
O ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, declarou, no último sábado (2), em depoimento à Polícia Federal que o presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido) pediu para indicar superintendência da PF no Rio de Janeiro.
O conteúdo de seu depoimento foi vazado à CNN Brasil na tarde desta terça-feira (5).
Depoimento
“A mensagem tinha, mais ou menos o seguinte teor: ‘Moro você tem 27 Superintendências, eu quero apenas uma, a do Rio de Janeiro'”, de acordo com o texto do relatório sobre o depoimento.
Segundo o relatório do depoimento, o ex-ministro diz que não acusou o presidente de crime algum, e que isso cabe aos investigadores.
Moro expõs aos investigadores que essa mensagem foi enviada por Bolsonaro no começo de março, quando o então ministro e o então diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, estavam em um viagem oficial aos Estados Unidos.
O ex-ministro diz que chegou a conversar sobre o tema com Valeixo, e que ambos “até aventaram a possibilidade de atender ao Presidente para evitar uma crise”. Contudo, Valeixo disse que, neste caso, não poderia permanecer no cargo.
No depoimento, Moro afirma que “não nomeou e não era consultado” sobre o comando desses órgãos regionais, e que a escolha era exclusiva de Valeixo. O ex-ministro diz que não opinou nem na superintendência do Paraná, estado onde foi juiz.
Questionado sobre os motivos de Bolsonaro para querer definir o superintentendente do Rio, Moro não opinou e disse que apenas o próprio presidente poderia responder.
Valeixo
Ainda nos EUA, diz Moro, Valeixo declarou que estava “cansado da pressão para a sua substituição” e para a troca do comando da PF no Rio. E que, por isso, concordaria em sair do cargo.
Até ali, diz Moro, não havia solicitação da Presidência da República “sobre interferência ou informação de inquéritos que tramitavam no Rio de Janeiro”.
O ex-ministro diz que cogitou atender às trocas se pudesse indicar novos perfis técnico. Depois, diz ter voltado atrás.
Íntegra do depoimento
Confira, na íntegra, o depoimento do ex-ministro Sergio Moro à Polícia Federal:
Na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba no Estado do Paraná, onde presente se encontrava CHRISTIANE CORREA MACHADO, Delegada de Polícia Federal, Matr. 10.568, Chefe do Serviço de Inquéritos da Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado – DICOR, e WEDSON CAJÉ LOPES, Delegado de Polícia Federal, lotado no SINQ/DICOR, compareceu Sergio Fernando Moro, sexo masculino, naturalidade brasileira, casado(a), filho(a) de ODETE STARKE MORO e DALTON AUREO MORO, nascido(a) aos 01/08/1972, natural de Maringa/PR, instrução ensino superior – mestrado, documento de identidade nº 36748567 SSP/PR, CPF 863.270.629-20. Cientificado acerca dos seus direitos constitucionais, inclusive o de permanecer em silêncio, inquirido a respeito dos fatos pela Autoridade Policial, RESPONDEU:
QUE tomou conhecimento pela imprensa sobre a determinação do Ministro Celso de Mello sobre a sua oitiva, tendo se colocado à disposição para prestar declarações, informando o fato à Polícia Federal;
QUE perguntado sobre sua definição sobre interferência política do Poder Executivo em cargos de chefia no âmbito da Polícia Judiciária, respondeu que entende que seja uma interferência sem uma causa apontada e portanto arbitrária;
QUE durante o período que esteve à frente do Ministério da Justiça e Segurança Pública, houve solicitações do Presidente da República para substituição do Superintendente do Rio de Janeiro, com a indicação de um nome por ele, e depois para substituição do Diretor da Polícia Federal, e, novamente, do Superintendente da Polícia Federal no Estado do Rio de Janeiro, que teria substituído o anterior, novamente com indicação de nomes pelo presidente;
QUE, durante sua gestão, apenas concordou com a primeira substituição, pois, circunstancialmente, o Superintendente do RJ, RICARDO SAAD, havia manifestado interesse de sair, por questões familiares, e a sua troca já estava planejada pelo Diretor Geral, sendo nomeado um nome com autonomia pela própria Polícia Federal, o que garantia a continuidade regular dos serviços de Polícia Judiciária;
QUE na sua gestão preservou a autonomia da Polícia Federal, em relação a interferência política e pediu demissão no dia 24 de abril de 2020, com o mesmo objetivo;
QUE durante a sua coletiva ocorrida em 24 de abril de 2020 narrou fatos verdadeiros, cujo objetivo era esclarecer os motivos de sua saída, preservar autonomia da Polícia Federal, da substituição de Diretor e de Superintendentes, sem causa e com desvio de finalidade, como reconhecimento posteriormente pelo próprio Supremo Tribunal Federal em decisão proferida no dia 29 de abril que suspendeu a posse do DPF ALEXANDRE RAMAGEM;
QUE perguntado se identificava nos fatos apresentados em sua coletiva alguma prática de crime por parte do Exmo. Presidente da República, esclarece que os fatos ali narrados são verdadeiros, que, não obstante, não afirmou que o presidente teria cometido algum crime;
QUE quem falou em crime foi a Procuradoria Geral da República na requisição de abertura de inquérito e agora entende que essa avaliação, quanto a prática de crime cabe às Instituições competentes;
QUE em agosto de 2019 houve uma solicitação por parte do Exmo. Presidente da República de substituição do Superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro, RICARDO SAAD;
QUE essa solicitação se deu de forma verbal, no Palácio do Planalto;
QUE não se recorda se houve troca de mensagens sobre esse assunto;
QUE não se recorda se alguém, além do declarante e do Exmo. Presidente da República tenha presenciado essa solicitação;
QUE no entanto, reportou esse fato tanto ao Diretor da Polícia Federal, MAURÍCIO VALEIXO, como ao Dr. SAAD;
QUE os motivos dessa solicitação devem ser indagados ao Presidente da República,
QUE, após muita resistência, houve, como dito acima, concordância do Declarante e do Dr. VALEIXO, com a substituição
Com informações do jornal G1 e Sputnik.