
Vanguardista, Lídice da Mata (PSB-BA) vivenciou o protagonismo feminino em muitas etapas de sua vida. Primeiro como a primeira mulher eleita presidente do Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal da Bahia (DCE-UFBA), em 1980. Filha da cidade de Cachoeira, no Recôncavo baiano, foi eleita vereadora de Salvador, em 1982.
Em 1986, elegeu-se – pela primeira vez – deputada federal, participando da Assembleia Nacional Constituinte, para logo integrar a chamada ‘Bancada do Batom’, uma iniciativa histórica que reuniu 26 mulheres parlamentares, do universo de 166 candidatas que se apresentaram para o pleito de 1986, e que mobilizou representantes femininas em um momento em que o Parlamento era dominado pelo poderio masculino, durante a Assembleia Nacional Constituinte, de 1987-1988.
Em 1992, foi eleita a primeira prefeita de Salvador. Como gestora da capital baiana, promoveu políticas sociais inovadoras e educativas, por meio de inúmeros projetos, entre os quais destacam-se a “Fundação Cidade Mãe”, premiado nacional e internacionalmente e um dos mais bem-sucedidos programas de assistência a crianças e jovens já desenvolvidos na Bahia.
No cargo, Lídice promoveu a participação da Prefeitura de Salvador como signatária da carta de fundação do Centro Ibero Americano de Desenvolvimento Estratégico Urbano (Cideu), voltado à prática de novas formas de realização do planejamento urbano das grandes cidades. Mapeou e apoiou os “sítios” históricos. Profissionalizou o Carnaval de Salvador, proporcionando um maior desenvolvimento econômico da cidade e do turismo no Estado da Bahia. Por todos os projetos, sua gestão segue sendo objeto de pesquisas e estudos em institutos, universidades e faculdades, como tema de teses de mestrado e doutorado.
Em 2006, com uma expressiva votação, Lídice voltou ao Congresso Nacional, desta vez eleita deputada federal pela Bahia, com 188.927 votos, sendo a mais bem votada na capital baiana. Na Câmara, teve destacada atuação na Comissão de Turismo e Desporto, como presidente, apresentando e votando importantes projetos para o fomento do turismo no estado e no Brasil, a exemplo da Lei Geral do Turismo (LGT).
No PSB, também deu provas de seu pioneirismo ao fundar o Instituto Pensar, o Centro de Estudos e Debates voltados para discussão de temas relevantes para cidade, e ao se tornar consultora do Projeto Axé, programa responsável pela educação e assistência a jovens e adolescentes em situação de risco social.
Em 2010, integrando a chapa majoritária do governador Jaques Wagner foi eleita a primeira senadora da Bahia, com 3.385.300 votos.
Integrante dos movimentos populares em prol da Anistia e da campanha das Diretas Já, ela também mantém no currículo uma extensa militância feminista, na luta pela legalização do aborto e rompimento de relações diplomáticas com países que adotavam postura discriminatória em relação às mulheres.
Durante a sua trajetória política, também tem passagens marcadas pelas lutas em favor da jornada de trabalho de 40 horas semanais, pelo voto facultativo aos 16 anos, pela criação de um fundo de apoio à reforma agrária, além de projetos voltados à garantia dos direitos de aposentados, trabalhadores da área da cultura e de idosos, sobretudo durante a pandemia da Covid-19.
Na série especial #ElasQueLutam, em comemoração ao Dia Internacional das Mulheres, celebrado no dia 8 de março, o Socialismo Criativo entrevistou a deputada federal, expoente da luta feminina no país.
Confira a entrevista, na íntegra:
Socialismo Criativo – Mesmo sendo um exemplo, as mulheres em geral ainda têm um longo caminho a percorrer em termos de igualdade de gênero e mesmo na ocupação de espaços de poder. A partir da sua experiência, é possível dizer que Brasil está no caminho para conter a exclusão política das mulheres? O que falta para chegarmos a níveis políticos e sociais mais equitativos?
