
O Tribunal de Contas da União (TCU) retoma nesta terça-feira (15), às 16h, a análise do processo de privatização do sistema Eletrobras. Com dificuldades no andamento do projeto relativo à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), estacionado no Senado, o governo tentar levar adiante a venda de Eletrobras, um caso que encontra questionamentos no próprio TCU. A Federação Nacional dos Urbanitários (FNU-CUT) questiona o processo em si: “A venda da Eletrobras vai intensificar a crise e desmantelar a maior empresa de energia elétrica da América Latina, a única que pode manter o sistema estável, garantindo segurança energética para a população brasileira”.
Com relatório favorável do ministro do TCU Aroldo Cedraz, o processo que trata da privatização da Eletrobras foi apreciado preliminarmente na sessão de 15 de dezembro, mas parou devido a um pedido de vista do ministro Vital do Rêgo. Desde então, o governo passou a atuar para aprovar o relatório e barrar qualquer pretensão de que um pedido de recálculo seja apresentado na retomada da análise, o que poderia comprometer o andamento da privatização, a única de porte que o Executivo teria a apresentar ao “mercado”.
Dúvida sobre avaliação
O Tribunal de Contas tem nove ministros. Um deles fará sua “estreia”: o ex-senador Antonio Anastasia (PSD-MG). Em junho do ano passado, o parlamentar votou contra o projeto que viabilizava a privatização. A Medida Provisória (MP) 1.031 foi aprovada com margem apertada: 42 a 37. Como teve alterações, o texto voltou à Câmara e foi aprovado dias depois.
Mas Vital do Rêgo pode propor um recálculo do bônus a ser pago pela Eletrobras à União. Se isso acontecer e a proposta for aprovada pelo plenário do TCU, o governo terá dificuldades de concluir o processo neste ano – que é eleitoral. Trata-se do valor da outorga pela renovação de contratos de hidrelétricas que geram energia com subsídio federal. O gabinete do ministro teria identificado uma subavaliação “gigantesca” no valor dessa outorga.
“Festival de irregularidades”
Segundo o Coletivo Nacional dos Eletricitários, há um “festival de irregularidades” em torno da Eletrobras, que estaria contaminando, inclusive, o balanço de 2021 da companhia, “com os números de referência para a privatização”. O objetivo seria acelerar a divulgação dos resultados sem os dados completos de três subsidiárias (Eletronorte, Furnas e CGTEletrosul).
“Isso é um descalabro grotesco. A partir de agora, todas as informações financeiras e contábeis da Eletrobras estão sob suspeita e é bom que os diretores, os conselheiros e os técnicos da Eletrobras, além dos auditores externos da PricewaterhouseCoopers (PwC), liguem mesmo o sinal de alerta e fiquem preocupados. O ‘tratoraço contábil’ proposto pela Diretoria da Eletrobras expõe a imagem da empresa e reforça o interesse jocoso de fazer uma privatização a toque de caixa, a qualquer custo.” Pelo último dado disponível, referente ao terceiro trimestre, o lucro líquido cresceu 13% em 2021 em relação ao ano anterior, somando R$ 5,1 bilhões.
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O Conselho Nacional dos Consumidores de Energia Elétrica (Conacen) encaminhou ao TCU um pedido de nova análise sobre a privatização. E sugere que o tribunal peça à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) estudos de impacto regulatório e tarifário. Existe receio de que haja novos aumentos das tarifas de energia.
Marco do setor elétrico
O Brasil registrou um aumento médio de 8,28% na conta de energia elétrica dos consumidores, entre 2020 e 2021. De acordo com dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o valor cobrado passou de R$ 0,55 para R$ 0,62 a cada quilowatts-hora consumido, sem considerar impostos, como ICMS, PIS, COFINS e taxa de iluminação pública.
O constante aumento no preço do serviço é algo que preocupa o diretor de Energia Elétrica da Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), Victor iOcca. Em entrevista exclusiva ao portal Brasil61.com, ele defendeu a aprovação urgente do PL 414/2021, que trata do novo marco do setor elétrico, e que promete reduzir os custos com energia.
Segundo iOcca, os debates sobre o tema já estão maduros. Ele disse, ainda, que as ineficiências, assim como os altos custos se acumulam com o passar do tempo.
“A aprovação desse projeto é urgente, principalmente porque vamos passar por um período de transição muito longo. Depois da aprovação do projeto, ainda temos que conseguir um mercado moderno, dinâmico, no qual os pequenos consumidores consigam comprar energia de qualquer fornecedor. Isso vai demorar até décadas”, destacou.
Mercado livre
Victor iOcca explicou que, atualmente, os consumidores são obrigados a comprar energia elétrica diretamente das distribuidoras. Com o novo marco do setor, os clientes têm a oportunidade de adquirir a energia de outros fornecedores, caso desejem. Porém, as vantagens terão que ser analisadas pelos próprios compradores.
“É muito importante para o consumidor observar qual o custo exclusivo de energia e verificar se faz sentido ele migrar para o mercado livre. Às vezes, a conta de uma pequena residência não é tão grande, do ponto de vista daquela família, e ele simplesmente fazer a migração não significa que haverá uma economia enorme na fatura, ao final de cada mês”, orientou.
Conforme explicou o diretor, não haverá o fim do monopólio da distribuição de energia, pois a tendência é que uma única companhia fique responsável por esse serviço em determinada região. O que muda, de fato, é que haverá novos fornecedores. Ou seja, o consumidor poderá escolher de quem comprar a energia, mas a distribuição sempre será feita pela mesma empresa, independentemente de qual companhia esteja vendendo.
Transparência
O novo marco regulatório determina que a fatura de energia para os consumidores que optarem pelo mercado livre deverá informar, de forma separada, o valor da energia elétrica fornecida, de responsabilidade do gerador; e o valor do transporte do insumo até a residência, que continuará sendo feito pela distribuidora. Para iOcca, essa medida é fundamental.
“Quanto mais detalhes tivermos na conta de energia, mais importante será para o pequeno consumidor tomar sua decisão. Ele vai poder enxergar na fatura mensal, de forma clara, quanto está sendo pago exclusivamente pela energia elétrica, quanto ele paga para o serviço da distribuidora, quanto está sendo pago para o intermediário dessa energia elétrica”, pontuou.
Com informações do RBA e do Brasil 61