
Novas revelações feitas pela imprensa têm colocado em xeque a versão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, a respeito do pedido de “reserva” de vacinas contra a Covid-19 feita para servidores do órgão.
Documentos internos obtidos pelo jornal Estadão nesta terça-feira (28) mostram que a Corte aumentou de 4 mil para 7 mil o número de doses do imunizante solicitadas à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Também de acordo com o jornal Folha de S.Paulo, além da Fiocruz, o STF também pediu prioridade na aplicação da vacina ainda não autorizada no país ao Instituto Butantan.
Pedidos ao Butantan e à Fiocruz
Na denúncia feita pelos veículos de imprensa, o médico Marco Polo Freitas preparou minutas com pedidos de vacina às duas instituições. Nas solicitações, Freitas fazia menção a uma quantidade menor de imunizantes. No entanto, a versão final dos documentos – ambos enviados às instituições, com aval do diretor-geral do STF, Edmundo Veras dos Santos Filho –, mostra que o Supremo pediu doses para 7 mil pessoas, atendendo uma nova sugestão do médico.
“Conforme entendimento prévio, segue minuta de Ofício (1433837) a ser encaminhado ao Diretor do Instituto Butantan – Professor Dimas Tadeu Covas – solicitando a análise da possibilidade de reserva de 4.000 (quatro mil) doses de vacina contra o novo coronavírus”, escreveu Freitas ao diretor-geral do STF em 16 de novembro.
Aumento do número de vacinas
Em 18 de novembro, o médico preparou uma minuta similar para ser enviada à Fiocruz. No dia 23 de novembro, o próprio Freitas sugere ao diretor-geral a inclusão de dependentes econômicos dos servidores do STF e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) nos pedidos.
“Sugiro a revisão do quantitativo de doses de vacinas a serem solicitadas ao Butantan e à Fiocruz, de modo que seja feita a reserva de quantidade suficiente para atender ao público interno dos órgãos e aos dependentes econômicos dos servidores, o que perfaz um total de 7.000 pessoas”, escreveu o médico.
O Tribunal usou argumentos semelhantes ao solicitar a “reserva”: a imunização do maior número possível de trabalhadores de ambas as casas e a realização da campanha pelo tribunal, a fim de colaborar “com a Política Nacional de Imunização”.
Contradição de Fux
Diferentemente do que o presidente da Corte, Luiz Fux, vinha afirmando desde a semana passada, os documentos oficiais enviados mostram que a sugestão foi acolhida pela equipe do atual chefe do Supremo. O médico, no entanto, foi demitido do cargo de secretário de Serviços Integrados de Saúde no último domingo (27), após o pedido repercutir na imprensa e entre os próprios ministros.
A solicitação enviada à Fiocruz, no entanto, conforme documento revelado pelo Estadão, foi assinada pelo diretor-geral do STF, no dia 30 de novembro.
Procurado pelo Estadão, Marco Polo Freitas disse que, em 11 anos de atuação no tribunal, nunca realizou “nenhum ato administrativo sem a ciência e a anuência dos meus superiores hierárquicos”. Freitas disse ao Estadão que soube da exoneração pela imprensa.
‘Respeito à hierarquia’
“Respeito rigorosamente a hierarquia administrativa do Supremo Tribunal Federal. Nesses 11 anos no STF, nunca realizei nenhum ato administrativo sem a ciência e a anuência dos meus superiores hierárquicos. Continuarei, como médico, de corpo e alma, na luta diária pela saúde e bem-estar das pessoas”, escreveu o médico ao jornal.
“Tenho 33 anos de serviços públicos prestados à comunidade. Sou médico concursado do Supremo Tribunal Federal – STF, desde setembro de 2009. Fui Secretário da Secretaria de Serviços Integrados de Saúde do STF nas gestões do Excelentíssimo Senhor Ministro Ricardo Lewandowiski, da Excelentíssima Senhora Ministra Cármen Lúcia e do Excelentíssimo Senhor Ministro Dias Tofolli, com reconhecimento pelos serviços prestados”, acrescentou.
Na frente da Secretaria de Serviços Integrados de Saúde, cargo que ocupava desde a presidência de Ricardo Lewandowski, em 2014, Freitas fazia o acompanhamento médico dos ministros. Além de ter acesso às fichas médicas dos magistrados, ele indicava, nas viagens oficiais dos integrantes da Corte, os hospitais locais de referência para urgências de saúde. Também foi ele quem viajou a Paraty (RJ) após o acidente aéreo que levou à morte do ministro Teori Zavascki.
Repercussão
O pedido de reserva de vacinas foi duramente reprovado por integrantes do STF. “Na qualidade de integrante do Supremo, peço desculpa aos contribuintes, lembrando que todo privilégio é odioso. Os brasileiros ombreiam”, criticou o ministro Marco Aurélio na semana passada. “Super inadequado. Sinto-me, frente aos concidadãos, envergonhado.”
O relator da Lava Jato no STF, ministro Edson Fachin, endossou as críticas do colega. “Considero fora de propósito qualquer iniciativa que neste momento não siga as orientações das autoridades sanitárias.”
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Em entrevista à CNN Brasil na manhã da última segunda-feira (28), Fux disse que foi criticado por uma decisão que não autorizou e sobre a qual não havia sido informado. “É muito ruim isso”, afirmou. Fux disse à emissora que foi Marco Polo quem telefonou para a Fiocruz em nome do STF. A exoneração do médico foi publicada no domingo e passou a ter validade na última segunda-feira (28).
Com informações do Estadão e Folha de S.Paulo