
Em três anos e meio de mandato, o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) cumpriu uma em cada três promessas feitas durante a campanha eleitoral de 2018. Um levantamento feito pelo g1 mostra que 21 de 58 compromissos assumidos pelo então candidato, eleito para um mandato de quatro anos, foram integralmente cumpridos. Isso corresponde a 36% do total.
Os dados mostram, ainda, que 16% das promessas foram cumpridas parcialmente durante três anos e meio de gestão – o que significa que ainda há pendências para que o trabalho seja considerado entregue.
Já as promessas que ainda não foram cumpridas pelo governo Bolsonaro são 48%.
Entre as promessas cumpridas, está a de “Instituir renda mínima”, compromisso que consta do plano de governo de Bolsonaro. A promessa foi cumprida por meio do Auxílio Brasil, programa que substituiu o Bolsa Família. Em maio de 2022, o Congresso tornou o benefício permanente, com um valor mínimo de R$ 400.
Já uma das promessas não cumpridas foi a de “Ter no máximo 15 ministérios”. Em 1º de janeiro de 2019, Bolsonaro deu posse a 22 ministros. Em junho de 2020, para atender a um pedido do Centrão, recriou o Ministério das Comunicações e nomeou o deputado Fábio Faria (PSD-RN), chegando a 23 pastas. Em 2021, com a sanção da lei que estabeleceu a autonomia do Banco Central, o presidente Roberto Campos Netto perdeu o status de ministro. Mas a recriação do Ministério do Trabalho, para acomodar Onyx Lorenzoni, fez o número voltar a 23 — oito a mais que o prometido.
O monitoramento das promessas dos políticos é feito pelo g1 periodicamente desde 2015. O levantamento é feito por mais de 50 jornalistas de todo o Brasil, que seguem uma metodologia própria para separar e avaliar tudo que pode ser claramente cobrado e medido ao longo do mandato.
Mentira atrás de mentira
Que o presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), é um mentiroso de primeira não é nenhuma novidade. Em três anos e meio de mandato, além de não cumprir nem 40% das promessas da campanha de 2018, inúmeras foram as vezes que os discursos do chefe do Executivo tiveram a veracidade questionada. Entre propagação de fake news e afirmações infundadas, Bolsonaro se mostrou um verdadeiro craque em desinformação.
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Na mais recente “mentirada em série”, o mandatário atingiu um novo nível de informações falsas: o vexame. Diante de embaixadores estrangeiros, no Palácio da Alvorada, Bolsonaro voltou a contar lorotas sobre a confiabilidade das urnas eletrônicas e ainda citou teorias da conspiração ultrapassadas.
Tão ultrapassadas que a plataforma de vídeos, o Youtube, removeu vídeo em que Bolsonaro vomita inveracidades. O vídeo derrubado foi utilizado de referência para as falas aos diplomatas.
A repercurssão não poderia ser diferente. Nas redes sociais, a “mentirada” virou alvo de memes e piadas entre os internautas. No Twitter, várias foram as hashtags usadas para falar sobre a reunião. “Mentiroso da República“, “The Office“, “Jairnine“, “Embaixadores” e “Power Point” estão entre os assuntos mais comentados após o evento.
Desta vez, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) foi rápido e respondeu todas as 20 mentiras que Jair Bolsonaro afirmou sobre as urnas eletrônicas e o processo eleitoral brasileiro. Mas para aquele que ocupa o cargo máximo do Executivo, de nada adianta.
Por meio de uma profusão de mentiras, Bolsonaro vem fomentando a descrença nas urnas desde antes de seu governo. No entanto, ao invés de ser barrado por aqueles ao seu redor, o mandatário tem contado com o respaldo de militares, membros do alto escalão do governo e seu partido em sua cruzada contra a Justiça Eleitoral.
De acordo com a Folha de S. Paulo, as Forças Armadas têm repetido o discurso de Bolsonaro. Em ofício recente, solicitaram ao TSE todos os arquivos das eleições de 2014 e 2018, justamente os anos que fazem parte da retórica de fraude do presidente.
Sem verdades, mas com um plano golpista
Apesar de ser motivo de piadas na internet, o discurso do presidente ultrarreacionário revela que o período de eleições será conturbado. A maioria dos senadores e deputados do Congresso Nacional já não acreditam mais em um processo eleitoral pacífico.
A Eurasia Group, empresa de consultorias e risco político conhecida mundialmente, já alertou para riscos de golpe e ataques à prédios governamentais.
Sem verdades ou provas, Bolsonaro mente aos montes, mas avisa: “o golpe está aí, cai quem quer“. No ano passado, em conversa com apoiadores, o mandatário disse que “a fraude está no TSE” e ainda atacou o então presidente da corte eleitoral e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, a quem chamou de “idiota” e “imbecil”.
“Não tenho medo de eleições, entrego a faixa para quem ganhar, no voto auditável e confiável. Dessa forma [atual], corremos o risco de não termos eleição no ano que vem”, disse.
