
Umas das maiores escritoras brasileiras contemporâneas, Lya Luft morreu na madrugada desta quinta-feira (30), aos 83 anos. Ela estava em casa, em Porto Alegre, e fez a passagem enquanto dormia.
Gaúcha de Santa Cruz do Sul, a escritora lutava contra um câncer de pele agressivo – um melanoma – diagnosticado há sete meses, em metástase. Lya Luft chegou a ser internada, mas teve alta no último dia 21 para cumprir o seu desejo de morrer em casa.
Ao jornal Zero Hora, onde Luft era colunista, a filha da escritora, Susana Luft, contou que recebeu a notícia da morte da mãe pela manhã. Eram vizinhas de porta na capital gaúcha.
“Uma pessoa iluminada, feliz, alegre, apaixonada pelos netos. Tudo o que pôde ensinar de amor e companheirismo, ela ensinou. Era uma “galinha choca”, voltada para a família, muito calorosa e amorosa. Para nós, ela foi o ideal. Sempre foi muito amada. Para as letras, nem preciso dizer”, contou emocionada ao jornal.
Lya Luft produziu uma vasta obra. Foram mais de 30 livros publicados que transitavam nos diferentes gêneros: romances, poemas, contos, crônicas, ensaios, infantil, livro de memórias.
Ela deixa o marido, o engenheiro e escritor Vicente de Britto Pereira, os filhos Susana, que é médica, e Eduardo, professor de Filosofia, além de sete netos e netas. Também foi mãe de André, engenheiro agrônomo, falecido em 2017, aos 51 anos, após uma parada cardiorrespiratória. Em 2020, publicou o livro As Coisas Humanas, lançado em homenagem a ele.
Apesar de uma carreira reconhecida e premiada, Lya conquistou o grande público em 2003, com o livro Perdas & Ganhos, que se tornou um best-seller. Foram mais de 600 mil exemplares vendidos e 40 edições. A obra também foi traduzida para o inglês, alemão, espanhol, francês e italiano.
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Formada em Letras, fez ainda dois mestrados. Um em Linguística, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), em 1975, e outro em Literatura Brasileira, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em 1978. Entre 1969 e 1982, atuou como professora de Linguística na Faculdade Porto-Alegrense (Fapa), mas deixou de lecionar quando a carreira de escritora deslanchou.
A também escritora e ex-deputada federal Manuela D’Ávila (PCdoB-RS) lamentou a morte de sua conterrânea.
Arrependimento político de Lya Luft
Decepcionada com os governos do PT, Lya Luft votou em Jair Bolsonaro, em 2018. Mas não demorou a se arrepender, conforme contou em entrevista à Folha de S.Paulo, em junho de 2020.
“Te confesso que votei e me arrependi. Votei na falta de coisa melhor e me arrependi muito. Não conhecia direito. Queria uma trégua do PT, era muita esculhambação, corrupção, não foi uma fase boa. Votei nele e me arrependi em seguida”, disse à época ao jornal por telefone.
A entrevista foi concedida na época em Luft lançava seu livro-homenagem ao filho, quando a pandemia da covid-19 estava em seu relativamente no início.
“Parece que vivemos uma ditadura branca, uma coisa estranha, onde ele [Bolsonaro] decreta e tem que ser como ele quer. Mesmo em assunto em que ele não entende [novo coronavírus], quando estão morrendo milhares de pessoas. Essas distrações dos líderes na sua própria cobiça, a distração do sofrimento das pessoas, estão me deixando muito muito entristecida, é preciso cuidar das pessoas”, disse.
Ela lamentou também que as medidas de isolamento social e uso de máscaras não estavam rigorosamente sendo cumpridas pela população.
“Muita gente ainda não está fazendo isolamento ou anda na rua sem máscara, mesmo quando cientistas recomendam. É possível reparar, em parte, a economia. Mas não pode reparar uma vida. São assuntos difíceis, filosóficos e éticos”, ponderou a escritora.