O senador Flávio Bolsonaro (PL) disse à Justiça que usou a renda de seu trabalho como advogado para financiar parte da mansão de 2,4 mil metros quadrados por R$ 6 milhões em uma área nobre de Brasília.
A justificativa do filho do presidente sobre ter atuado como advogado faz parte da estratégia de defesa protocolada por ele, como resposta a uma ação no TJ-DFT (Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios) movida pela deputada federal Erika Kokay (PT-DF).
No entanto, não há qualquer registro de processo em que o filho do presidente atue como advogado no Distrito Federal e no Rio, tampouco em instâncias superiores. Mas como empresário do segmento de doces, sim. O próprio Flávio era sócio de uma franquia da Kopenhagen no Rio de Janeiro.
Inclusive, a venda da participação de 50% que ele tinha na sociedade e uma transação envolvendo outro imóvel no Rio de Janeiro teriam viabilizado a entrada da casa em quase R$ 2,9 milhões.
O Ministério Público do Rio suspeita que ele usava a franquia da Kopenhagen para lavar dinheiro com um suposto esquema de rachadinha montado em seu gabinete na Assembleia Legislativa no Rio de Janeiro.
Primeiro disse que era empresário
Quando a compra da mansão foi efetuada e amplamente divulgada pela imprensa no início de 2021, Flávio disse que o dinheiro ganhado como empresário permitiu fechar o negócio. Nessa época ele não fez nenhuma menção a recursos recebidos como advogado.
Na ação que pede apuração da origem do dinheiro pago pela mansão, a deputada Erika Kokay questiona a capacidade financeira do senador com uma renda mensal de quase R$25 mil, de obter um financiamento tão alto no BRB (Banco de Brasília) de R$ 3,1 milhões. O valor total da casa é de R$ 5,97 milhões.
Para rebater a argumentação da deputada, a defesa de Flávio aponta no processo que a renda familiar dos réus (Flávio e sua esposa, Fernanda Bolsonaro) vai além da remuneração pela atividade parlamentar.
“Visto que o mesmo (Flávio) atua como advogado, além de empresário e empreendedor, por muitos anos”, diz a peça.
O Estatuto da Advocacia permite que parlamentares advoguem, desde não seja contra a administração pública. Entretanto, advogado pode receber dinheiro em processos judiciais, fornecendo pareceres ou consultorias.
Porém, ao invés de responder que tipos de trabalho realizou para conseguir o dinheiro, quando questionado, Flávio Bolsonaro preferiu atacar Kokay.
“O processo [no TJDFT] movido por uma parlamentar petista, não tem qualquer fundamento e serve apenas como uma tentativa de autopromoção em véspera eleitoral”, disse por meio de nota.
Além disso, o senador afirma que “o banco que concedeu o financiamento [BRB], assim como todas as instituições financeiras no Brasil, segue um rigoroso ‘compliance’ e está sujeito a regras regulatórias e de fiscalização que impedem qualquer irregularidade”.
Rachadinhas e o clã Bolsonaro
Eleito vereador em 1989 após deixar o Exército em ato de insubordinação, Jair Bolsonaro (sem partido) construiu um império juntamente com três dos cinco filhos, Flávio, Carlos e Eduardo, na carreira política. A escalada espetacular da riqueza do clã do presidente da República levanta diversas suspeitas sobre a fortuna e o patrimônio que acumularam.
Após a quebra de sigilo de Carlos – o segundo da família, depois de Flávio, investigado em esquema de corrupção das rachadinhas -, o Ministério Público revelou, em setembro passado, que o clã movimentou pelo menos R$ 1,5 milhão em dinheiro vivo nos últimos 24 anos. Corrigido pela inflação, o valor chega da R$ 2,95 milhões.
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De acordo com a investigação, Carlos movimentou grandes quantias de dinheiro em espécie durante seus seis mandatos como vereador no Rio de Janeiro.
Em documentos, o MP cita pelo menos três situações que se enquadram na prática citada: em 2003, Carlos pagou R$ 150 mil em espécie na compra de um apartamento na Tijuca, na Zona Norte do Rio; em 2009, o vereador entregou R$ 15,5 mil, também em espécie, para cobrir um prejuízo que teve na bolsa de valores; e no último ano, Carlos declarou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ter R$ 20 mil em espécie guardados em casa.
Contudo, no último dia, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) rejeitou e mandou arquivar a denúncia do Ministério Público (MP) contra Flávio.
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Foi o próprio MP que pediu a extinção da denúncia porque as provas usadas na peça acusatória foram anuladas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Com isso, foram anulados os elementos de informação que justificaram a apresentação da peça acusatória. Ainda de acordo com a decisão, a rejeição da denúncia por falta de justa causa não impede o retorno das investigações.
Com Bruna Alessandro e informações da Folha de S. Paulo