A fala ocorreu após uma sequência. No dia anterior, também ao falar com apoiadores, o mandatário fez outra ameaça semelhante: “Ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições“. O plano dele está armado e operante.
O que acontece
Jair Bolsonaro (PL) está com um pé fora do Palácio do Planalto, de acordo com todas as pesquisas de intenção de voto que mostram que Lula (PT) deve vencer ainda no primeiro. O que explica o desespero para se manter no cargo. Afinal, ao colecionar crimes não investigados por estar blindado pelo cargo que ocupa atualmente, a situação deve mudar bastante a partir de 2023.
Como presidente, Bolsonaro só pode ser processado por crimes relacionados ao mandato. Mas, para isso, deve ser denunciado pelo procurador-Geral da República (PGR), Augusto Aras. O que é praticamente impossível de acontecer dada a conduta adotada pelo PGR até o momento de ignorar deliberadamente todas as condutas criminosas de Bolsonaro desde que assumiu o poder.
Depois, na remota hipótese de um processo aberto pelo PGR, precisaria do aval da Câmara dos Deputados para ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A Câmara é presidida por Arthur Lira (PP-AL), importante liderança do centrão, que dominou o governo Bolsonaro, e é um aliado de primeira hora do atual ocupante do Planalto.
Nada foi feito por nenhum dos dois após a conduta criminosa de Bolsonaro diante dos embaixadores, que poderiam levar ao seu impeachment.
Mas, sem foro privilegiado, procuradores e promotores em todo o país podem mover ações contra Bolsonaro na justiça comum, o que aumenta as chances de punição.
De acordo com a Folha, são dez processos na esfera civil, onde não há foro, por danos morais e por condutas relacionadas à pandemia em que Bolsonaro foi alvo direto no decorrer do mandato, identificados a partir de ferramenta da empresa Digesto para consulta de processos públicos tribunais em primeira instância.
Foram duas condenações por danos morais – uma na ação do Sindicato do Jornalistas do Estado de São Paulo por ataques reiterados contra profissionais, julgada em primeira instância, e dos ataques de cunho sexual feitos contra Patrícia Campos Mello, a repórter da Folha, com condenação em segunda instância.
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Também foram identificados 8 processos relacionados ao descumprimento das medidas recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) no combate à pandemia que não deram em nada.
Bolsonaro também foi alvo de pedidos de liminares por conta das motociatas realizadas em 2021, além do pronunciamento em rede nacional em que afirmou que a covid-19 não passava de uma “gripezinha”. Essas ações também não foram para frente e foram negadas.
À Folha, a advogada Marina Coelho, presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim) ressalta que a responsabilização do presidente no exercício do cargo é ainda mais complexa por misturar questões jurídicas e políticas.
“Se a gente considera juridicamente, a gente tem elementos para dizer que há uma necessidade de se investigar a conduta do presidente principalmente no contorno das questões ligadas à pandemia”, defende.
Também à Folha, a professora de direito penal da USP Helena Lobo, que integrou o grupo de especialistas que formulou o parecer jurídico para embasar o relatório final CPI da Covid, afirma que há um acúmulo de indícios de crimes de Bolsonaro. E, sem o foro, o quadro pode mudar.
“Pode haver uma mudança de paradigma porque aí a gente vai ter muito provavelmente uma série de promotores e juízes que vão poder analisar esses casos e aí a gente vai ter inclusive opiniões diferentes sobre ele”, prevê.
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Em junho, o ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro, foi preso por transformar o MEC em um balcão de negócios com aliados e, de acordo com o próprio Ribeiro, a mando de Bolsonaro, que fez de tudo para barrar a criação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) e impedir a investigação de mais esse escândalo no governo.
Um dos casos mais emblemáticos é o esquema das rachadinhas praticados por Bolsonaro e seus filhos Carlos e Flávio.
O esquema consiste em pegar todo ou parte dos salários de funcionários fantasmas. De acordo com as denúncias, o esquema foi mantido por anos nos gabinetes dos três.
Ao mesmo tempo em que nega as acusações, o clã Bolsonaro atua para barrar as investigações e sequer responde de fato às suspeitas.
Outro caso que explodiu contra os Bolsonaro foi o dos R$ 89 mil depositados pelo então assessor de Flávio Bolsonaro, Fabrício Queiroz, na conta de Michelle Bolsonaro, então futura primeira-dama.
Como resposta, a família presidencial apresentou versões contraditórias e nunca comprovou o motivo dos depósitos.
Em defesa da madeira ilegal
Bolsonaro também lutou para manter no governo o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Ele foi outro que permaneceu um mês no cargo mesmo após ter sido alvo de operação da Polícia Federal, nas investigações sobre contrabando de madeira no Pará.
Antes de Salles finalmente deixar o governo, Bolsonaro afirmou que era “um ministro excepcional”.
Com informações do g1 e Folha