
A pandemia da covid-19 trouxe perdas irrecuperáveis para educação no país. Essa é a avaliação de 43% da população, de acordo com pesquisa DataFolha, encomendada pelo Instituto Unibanco e divulgada com exclusividade pelo Uol. Estudantes pretos e pardos são os mais prejudicados e governo de Jair Bolsonaro (PL) cruza os braços.
O índice é maior entre as mulheres, com 47% das entrevistadas que compartilham essa percepção.
Homens e jovens de 16 a 24 se mostraram mais otimistas. Para 61% e 71%, respectivamente, as perdas na educação podem ser recuperadas.
Por outro lado, as perdas são vistas como irrecuperáveis por 39% dos homens e 28% dos mais jovens — 1% dos mais jovens não soube responder.
O superintendente do Instituto Unibanco, Ricardo Henriques, acredita que políticas públicas são capazes de recuperar os danos causados pela pandemia na educação do país.
“Não há por que, nem teoricamente, nem empiricamente, existir um certo fatalismo pedagógico. Há como enfrentar essa crise e, para isso, precisamos ter uma ideia de recomposição da aprendizagem”, pondera Henriques.
O superintendente do Instituto Unibanco credita a percepção da população ao que ele chama de “vivência negativa” do ensino remoto, adotado em 2020 e que seguiu até o final de 2021.
O estudo ouviu 2.070 pessoas em 129 municípios de todo o Brasil, entre os dias 23 de novembro e 2 de dezembro de 2021.
Pretos e pardos são mais prejudicados na educação
Os mais prejudicados foram os estudantes negros e pardos.
Estudo divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e o Cenpec Educação, no ano passado, mostrou que mais de 5 milhões de meninas e meninos não tiveram acesso à educação no Brasil, em novembro de 2020.
O número remete ao cenário que o país vivia no início dos anos 2000.
Os mais prejudicados foram pretos, pardos e indígenas, que correspondem a 69,3% do total de crianças e adolescentes sem acesso à educação.
Em outro levantamento, o DataFolha revelou que mesmo com o retorno gradual das aulas no final do ano passado, estudantes negros e pobres ficaram mais tempo fora das salas de aula.
Em setembro, 65% dos alunos do país tiveram suas escolas reabertas, ainda que parcialmente. Entre os estudantes brancos, o índice chegou a 72%, mas ficou em 61% para os negros.
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O coordenador de projetos do Todos pela Educação, Ivan Gontijo, o fechamento das escolas tem “impactos brutais” na educação, especialmente, para os mais vulneráveis.
Por isso, ele defende a necessidade a necessidade de reconstrução do sistema educacional depois da pandemia.
“Não queremos ter uma geração marcada pela covid-19 e que teve menos oportunidades. Mas estudos sobre escolas que ficaram fechadas por longos períodos, mostram que essa recuperação leva, no mínimo, três anos. É um processo lento que exige muita dedicação das secretarias e de quem está lá na ponta como professores, diretores, funcionários. Precisamos reconstruir o sistema educacional depois da pandemia”, afirmou em entrevista ao Brasil 61.
Comportamento das crianças mudou
Mais um levantamento do DataFolha, desta vez encomendada pela Fundação Lemann e o Instituto Natura, mostrou mudanças de comportamento das crianças enquanto as escolas tiveram que permanecer fechadas.
Crianças e jovens mais tristes, agitados, nervosos e com medo durante a pandemia foi o cenário encontrado.
De acordo com os pais e responsáveis, 94% das crianças ou adolescentes tiveram alguma mudança de comportamento durante a pandemia. A maioria ganhou peso no período (56%); 44% se sentiram tristes; 38% ficaram com mais medo; e 34% perderam o interesse pela escola. Entre os que ficam sozinhos em casa, são mais altos os índices dos que passaram a dormir mais, ficaram mais quietos ou têm mais dificuldades para dormir.
Somado a isso, houve o impacto na segurança alimentar, onde 34% das famílias afirmaram que a quantidade de comida foi menos que o suficiente. Nesta questão, as desigualdades aparecem na pesquisa de forma contundente.
Enquanto 46% das famílias no Nordeste apontam insuficiência na quantidade de comida, no Sul esse dado cai para 18%.
Entre os que relataram insuficiência de alimentos, 63% são pretos e pardos, 63% das famílias ganham até 1 salário mínimo e 66% afirmaram que alguém dentro de casa perdeu emprego ou renda na pandemia.
O estudo, divulgado em agosto passado, também mostrou que crianças e jovens pretos e pardos são os que mais precisam trabalhar – 10%, ante 6% os demais.
Descaso bolsonarista
Apesar dos enormes desafios que o país enfrenta, o Brasil não aumentou o orçamento do ensino fundamental ao longo dos dois primeiros anos de pandemia.
De acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil vai na contramão de que tem feito outros países.
“Cerca de dois terços dos países membros e parceiros da OCDE relataram aumentos no orçamento destinado às escolas de ensino fundamental para ajudá-las a lidar com a crise em 2020. Em comparação com o ano anterior, o Brasil não teve mudanças no orçamento de educação para o ensino fundamental, tanto em 2020 como em 2021”, afirmou em estudo publicado em setembro.
PSB na luta pela educação
O PSB, em seu processo de Autorreforma, “reafirma seu compromisso com uma educação pública, universal e de qualidade, com acesso às novas tecnologias, que garanta a inclusão dos segmentos menos favorecidos, notadamente a população negra e periférica, no mercado de trabalho e nos processos produtivos da economia do conhecimento, para não precisarem continuar – como o fazem na atualidade -, a recorrer a subempregos para sobreviver cotidianamente”.
“É preciso retomar os investimentos na educação pública, deter o sucateamento de suas estruturas de ensino e estancar os mecanismos que excluem grandes parcelas da população pobre do acesso à educação qualificada, facilitando o avanço do ensino pago. A política de permanente redução dos investimentos, em todos os níveis, justifica a afirmação de Darcy Ribeiro, segundo a qual a crise da educação no Brasil não é uma crise, é um projeto”, afirmam os socialistas na Autorreforma.
Com informações da Folha e CNN