A França homenageou nesta quarta-feira (21) o professor decapitado num subúrbio de Paris, após mostrar uma caricatura do profeta islâmico Maomé em sala de aula. Na cerimônia solene, na Universidade Sorbonne, o professor recebeu a título póstumo da Legião de Honra, a mais importante condecoração do país.
“Samuel Paty foi morto porque os islamistas querem o nosso futuro e sabem que com heróis silenciosos como ele nunca o terão”, afirmou o presidente francês, Emmanuel Macron, durante a cerimônia. “Defenderemos o laicismo. E a liberdade que ensinava tão bem. Não renunciaremos a caricaturas ou ilustrações”, acrescentou.
Macron afirmou ainda que Paty foi morto por “covardes porque encarnou a República” e “porque decidiu ensinar aos seus alunos a se transformaram em cidadãos, assumir os seus deveres e a liberdade para os exercer”. O presidente ressaltou que Paty passou a encarnar “a cara da luta pela liberdade e razão”, uma luta que Macron diz que continuará em seu nome “porque é mais necessária que nunca”.
O caixão do professor foi colocado no centro do pátio de honra da Universidade Sorbonne e adornado com bandeiras da França. Alunos e amigos prestaram homenagens ao professor de História assassinado. A pedido da família, a cerimônia começou com a música One, da banda U2, e terminou com aplausos.
O assassinato
O professor de História Samuel Paty, de 47 anos, foi decapitado na tarde da última sexta-feira (16), próximo à escola em que lecionava, no subúrbio de Conflans-Sainte-Honorine, no oeste de Paris.
O autor do ataque, um refugiado de nacionalidade tchetchena de 18 anos, foi morto a tiros pela polícia. Segundo testemunhas, o assassino teria gritado “Allahu Akbar” (“Deus é grande” em árabe), ao ser abatido a 200 metros do local.
Paty vinha sendo alvo de ameaças na internet por ter mostrado uma das caricaturas de Maomé, originalmente publicada no Charlie Hebdo, durante uma aula sobre liberdade de expressão. O representante de uma associação de pais de alunos relatou que o docente teria “convidado os alunos muçulmanos a deixarem a classe”, pois iria mostrar a imagem.
Adolescentes ajudaram na identificação do professor
O promotor antiterrorismo da França, Jean-François Ricard, revelou nesta quarta-feira detalhes do crime. Segundo ele, o assassino pagou a alunos da escola para ajudá-lo a identificar o professor. Ao chegar no local, ele tinha apenas o nome de Paty e endereço do colégio, que descobriu após uma campanha lançada contra a vítima nas redes sociais.
“A identificação só foi possível com a ajuda dos alunos da escola”, afirmou Ricard. “É por isso que a promotoria antiterrorismo decidiu processar dois menores de 18 anos, cujas implicações na identificação da vítima pelo assassino parecem ser conclusivas”, acrescentou.
Segundo o promotor, o assassino chegou cedo na escola e ofereceu a alunos entre € 300 e 350 para a identificação da vítima. Dois estudantes, de 14 anos e 15 anos, foram presos acusados de cumplicidade em homicídio com motivação terrorista e associação com terrorismos. Eles teriam ficado com o assassino por mais de duas horas esperando a chegada de Paty, mesmo após o agressor ter tido que queria “humilhar e golpear” a vítima.
Os adolescentes foram apresentados a um juiz de instrução nesta quarta-feira, junto com outros cinco suspeitos de envolvimento no caso – entre eles pai de uma estudante que chegou a lançar apelos online por uma “mobilização” contra o professor e um conhecido radical islamista.
Ricard afirmou ainda que o assassino trocou mensagens com o pai da aluna que lançou a campanha contra Paty antes do crime. Três amigos agressor completam a lista de suspeitos. Eles estariam envolvidos na compra das armas usadas no crime ou na radicalização do assassino.
Após o ataque, a polícia da França lançou uma operação contra redes islamistas. Autoridades ordenaram ainda o fechamento de uma mesquita nos arredores de Paris e dissolução de grupos e associações que tenham ligações com o movimento islamista.
Franceses nas ruas
No último domingo (18), milhares de manifestantes saíram às ruas da França em apoio à liberdade de expressão e em homenagem ao professor assassinado.
O caso ocorreu três semanas depois de um ataque à antiga redação do Charlie Hebdo, em Paris. Em 26 de setembro, um muçulmano de origem paquistanesa feriu duas pessoas nos arredores do local onde ficava a redação. À polícia, ele disse que estava furioso com as caricaturas de Maomé que o jornal publicou, algo considerado uma blasfêmia por islâmicos radicais.
O ataque ao jornal, em 2015, também foi motivado pelas caricaturas publicadas pelo veículo. A chacina deixou 12 mortos.
Com informações da Deutsche Welle Brasil