
O Brasil ainda se apresenta para o mundo como uma democracia racial, resultante da mistura harmoniosa de raças. Entretanto, a realidade mostra a existência de uma profunda divisão que determina o destino da juventude negra e tem na educação um vetor da consolidação do racismo estrutural.
Para a BBC News Brasil Marina Pereira de Almeida Mello, doutora em Antropologia Social e professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), explica que o racismo implica na crença de que as diferenças humanas, do ponto de vista físico, devem ser naturalmente hierarquizadas.
“É uma ideologia de exclusão, ao pressupor uma classificação dos diferentes, pautada na ideia de superioridade e de inferioridade”, afirma Mello.
No Brasil, diz a especialista, prevalece o que o sociólogo Oracy Nogueira [1917-1996] identificou como um “preconceito de marca”, ou seja, uma pessoa é discriminada conforme suas características físicas: o tom da pele, o desenho do nariz e dos lábios, a natureza do cabelo, os gestos, o sotaque.
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Isso é diferente do que ocorre, por exemplo, nos Estados Unidos, onde prevalece um “preconceito de origem”: uma pessoa é identificada como negra se pertence a uma família negra.
De acordo com Mello e com historiadoras e pedagogas ouvidas pela BBC, a educação tem um papel crucial na perpetuação e no combate ao racismo no país.
“A escola deveria desconstruir o ideal do homem europeu e cristão perfeito, naturalmente superior, exemplo do bem, da beleza e da verdade”, diz Mello.
“Porque esta lógica implica que todos os outros seres, classificados como amarelos, vermelhos ou pretos, têm sua humanidade diminuída, imperfeita, o que justificaria a sua dominação, exploração e até mesmo a sua morte.”
Apesar de mudanças nas leis, ‘escola ainda perpetua preconceitos’. A lei 10.639, sancionada em janeiro de 2003 no Brasil, tornou obrigatório no ensino fundamental e médio o estudo da história e cultura afro-brasileira.
Ficou estabelecido que os alunos devem aprender a respeito da história da África e dos africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra e o papel do negro na formação da sociedade nacional.
Esta seria a base de uma educação antirracista: valorizar a identidade e a trajetória dos diferentes povos que formam o país, em vez de tomar a visão do colonizador como a dominante.
Neste sentido, a lei 11.645, de março de 2008, por sua vez, acrescentou à legislação a obrigatoriedade do ensino da cultura e história indígenas.
Ambas as leis alteraram, assim, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que regulamenta o sistema educacional público ou privado do Brasil da educação básica ao ensino superior.
Personagens negros apagados dos currículos escolares
O Brasil ainda se apresenta ao mundo como uma democracia racial, como se fosse o resultado de uma mistura harmoniosa de raças, diz Heloise Costa, mestre em relações étnico-raciais e professora de Língua Portuguesa, o que faz com que o combate ao racismo não seja uma prioridade no país.
“A nossa educação formal fortalece a ideia de uma humanidade branca universal, que nada mais é do que o olhar europeu sobre o mundo.”.
Com isso, os currículos escolares omitem diversos personagens negros relevantes para a história nacional. “Os africanos e indígenas não deram simplesmente uma contribuição ao país, eles são a base da nossa cultura”, diz Sherol dos Santos.
Um exemplo são as reuniões em formato de roda, que pressupõem uma participação mais igualitária de todos os membros. “Isso não foi trazido pelos colonizadores, faz parte das culturas indígena e africana”, afirma.
Em História, diz Heloise Costa, os alunos não conhecem, por exemplo, a real dimensão do Quilombo dos Palmares, que ocupava uma área próxima ao tamanho de Portugal.
Aprende-se pouco sobre Zumbi e Dandara, que governaram este quilombo, e sabe-se menos ainda sobre figuras importantes da história da resistência negra no país, como Francisco José do Nascimento, o ‘Dragão do Mar’, que ajudou o Ceará a se tornar o primeiro Estado do país a abolir a escravidão, em 1884, e Tereza de Benguela, que governava o Quilombo do Piolho, no Mato Grosso, por meio de um sistema de parlamento, diz ela
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