Ibict
A secretária Nacional de Desenvolvimento Regional e Urbano, Adriana Melo, destacou, por sua vez, que a economia circular precisará de instrumentos de financiamento para avançar no país.
“Estamos trabalhando com o fortalecimento das capacidades e pretendemos estender para as organizações da sociedade civil e para pequenos municípios uma linha de ação que promova a aproximação das universidades e instituições de pesquisa. Assim, teremos a economia circular em projetos de áreas como saneamento básico. Esta é uma oportunidade para o governo federal”.
Adriana Melo, secretária Nacional de Desenvolvimento Regional e Urbano
De acordo com o gerente-executivo de Inovação e Tecnologia do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), Marcelo Prim, o programa Brasil Mais Produtivo – executado pelo SENAI em parceria com o governo federal – poderia ser adaptado também para a prática de economia circular. O Brasil Mais Produtivo leva processos de lean manufacturing e digitalização a pequenas e médias empresas. Já capacitou 3 mil indústrias, com ganho de produtividade médio de 52%.
Financiamento
O gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI, Davi Bomtempo, destacou que existe uma série de linhas de financiamento para práticas sustentáveis, mas ponderou que não há uma integração que favoreça investimentos nos diferentes setores da indústria.
“As queixas em relação à dificuldade de se obter financiamentos são principalmente em relação às exigências de garantias e de elaboração de projetos complexos”.
Davi Bomtempo, CNI
O painel sobre financiamento da economia circular reuniu representantes de instituições financeiras e de fomento, como o Banco Santander, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).
O gerente de Química, Metalurgia e Materiais da Finep, Henrique Vasquez, defende que as empresas sejam cada vez mais apresentadas a instrumentos de financiamento, pois muitas deixam de investir por falta de conhecimento.
“O que vejo é que falta às empresas, em geral, estabelecer uma governança, ter pessoal que trabalhe exclusivamente com inteligência e dedicação aos instrumentos de financiamento.”
Henrique Vasquez, Finep
Casos de Sucesso
Representantes de empresas que têm iniciativas de sucesso na área de economia circular debateram formas de o país ampliar ações voltadas ao uso mais eficiente dos materiais. O painel sobre modelo de negócios reuniu os casos da Nespresso Brasil, Instituto C&A, Braskem, ArcelorMittal, Flextronics no Brasil e Signify no Brasil (antiga Philips Iluminação).
O Centro de Reciclagem Nespresso, na Grande São Paulo, por exemplo, se dedica a reciclar as cápsulas de alumínio do café. A reciclagem do material é feita desde 2011 e conta com investimentos anuais de cerca de R$ 5 milhões. Mais de 80% dos consumidores têm acesso à reciclagem e o objetivo é alcançar 100% até 2020.
“Nossas ações focam em dar mais transparência ao nosso trabalho e à importância da destinação correta do alumínio, material infinitamente reciclável, e do pó de café, que se transforma em adubo.”
Cláudia Leite, gerente de Criação de Valor Compartilhado e Comunicação Corporativa da Nespresso no Brasil
O vice-presidente da Braskem, Edison Terra, contou que a empresa se dedica há anos a ações voltadas à sustentabilidade e citou a pesquisa segundo a qual 70% das empresas não conheciam o termo economia circular, embora mais de 76% adotem em seus processos alguma prática de economia circular, como reciclagem, reúso de água e logística reversa.
O diretor-geral da Signify no Brasil, Sergio Baptista, resumiu a importância que a economia circular ganhou no dia a dia das empresas. “Em um passado remoto a economia circular poderia ser encarada como uma agenda de marketing, mas hoje cada vez mais se transforma em uma agenda de negócios”, afirmou.
A escritora canadense, Lorraine Smith, especialista em Economia Regenerativa, destacou que não há outra opção para os países senão investir na economia circular. Ela fez a palestra de abertura do evento. “O encontro da CNI foi bem importante em dois sentidos: para integrar pessoas de diferentes setores em torno do assunto e para compartilhar experiências”, avaliou Lorraine.
Fonte: Portal da Indústria