
O Pacto Histórico, chapa pela qual Gustavo Petro e Francia Márquez concorrem à presidência e vice-presidência da Colômbia, representa uma das alianças mais amplas que disputam as eleições no país.
Formalmente a coalizão é composta por seis organizações: Colômbia Humana, União Patriótica, Partido Comunista, Polo Democrático Alternativo, Aliança Democrática Ampla e Movimento Alternativo Indígena e Social, mas, na prática, outros setores de esquerda e até partidos de centro-direita apoiam a chapa.
Com a maior bancada no Congresso e 40% da preferência no 1º turno das eleições presidenciais, o Pacto pode ser a primeira aliança progressista a assumir o governo da Colômbia – um país marcado por 57 anos de conflito armado e governos dos partidos Liberal, Conservador ou do campo do uribismo – corrente política liderada pelo ex-presidente Álvaro Uribe Vélez (2002 – 2010), fundador do partido governante, Centro Democrático, e considerado mentor do atual mandatário, Iván Duque.
“Na Colômbia se erigiu um sistema político de elites que tomaram conta dos territórios e suas riquezas, por isso hoje ostentam um poder político, econômico e militar que não querem perder. Para eles é uma ameaça que o Pacto Histórico possa assumir o governo”, afirma Jimmy Moreno, membro da direção nacional do Congreso de los Pueblos, movimento que apoia a candidatura, mas não faz parte da coalizão.
Esta é a terceira vez que Gustavo Petro concorre à presidência. Os votos do dia 29 de maio, 8,5 milhões segundo resultados preliminares, foram o dobro do resultado obtido no 1º turno em 2018 e oito vezes mais que a votação que lhe conferiu a vitória para a prefeitura de Bogotá, em 2011.
“Nossa fortaleza é ter alcançado a unidade da esquerda. No entanto ainda não conseguimos canalizar todo o potencial de mobilização para as urnas”, comenta o membro da direção nacional da Marcha Patriótica, Mauricio Ramos.
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Quem é Gustavo Petro
Petro é natural de Ciénaga de Oro, departamento de Córdoba. Economista de 62 anos, foi militante do grupo guerrilheiro Movimento 19 de Abril (M-19) na sua juventude e tinha o codinome de “Comandante Aureliano”.
Ele foi um dos responsáveis pela transição da guerrilha urbana no partido Aliança Democrática M-19, pelo qual foi constituinte em 1991 e deputado até 2006. Em 2011 foi eleito prefeito de Bogotá (2012-2015) com o partido Polo Democrático Alternativo, e desde 2018 atua como senador já pela nova legenda, da qual também foi fundador, Colômbia Humana.
Já Francia Márquez, candidata a vice na chapa de Pedro, tem 40 anos, nasceu em Yolombó, Antioquia, mas vivia na comunidade de La Toma, em Cauca, onde iniciou sua vida política em manifestações contra a retirada forçada da comunidade para liberar a área para extração mineral.
Tornou-se advogada para representar sua comunidade. Em 2018 ganhou o Goldman Environmental Prize pelo seu papel como defensora do meio ambiente. Até iniciar a campanha para a presidência também atuava no Conselho Nacional pela Paz.
Para os movimentos e organizações de esquerda que compõem a aliança eleitoral, a dupla representa um momento de ruptura para a política do país, que se expressou na escalada de mobilizações nos últimos quatro anos, sendo o ápice a maior greve geral da história da Colômbia, iniciada em abril do ano passado.
“A mudança não virá por decreto. Petro e Francia farão um governo de transição. Acreditamos que o que eles podem fazer é criar as condições para que nos tornemos um país onde as diferenças sejam resolvidas através do diálogo e do respeito”, diz Mauricio Ramos, dirigente da Marcha Patriótica.
Apoio do México
Gustavo Petro recebeu apoio do presidente do México, Andrés Manuel López Obrador.
“Envio um abraço a Petro, e vocês sabem porque o abraço. Porque ele enfrenta uma guerra suja dos mais indignos e covardes, tudo o que já vimos e sofremos no México”, disse o presidente mexicano, ao citar quando ele mesmo foi candidato à presidência, em 2006.
Obrador criticou o “âmbito da campanha suja” em que os oponentes de Petro o tratam como “um perigo para a Colômbia, um comunista, guerrilheiro”.
Neste final de semana, Petro agradeceu o apoio do presidente mexicano.
“México, Brasil, Colômbia, Bolívia, Argentina e Chile serão os novos eixos de uma América Latina industrializada, educada e justa. A mudança chegou”, afirmou.
Colômbia, EUA e Venezuela
A possibilidade de vitória da esquerda na Colômbia pode refletir também nas relações com EUA e Venezuela. Isso porque quando o ex-presidente dos norte-americano, Donald Trump, iniciou sua campanha de “pressão máxima” contra a Venezuela para desestabilizar e derrubar o governo de Nicolás Maduro, diversos países latino-americanos alinhados com os interesses estadunidenses colaboraram de forma ativa com os planos da Casa Branca.
O Chile, comandando por Sebastián Piñera; a Argentina, com Mauricio Macri; o Paraguai, com Mario Abdo Benítez, e o Brasil, com a presidência de Jair Bolsonaro, foram alguns dos que passaram a classificar o país vizinho como uma “ditadura” e reconheceram o ex-deputado Juan Guaidó como “presidente interino”.
Dentre os governos da região que forneceram apoio às estratégias norte-americanas contra a Venezuela, o da Colômbia, liderado pelo direitista Iván Duque, foi um dos mais ativos.
Agora, a 15 dias do 2º turno das eleições presidenciais na Colômbia, os dois candidatos que disputam a presidência do país, embora tenham projetos muito distintos entre si, tentam se afastar do legado de Duque e compartilham de uma mesma promessa feita durante a campanha: o restabelecimento de relações diplomáticas com a Venezuela.
A posição, adotada tanto pelo progressista Gustavo Petro quanto pelo empresário de direita Rodolfo Hernández, parece confirmar a busca de ambos por uma imagem pragmática na política externa que, uma vez no poder, resultaria em uma reaproximação, ainda que meramente formal.
Em entrevista ao Brasil de Fato, o cientista político venezuelano William Serafino afirma que a posição adotada pelos candidatos pode ser explicada pelo interesse econômico em reativar atividades comerciais entre os países que sofreram uma redução nos últimos anos. Além disso, diz o pesquisador, uma reconciliação entre Bogotá e Caracas traria benefícios para o governo venezuelano.
“Eu acredito que a Venezuela pode ganhar uma ampla zona de alívio no âmbito de sua segurança fronteiriça, na reativação das relações comerciais e diplomáticas, e também buscar um processo de reconciliação entre ambos os países, o que acredito que ocorreria em caso de vitória de ambos os candidatos. Isso é um sinal positivo para o governo venezuelano, pelo fato de ter um país vizinho que contribui para a paz e não para a guerra”, diz.
Com Brasil de Fato e informações do Opera Mundi