Lídice da Mata – O Brasil, digamos, deu um passo quando estabeleceu cotas para as mulheres, cotas obrigatórias para as eleições. E, principalmente agora, que determinou cota do fundo partidário, mas está muito longe do ideal. Nós precisamos primeiro da inclusão das mulheres no trabalho, a inclusão econômica das mulheres é passo substancial.
Socialismo Criativo – A senhora integrou, ainda durante a Constituinte de 1987, a chamada “Bancada do Batom” que, unindo outras 25 mulheres, atuou ativamente na elaboração e aprovação de leis de garantia dos direitos das mulheres, com a aprovação de mais de 30 projetos relacionadas ao tema. Ao que a senhora credita o sucesso da iniciativa?
Lídice da Mata – À luta dos movimentos de mulheres, à sua organização, à sua unidade e à sua permanente presença dentro do Congresso Nacional, conversando, fazendo exatamente o Lobby do Batom, conversando de um por um com todos os deputados, de todos os partidos, para convencê-los do nosso projeto.
Socialismo Criativo – De acordo com o ranking elaborado pelo Inter-Parliamentary Union, com uma média global de 25% de mulheres, a maioria dos parlamentos mundiais continua dominado por homens, enquanto vozes femininas seguem frequentemente afastadas dos órgãos de decisão ainda em 2021. O Brasil é um dos piores países em termos de representatividade política feminina, ocupando o 142º lugar entre as 188 nações analisadas e o 6º posto na América do Sul – atrás de Argentina, Equador, Guiana, Peru, Colômbia e Chile, por exemplo. A que a senhora atribui essa distância até mesmo entre os países sul-americanos?
Lídice da Mata – O nosso país é extremamente machista na inserção da mulher. Tanto no trabalho quanto no mundo político. Apesar de nós termos conquistado o direito de voto antes de muitos outros países da América Latina e do mundo, infelizmente o nosso sistema eleitoral sempre foi um sistema que afastou as mulheres e, mais recentemente, nós percebemos que o financiamento de campanha é essencial para que a mulher chegue a um espaço claro na política. Como não temos, não estamos lá.
Socialismo Criativo – Atualmente apenas 15% dos representantes na Câmara dos Deputados e no Senado são mulheres. Para contornar a sub-representação feminina no Legislativo, o PSB propõe, dentro de sua Autorreforma, aumentar de 30% (como definido na Lei 9.504/1997) para 50% a obrigatoriedade de representação política feminina nas candidaturas partidárias. Esta é uma saída que funcionaria no curto prazo? Que outras propostas devem ser implementadas agora para evitar a imensa defasagem das representações femininas no poder?
Lídice da Mata – Aumentar a decisão de colocar mulheres nos cargos políticos é fundamental. Para isso, nós precisamos ter a garantia da participação das mulheres, na estrutura interna do partido, na estrutura de decisão do partido. Nas direções municipais, nas direções estaduais, na direção nacional. Queremos 30% neste momento, 50% das vagas para as candidaturas femininas e recursos para o financiamento, o estímulo da sociedade e a inclusão produtiva das mulheres.
Socialismo Criativo – Que mensagem a senhora deixaria às mulheres brasileiras que ainda têm receio ou se sentem longe da política?
Lídice da Mata – O recado da luta, da luta pelo seu direito à vida digna, à vida com qualidade, à felicidade. Para tudo isso, nós precisamos combater a violência contra a vida das mulheres, nós precisamos garantir o apoio para o desenvolvimento físico e mental, saudável, dos nossos filhos, a garantia de oportunidades melhores para a vida dos nossos filhos, a nossa inclusão econômica na sociedade, que nós possamos sair da informalidade e possamos nos dirigir aos cargos de direção da economia e da política. Portanto, que a nossa participação seja reconhecida, não como cidadã de segunda categoria, mas como cidadãs em condições de igualdades com os homens. Mulheres à luta!