Em mais uma escalada rumo à negação da história de lutas raciais no Brasil, o presidente da Fundação Cultural Palmares, Sérgio Camargo, anunciou pelo seu Twitter na segunda-feira (14) que o prédio que abrigará a nova sede da entidade, cedido pela EBC, receberá o nome de Edifício André Rebouças. De acordo com o Alma Preta, especialistas avaliam a medida como uma tentativa de apagar a figura heróica de Zumbi dos Palmares e seu histórico de lutas.
Na postagem, Camargo disse que a decisão, tomada pela diretoria colegiada, de forma unanime, é um “Orgulho para o Brasil” e, em outra postagem, afirmou que “enquanto estiver na presidência da Fundação Cultural Palmares, Zumbi não receberá homenagens”.
A medida não agradou segmentos do movimento negro. O advogado Eloi Ferreira, que foi presidente da Fundação Palmares de 2011 a 2013, avalia de forma negativa a ação. Segundo ele, a medida está em contrariedade com os objetivos do órgão que deveria promover e preservar valores da influência negra na construção do Brasil.
“Em 32 anos de existência, a fundação está vinculada à luta antirracista, de defesa da comunidade quilombola, de religiões de matriz africana. Ele vai tentar fazer tudo, mas não vai conseguir mudar história”, considera.
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Ao jornal, Ferreira ainda apontou a contradição por trás da medida de Camargo. Segundo ele, André Rebouças que não foi escravizado, como ocorreu com Zumbi, apesar de ter sido acolhido pelo imperador, nunca defendeu a escravização, diferentemente do atual presidente da Palmares. Camargo já afirmou que a escravidão foi benéfica para os negros. “Rebouças tinha a indignação de não ter pessoas negras em outros espaços”, ressalta.
O ex-presidente da entidade lamenta a situação e diz que que Sérgio Camargo “vai passar” e que o com o fim do governo de Jair Bolsonaro não será mais lembrado. “Estamos em contagem regressiva para isso. A sociedade brasileira está amadurecendo e não tem mal que dure para sempre”, pondera.
Já Flávio Gomes, professor de história integrante da Rede de Historiadores e Historiadoras Negros, reitera o reconhecimento da liderança de Zumbi em registros do período colonial.
“A importância [de Zumbi] não é fruto apenas da historiografia. Palmares e suas lideranças foram reconhecidas por autoridades e cronistas coloniais desde o século XVII”, destaca o professor.
O historiador diz não se tratar de competição e que não há incompatibilidades, e nem hierarquias entre Zumbi e André Rebouças, uma vez que a vida e a morte deles estão separadas por cerca de 200 anos. Por outro lado, ele conclui que ambos eram descendentes de africanos e viveram numa sociedade escravista no Brasil.
Zumbi dos Palmares
Zumbi nasceu em Pernambuco, Alagoas, livre, no ano de 1655. Era filho da primeira ou segunda geração de africanos que fugiram e organizaram quilombos e mocambos, representando, junto com outros que lutaram, a resistência negra à escravidão. O local onde viveu foi um dos maiores centros de resistência da América Negra, mesmo comparado as grandes comunidades de fugitivos no México, Jamaica, Colômbia e Suriname desde o século 17.
Com informações do Alma Preta