
Reportagem da Folha de S.Paulo deste domingo (4) mostra que o investimento voltado para a modernização e a ampliação das estruturas de companhias listadas na Bolsa brasileira caiu drasticamente na última década, segundo levantamento da Economatica, empresa provedora de dados financeiros.
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Investimentos evitam desvalorizar patrimônio
O estudo analisou 221 companhias de capital aberto nos últimos dez anos e revela que o desembolso, considerando a inflação, caiu de R$ 338 bilhões, em 2011, para R$ 272 bilhões em 2019, antes de a pandemia provocar um mergulho mais profundo ainda, levando o investimento a R$ 153 bilhões no ano passado.
O que mais preocupa nem é a cifra em si, mas o efeito dessa redução e o que ele sinaliza. Foram considerados os investimentos puros, aqueles que a companhia faz em si mesma quando compra maquinário, veículos e imóveis para sua modernização ou expansão — o chamado capex ou despesa com capital.
A Economatica avaliou o valor central dessa série histórica considerando quanto investimento seria necessário para evitar a desvalorização do patrimônio dessas empresas (tecnicamente, extraiu a mediana do investimento em relação à depreciação).
O resultado dessa relação entre capex e depreciação é um índice — e quando ele fica abaixo de 100% significa que o investimento não é suficiente para repor a perda de valor da empresa no tempo. Na década, esse indicador registrou uma retração 130 pontos percentuais.
Esses indicadores são calculados pelas próprias empresas e apresentados nos balanços financeiros, seguindo as regras contábeis. Analistas e economistas monitoram esses números para medir a capacidade ou disposição do acionista controlador de promover o crescimento da companhia.
Retrocesso da capacidade estatal brasileira
Em artigo publicado em O Globo deste sábado (3) Cláudio Ferraz mostra o outro lado dessa moeda: o retrocesso de décadas da capacidade estatal brasileira sob o comando de Jair Bolsonaro (sem partido). O colunista avalia que o bolsonarismo conseguiu um feito que nem as ditaduras pelas quais o país passou conseguiram.
Ferraz cita que o Brasil já deu importantes saltos de capacidade estatal nos últimos 100 anos, e alguns desses saltos aconteceram inclusive em momentos de ditadura. Primeiro com Getúlio Vargas e diversas reformas de profissionalização da burocracia e, depois, durante a ditadura militar, com a criação de algumas estruturas de alta capacidade estatal, como Embrapa.
Além disso, prossegue o colunista, o Estado brasileiro já foi precursor na implementação de programas como combate a Aids, Bolsa Família ou saúde da família. O Brasil foi um dos primeiros países a introduzir Imposto de Renda preenchido universalmente pela internet ou a utilizar urnas eletrônicas em votações.
“Por tudo isso é chocante que durante um período democrático um presidente esteja conseguindo fazer a capacidade estatal brasileira retroceder décadas, algo que não foi feito nem nas ditaduras pelas quais o país passou. Bolsonaro escolheu desde o começo de seu mandato nomear seus aliados partidários para consolidar seu apoio político em vez de buscar esse apoio nas instituições tradicionais e no jogo político com o Congresso.”
Cláudio Ferraz
Apagão estatal sob Bolsonaro
Ferraz cita um conjunto de medidas do governo Bolsonaro que resultaram na destruição da capacidade de instituições executarem tarefas. O Inpe deixou de usar sensoriamento remoto no monitoramento da Amazônia, o Inep não consegue realizar testes educacionais, o Ministério da Saúde não é capaz de implementar um sistema de testes de Covid-19 em grande escala e a CGU não utiliza mais políticas de transparência para lutar contra a corrupção.
“Finalmente chegou o apagão estatístico, em que o governo resolve acabar com os sistemas de informação para que seu retrocesso não possa ser medido e, consequentemente, punido. Assim o governo acabou com um sistema centralizado de acompanhamento de casos e mortes causados pela Covid. E mais grave ainda, o governo corta os recursos para que o IBGE não consiga realizar o Censo populacional, a mais importante ferramenta de acompanhamento de indicadores econômicos e sociais do país.”
Cláudio Ferraz
Com informações da Folha de S.Paulo e O Globo