Socialistas reagiram à carta aberta assinada por economistas, banqueiros e empresários que pede medidas mais eficazes para o combate à pandemia da Covid-19. Nesta segunda-feira (22) o documento ultrapassou 1.500 assinaturas. O presidente nacional do Partido Socialista Brasileiro (PSB), Carlos Siqueira, e o deputado federal Elias Vaz (PSB-GO) usaram as redes sociais para comentar o texto.
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Siqueira ressaltou a importância da vacinação em massa contra a Covid-19. Para o dirigente, imunizar a população brasileira é a única maneira de enfrentar a pandemia do coronavírus. O dirigente socialista comentou ainda que o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) afunda o país com a polícia negacionista que ‘desagrada a gregos e troianos’.
Vaz destacou um trecho do texto que fala sobre o desprezo pela ciência e que pede tratamento médico eficaz para as vítimas da Covid-19 no país. Além de citar práticas inadequadas e estimuladas por Bolsonaro, como as aglomerações já promovidas e o “flerte com o movimento antivacina”.
Carta não cita presidente, mas bolsonaristas reagiram
Os idealizadores da carta aberta afirmam que o documento não tem conotação política, pois nem cita o nome de Bolsonaro. Ainda assim, os bolsonaristas se identificaram com a mensagem e reagiram de forma negativa.
Nesta segunda-feira, o link para adesão à carta foi retirado do ar após problemas enfrentados com pessoas que apoiam o presidente. Apoiadores de Bolsonaro estavam assinando o documento com nomes “fake” ou escrevendo obscenidades no lugar do nome. Com isso, a contabilização da adesão passou a ser feita de modo manual, após checagem. O documento já foi encaminhado aos representantes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
Um dia após a divulgação da carta, Bolsonaro disse que o empresariado acredita em seu governo e reafirmou que é contra a adoção de regras rígidas de restrição de circulação, como querem “alguns setores importantes da sociedade, outros não tão importantes”, segundo o presidente. Ele disse ainda que o Brasil vem dando exemplo’ e ‘estamos dando certo” ao definir a situação do país.
Críticas à atuação de Bolsonaro na pandemia
Entre os signatários da carta aberta estão os economistas Edmar Bacha, Laura Carvalho, Felipe Salto e Elena Landau. No setor financeiro, a carta tem o apoio de Roberto Setubal e Pedro Moreira Salles, copresidentes do conselho de administração do Itaú Unibanco e Luis Stuhlberger (Verde Asset).
Também há representantes diretamente ligados ao setor produtivo, entre eles Pedro Parente (BRF) e Paulo Hartung, ex-governador do Espírito Santo e hoje presidente-executivo da Ibá (entidade que representa a cadeia produtiva de árvores, papel e celulose).
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Entre os que assinam a carta está o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega. Ele disse que o documento pretende chamar a atenção da sociedade para a grave crise sanitária causada pela pandemia.
“Embora não mencione o nome do presidente, a ideia é ressaltar o que se espera do líder do país em uma crise como essa. Bolsonaro não usa máscaras, promove aglomerações e desdenhou da vacina.”
Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda
O sócio-advisor da Gávea Investimentos, Fabio Barbosa, também assina a carta e afirma que a mobilização reflete a inquietação da sociedade.
“O objetivo é influenciar políticas públicas para que possamos rapidamente endereçar o problema da pandemia, dando apoio aos mais necessitados nesse ínterim, e tenhamos condições para que a economia volte a crescer e criar empregos.”
Fabio Barbosa, Gávea Investimentos
Nessa segunda, durante o debate sobre o lançamento do documento, divulgado pela primeira vez no domingo, os cinco economistas responsáveis pela redação afirmaram que as medidas de restrição à circulação para combate ao vírus são necessárias e terão menos efetividade sem a colaboração do governo federal e demais governadores e prefeitos.
Sabotagem do governo
A posição do governo federal foi classificada como “sabotagem” por alguns dos organizadores do documento. O economista Cláudio Frischtak afirmou que o país vive um cenário de crescimento exponencial do coronavírus, com expectativa de manutenção de um número elevado de mortes por um período de 30 a 60 dias, combinado com uma posição anticientífica e de sabotagem em relação às medidas tomadas por governadores e prefeitos.
“Nenhum prefeito ou governador quer entrar em um ‘lockdown’. E quando você não tem a compreensão, a cooperação e a coordenação do governo federal, o efeito líquido é uma enorme perda de eficiência e eficácia. Gasta-se mais recursos e obtém-se menos resultados.”
