
O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, mentiu e omitiu dados sobre as ações do governo brasileiro contra a Covid-19. Ele discursou nesta segunda-feira (24) na abertura da Assembleia Mundial da Saúde, realizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A fala ocorreu um dia depois do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) provocar aglomeração em passeio de moto no Rio. Presidente da República e apoiadores estavam sem máscaras, incluindo o ex-ministro Eduardo Pazuello.
Queiroga apresentou dados de vacinação diferentes do levantamento realizado pelo consórcio de imprensa e inflou o número de pessoas imunizadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
“Hoje, nossa maior esperança para permitir o retorno gradual e seguro à normalidade é a ampla vacinação. Até o momento, o SUS já distribuiu mais de 90 milhões de doses de vacinas e vacinou mais de 55 milhões de pessoas, dentre as quais mais de 80% de indígenas.”
Marcelo Queiroga
O consórcio de imprensa, no entanto, levantou que 41,9 milhões de pessoas receberam a primeira dose da vacina. E apenas 20,6 milhões tomaram a segunda dose. O consórcio é formado por G1, O Globo, Extra, O Estado de S.Paulo, Folha de S.Paulo e UOL e vem atuando desde o ano passado quando o Ministério da Saúde parou de divulgar informações consistentes sobre a pandemia.
Molon critica descaso de Bolsonaro
O líder da Oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), critica o descaso do presidente da República, que deve piorar a situação do país no combate à pandemia. “A ausência de Bolsonaro na Assembleia Mundial da Saúde e nas reuniões com líderes do mundo inteiro para buscar vacinas deixará nosso país ainda mais isolado das negociações por imunizantes e insumos”, escreveu.
Silêncio de Queiroga sobre patentes
Segundo Queiroga, o Brasil “coloca sua capacidade produtiva à disposição para aumentar a produção de meios de diagnósticos, tratamentos e vacinas para a covid-19”. Mas ao invés de suspensão de patentes, que já foi defendida pelo Brasil há alguns anos e tem apoio de 60 países em desenvolvimento, fala apenas em transferência de tecnologia.
“Para tal fim, devemos reforçar a cooperação técnica e a transferência de tecnologia, de modo que estamos engajados nas discussões sobre produção local e propriedade intelectual”, disse. “O aumento da capacidade produtiva global é essencial para garantirmos o acesso justo e equitativo à vacinação”.
Contradição entre discurso e prática
Embora tenha afirmado na OMS que o Brasil promove as medidas sanitárias para controlar a pandemia, o posicionamento diverge das atitudes de Bolsonaro. Além do passeio de domingo, Bolsonaro foi autuado no Maranhão na sexta-feira (21) por aglomerar e não usar máscara. No mesmo dia, o estado registrou o primeiro caso de infecção com a variante indiana da Covid-19.
O descumprimento das medidas sanitárias é prática rotineira do presidente que também continua a defender tratamentos sem eficácia e atacar prefeitos e governadores que têm adotado medidas de restrição de circulação de pessoas.
Queiroga silenciou sobre desprezo às vacinas
Queiroga também usou seus minutos diante dos governos de todo o mundo para insistir na necessidade de acesso às vacinas. Ignorando completamente o fato de do governo Bolsonaro ter ignorado as ofertas que recebeu ao longo de 2020 da Pfizer.
“Temos capacidade para imunizar, de forma célere, toda nossa população, desde que mais vacinas estejam disponíveis” disse o ministro, dando a entender que a culpa não era das autoridades nacionais.
Queiroga disse ter “orgulho” de pertencer a Covax, consórcio de países com intuito de negociar melhores preços para aquisição de vacinas. Mas também se calou sobre o país ter ficado inicialmente de fora da iniciativa internacional. E, quando aderiu, preferiu ficar com vacinas suficientes para apenas 10% da população, embora tivesse direito a doses suficientes para 50% dos brasileiros.
O ministro defendeu ainda que países mais afetados pela pandemia recebam mais doses. O lobby brasileiro por mais doses da OMS, porém, não vem surtindo efeitos. Dentro da agência, o foco não é o de garantir mais vacinas ao Brasil, mas conseguir que a produção mundial chegue a um número maior de países que, até hoje, não conseguiram vacinar nem seus médicos e enfermeiras.
Brasil é contra independência da OMS
Líderes europeus haviam proposto a criação de uma espécie de equipe internacional da OMS para agir ao redor do mundo em casos de pandemias. China e Rússia rejeitaram a proposta, com a ajuda do governo brasileiro.
Ao fazer seu pronunciamento, Queiroga foi vago. “Para prevenir futuras crises sanitárias, o Brasil apoia as discussões em torno de possíveis instrumentos sobre pandemias que levem em conta os processos de reforma da OMS, o papel central do Regulamento Sanitário Internacional, e a necessidade de cronograma adequado para avanços consensuais”, disse.
OMS adota postura agressiva por vacinas
Na abertura da Assembleia Mundial de Saúde, a OMS abandonou sua habitual diplomacia e afirmou que a falta de distribuição de vacinas é um “escândalo”. O diretor-geral da entidade, Tedros Adhanom, criticou a concentração dos imunizantes nas mãos de poucas economias e pediu mudanças.
“A questão de distribuição é escandalosa e perpetua a pandemia”, disse. penas 10 países concentram 75% de todas as vacinas aplicadas. “Não há uma forma diplomática de dizer isso. Hoje, um pequeno grupo de países controla o destino do mundo.”
Tedros Adhanom
Adhanom afirma ainda que todos os profissionais de saúde e idosos do mundo já poderiam ter sido imunizados. A OMS segue a defesa da distribuição equitativa das vacinas, por grupos prioritários ao redor do mundo, ao invés de se utilizar como critério o poder econômico dos países que podem pagar pelos imunizantes.
Nesse sentido, a OMS lançou nesta segunda-feira a meta vacinar 10% da população mundial até setembro. Até dezembro, o objetivo é de atingir 30%. “Isso é crucial para parar as mortes”, disse.
OMS quer vacinar 10% da população mundial
A agência também busca um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) para que, até meados de 2022, 60% da população mundial esteja imunizada. Mas, para que isso ocorra, a OMS pede que governos façam doações “imediatas” de vacinas para que o mecanismo internacional – a Covax – possa distribuir as doses para os países em desenvolvimento.
Na semana passada, governos e empresas anunciaram no G-20 o fornecimento de 3,5 bilhões de doses até o final de 2022. Ele ainda pede uma maior produção de vacinas, seja por meio de uma suspensão de patentes dos imunizantes ou por acordos de transferência de tecnologia. “Não entendo como isso não ocorreu ainda”, afirmou.
A OMS estima que daqui a três semanas o número de mortes pela Covid-19 no mundo ultrapasse todas as vidas perdidas ao longo de 2020. E ainda estamos no final de maio.
Com informações do Uol