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Já imaginou ter na sua cidade um restaurante aberto a toda população e turistas, com um cardápio selecionado pelos maiores chefs do país e com um serviço de qualidade, mas que funciona em uma penitenciária e cujas garçonetes e cozinheiras são detentas? Esse lugar já existe e fica dentro de uma prisão feminina de San Diego, em Cartagena, na Colômbia.
O restaurante Interno foi inaugurado em 2016, criado pela ex-atriz Johana Bahamón, que desde 2012 se dedica à Fundação Ação Interna, uma entidade sem fins lucrativos que visa dar dignidade e melhorar a vida de detentos e ex-detentos colombianos. A fundação tem três linhas de ação: crescimento interno, reabilitação de dependências químicas e apoio psicossocial. A organização já beneficiou mais de 30 mil pessoas em 37 presídios do país, e seu projeto gastronômico é sem dúvida o de maior sucesso. No ano passado, a revista TIME considerou o Interno como o sétimo melhor restaurante do mundo.
Considerada uma das mulheres de maior destaque na economia criativa na América Latina, Bahamón começou a atuar em 2000. Após fazer parte de 15 produções televisivas, deixou a carreira para se dedicar exclusivamente à população carcerária do seu país. Em 2013, criou a Fundação Ação Interna (Fundación Acción Interna). Em entrevista para o site Semana, ela explicou sobre a iniciativa que a fez mudar seu futuro.
Na preparação para um personagem, Bahamón conheceu uma detenta condenada por assassinar o marido. O crime foi motivado pelo fato de a mulher haver flagrado o homem estuprando seu filho de 3 anos. O filho da atriz tinha a mesma idade na época. A partir daquele momento, uma série de reflexões passou por sua cabeça. “Pude entender o que essa pessoa tinha vivido e a razão pela qual ela estava ali”, afirmou.
“A primeira coisa que alguém que vai para a cadeia quer é sair de lá rapidamente. O oposto aconteceu comigo: eu queria voltar”.
A empreendedora tinha uma viagem programada para as férias e decidiu cancelar para voltar à penitenciária. Fundou então um grupo de teatro no presídio feminino “El Buen Pastor”, em Bogotá. A ideia inicial de Johana era se aposentar por um ano para trabalhar com as prisões, mas se apaixonou de tal forma pelo tema durante esse período que resolveu se dedicar somente a isso.
“Todos nós sabemos como eles são, mas uma coisa muito diferente é estar lá dentro e realmente ver o que acontece lá, como dormem, o que comem e acima de tudo, conhecer os seres humanos lá dentro. Percebi que alguém pode ser privado de sua liberdade, mas isso não significa que deva se privar de sua dignidade”, disse a atriz.
Ela defende uma Economia Criativa que produza novas oportunidades para a sociedade marginalizada. Para isso, desenvolveu metodologias para ajudar os presos a trabalharem em seu crescimento interno e socialização, e criou oportunidades de emprego para que possam trabalhar enquanto cumprem pena, o que lhes permite melhorar suas condições de vida e aprender habilidades que as ajudarão em sua futura reintegração social. Muitas das funcionárias que deixaram da prisão de Cartagena estão hoje trabalhando nos melhores restaurantes da cidade ou abriram o próprio negócio.
Com o restaurante Interno, foi possível transformar o lugar onde só se viam grades em um centro produtivo e em uma atração turística. O local fica aberto todas as noites ao público. No menu, pratos da cozinha colombiana e latino-americana, como o ceviche de pescado em leite de coco e banana e o tiradito com molho de tamarindo. Todos os vegetais servidos saem da horta da própria prisão.
“Pessoas privadas de liberdade me ensinaram a transformar erros em oportunidades”
A Fundação hoje conta com o apoio do Ministério da Justiça colombiano e do Inpec (Instituto Penitenciário e Penitenciário Nacional). Com eles e o Colsubsidio (corporação privada sem fins lucrativos que pertence ao Sistema de Subsídio Familiar e ao Sistema de Previdência e Proteção Social da Colômbia) foi montada a Freedom House, um centro de apoio que recebe os recém libertos para gerar oportunidades de emprego. “A reinserção social e trabalhista deve ser digna, como eles merecem, porque eles já cumpriram sua dívida com a sociedade e agora precisam da ajuda das pessoas que estão aqui, do outro lado. A primeira coisa que eles pedem em um emprego é o passado judicial. E sem emprego é difícil para eles reconstruírem suas vidas”, ressalta a fundadora.
Uma experiência similar aconteceu em Milão, na Itália, com o restaurante In Galera, na prisão Bollate. Atualmente, 10 reclusos atendem o público como cozinheiros ou garçons. Cerca de 30 mil pessoas já visitaram o restaurante.