Cláudio Frischtak
O economista comentou ainda que coordenar é diferente de sabotar e que o objetivo da carta é pedir por uma iniciativa de coordenação. Frischtak avaliou que os brasileiros estão sujeitos a uma roleta-russa e que ninguém sabe quem vai adoecer. Ele comentou ainda que o sentimento é muito triste com a forma como o Brasil vem sendo governado.
Carta sugere quatro medidas para conter a pandemia
Entre as quatro medidas citadas na carta como indispensáveis para o combate à pandemia, estão a aceleração do ritmo de vacinação, o incentivo ao uso de máscaras – tanto com distribuição gratuita quanto com orientação educativa –, a implementação de medidas de distanciamento social e a criação de um mecanismo de coordenação do combate à pandemia em âmbito nacional, orientado por uma comissão de cientistas e especialistas.
A economista e diretora do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento (Cindes), Sandra Rios, que também faz parte do grupo de cinco economistas que redigiram o documento, afirmou que não há dilema entre saúde e crescimento econômico e que o país não vai voltar a crescer enquanto a pandemia não acabar.
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Ela afirmou que as vacinas são relativamente baratas, R$ 22 bilhões para imunizar toda a população, uma pequena fração dos R$ 327 bilhões desembolsados nos programas de auxílio emergencial e manutenção do emprego no ano de 2020, por exemplo.
“A pandemia não vai embora sem vacinação em massa, e a economia não vai voltar a crescer enquanto a pandemia não for embora. […] O que nos resta agora é buscar negociar com países que, por acaso, tenham excedentes e pressionar para que países produtores liberem as exportações.”
Sandra Rios, Cindes
Sandra também afirmou que as medidas de distanciamento não vão surtir efeito sem coordenação com o governo federal e também entre prefeitos e governadores. Para ela, essas medidas de distanciamento são fundamentais para evitar que os recursos da saúde entrem em colapso.
O economista do Insper, Paulo Ribeiro, afirmou que a inação em relação ao combate à pandemia legará custos para a sociedade de difícil recuperação. Ele afirma que o atraso de dois trimestres em relação ao programa de vacinação significa uma queda real de 2% do PIB (cerca de R$ 130 bilhões).
O economista Flávio Ataliba, que coordenou o debate entre os cinco responsáveis pelo documento, disse que, apesar dos pontos críticos ao governo federal, o documento não tem nenhum viés partidário e foi assinado por pessoas com diferentes visões econômicas, incluindo quatro ex-ministros da Fazenda, cinco ex-presidentes do Banco Central, donos de bancos, empresários e economistas de esquerda.
O economista Marco Bonomo, do Insper, afirma que o grupo buscou elaborar o documento com base em números e informações técnicas, ressaltando que muitos dados ainda são incertos, como os números do plano de vacinação que tem sido revisado para baixo nas últimas semanas.
Sobre o problema da coordenação nacional, destacou que o mapa do país mostra que, em todas as regiões, o sistema de saúde está entrando em colapso.
“O Brasil está se tornando uma grande Manaus, uma catástrofe. Claro que estamos atrasados em termos de providências.[…] Infelizmente a gente tem uma liderança nacional que combate o combate à pandemia.”
Marco Bonomo, Insper
Thomas Conti, também do Insper, afirmou que o Ministério da Economia fez diversos diagnósticos equivocados sobre o andamento da pandemia, tanto do ponto de vista sanitário como do ponto de vista econômico, ao subestimar custos, atrasar a adoção de medidas e não perceber que a vacinação não andaria no ritmo necessário para que a economia voltasse a crescer.
“O próprio governo subestimou a gravidade da pandemia. Tivemos no começo da pandemia o ministro Paulo Guedes [Economia] dizendo que com R$ 5 bilhões conseguiria resolver problema do coronavírus. Em dezembro, nomes do ministério disseram que não haveria segunda onda e que a pandemia estava acabando.”
Thomas Conti, Insper
Entre os novos signatários, em relação à versão divulgada na tarde de domingo, estão os ex-ministros Joaquim Levy e Martus Tavares, o ex-presidente do Banco Central Paulo Cesar Ximenes, os economistas David Zylbersztajn, Carlos Kawall (Asa Investiment) e José Júlio Sena (Ibre), o presidente do Instituto Akatu, Hélio Mattar, o editor Luiz Schwarcz e a historiadora Lilia Schwarcz.
Com informações da Folha de S.Paulo