
“O sentimento de revolução já está muito presente no coração das pessoas”, acredita Jonas Donizette, presidente da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), ex-prefeito de Campinas (SP) e membro do diretório nacional do Partido Socialista Brasileiro (PSB). Para ele, é na cidade que a vida das pessoas acontece e onde a população se depara diariamente com a dura realidade de desigualdades sociais do Brasil. O projeto da Autorreforma do PSB precisa ser costurado à perspectiva municipal.
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Revolução nas cidades brasileiras
Donizette destacou que o pensamento de Caio Prado Júnior estava à frente do tempo dele, o que ocorre muito no mundo das ideias. O pensador brasileiro concebeu a revolução brasileira a partir de um processo democrático e, tanto à época em que escreveu a obra quanto hoje, essa concepção não é muito aceita.
“As pessoas têm a concepção de uma revolução de um enfrentamento de poder e de coisas muitas vezes com carga de violência acompanhando. Mas nós estamos caminhando cada vez mais para um mundo que a gente tem que entender a realidade.”
Jonas Donizette
Geografia e História para entender as cidades
Há dois objetos do trabalho de Caio Prado Júnior que, para Donizette, são imprescindíveis para compreender os povos e as cidades: a geografia e a história.
Com o conhecimento da geografia é possível estabelecer os marcos originários de cidades. No caso de Campinas, foi uma cidade criada a partir das rotas de tropeiros. Hoje, o município é traçado por cinco das principais rodovias brasileiras: Bandeirantes (SP 348), Anhanguera (SP 330), Dom Pedro (SP 65), Adhemar de Barros (SP 340) e Santos Dumont (SP 75). Esse aspecto geográfico aponta para facilidades e dificuldades e é muito importante na composição de um município.
O fator histórico mostra como e por que uma cidade foi criada e quais transformações ocorreram ao longo do tempo. Em muitos casos as mudanças no perfil demográfico dos municípios levam tempo para serem compreendidas pela classe política. É importante que os gestores públicos estabeleçam relacionamento com a população para saber sobre as necessidades para operar as mudanças nos locais em que as pessoas vivem.
Municípios como fio condutor da Autorreforma
Para Donizette, a Autorreforma do PSB demanda por um fio de pensamento municipalista que percorra todos os programas. Ele cita como exemplo a vacinação contra a Covid-19. Apesar do processo de compra e distribuição dos imunizantes ficar a cargo dos governos federal e estaduais, é nas cidades que a população recebe a aplicação das doses.
“A maioria das situações se dá dessa forma. Muitos problemas que vivemos no Brasil é porque falta esse reconhecimento dessa importância dessa instância municipal.”
Com relação ao sentido de revolução preconizado por Caio Prado Júnior, o ex-prefeito de Campinas avalia de forma positiva por poder ser adotado como um antídoto para a ideia de violência que, em geral, acompanha o conceito revolucionário.
“O que é a revolução? Uma mudança das coisas. A mudança drástica da situação vivida. Se você pegar hoje o brasileiro é um desejo que pulsa dentro do coração das pessoas. Um sentimento que saturou e não dá mais para as coisas continuarem como estão. O sentimento de revolução já está muito presente no coração das pessoas.”
Donizette avalia que, na atualidade, o Brasil tem vivenciado um momento de muita violência por meio de discursos agressivos e de ódio capitaneados, inflados ou insuflados pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Nesse contexto, o conceito de revolução por vias democráticas da obra de Caio Prado continua contemporâneo para orientar um debate sobre o Brasil.
“Vamos mudar com instrumentos legítimos, com a conscientização da população agregando esse sentimento de desejo de mudança em torno de um projeto. Acho que isso falta para o Brasil. Nós ainda temos aquela mania de agregar em torno de uma pessoa. Isso a história recente já nos mostrou que pode não dar tão certo.”
Brasil tem tudo para dar certo
Para o presidente da FNP, o Brasil é um país com todos os recursos para dar certo. Ele cita o exemplo do agronegócio, que é resultado de um projeto de Estado implementado há décadas com investimento em tecnologia.
“A obra de Caio Prado Júnior traz essa atualidade do desejo da mudança e da gente encontrar um caminho de atenuar esse sentimento de raiva e de ódio e buscar o sentimento da esperança da possibilidade de mudança.”
Desafios na Era da Informação
Para Donizette, um dos desafios impostos nesta era da informação é o quanto à acelerada inovação tecnológica. Se há alguns anos era preciso três gerações para mudar a tecnologia dominante, neste novo tempo uma mesma geração vivencia várias mudanças.
Essas mudanças também têm ocorrido nas cidades, que desde a década de 1970 cresceram de forma desordenada. Ele defende que os gestores municipais pensem as cidades a partir do comportamento das pessoas na atualidade.
Donizette cita o exemplo de modelos de Plano de Desenvolvimento e Ordenamento Territorial (PDOTs) em vigor até algumas décadas atrás. Àquela época, essas diretrizes previam áreas industriais, residenciais e comerciais. Esse modelo gerou uma crise nos transportes públicos.
“O novo conceito de urbanismo é o uso misto praticamente em toda a cidade. Diminui os deslocamentos, os congestionamentos e a poluição do ar e sonora. Esses novos conceitos de cidades precisam ser absorvidos para levar uma qualidade de vida melhor para as pessoas.”
Outro tema para o qual Donizette chama a atenção é para a implementação da tecnologia 5G. Ele avalia que essa inovação vai impactar fortemente a vida nas cidades, com mudanças nas relações sociais e políticas. Por ora, segue uma disputa para saber qual potência implantará a 5G no Brasil.
Ciclo de lives sobre a Revolução Brasileira
Donizette foi o quarto convidado da série de lives para debater a “Revolução Brasileira no Século 21″ a partir da concepção do historiador Caio Prado Júnior. O bate-papo com mais de uma hora de duração foi realizado nesta quarta-feira (14), às 16h.
A iniciativa é do Instituto Pensar e do Socialismo Criativo, em conjunto com PSB Nacional. O evento online conta com a participação do presidente do PSB Nacional, Carlos Siqueira – que nesta quarta edição foi representado por Paulo Bracarense -, e pelo presidente do Instituto Pensar, Domingos Leonelli. Os debates são mediados pelo companheiro James Lews e transmitidos pelo Facebook do PSB e do Socialismo Criativo. Já participaram do ciclo de debates, além de Jonas Donizette, o economista Luiz Gonzaga Belluzo, o geógrafo Elias Jabbour e o professor José Luiz Borges Horta.
Confira a live na íntegra: