
Para o professor universitário e epidemiologista Pedro Hallal, ciência e esporte são tratados como questões com importância esporádica. Estão no centro do debate, atualmente, por conta da pandemia da covid-19, que já matou 571.703 pessoas, e, nas últimas semanas, as Olimpíadas. Hallal defende que os investimentos sejam contínuos para que os resultados também não sejam alcançados de maneira pontual.
“A questão mais central da revolução para a ciência e o esporte é que eles deixem de ser vistos como se fossem eclipses. A verdade é que o esporte brasileiro parece um eclipse. É visto como um todo de quatro em quatro anos durante os jogos olímpicos”, defende.
“É maravilhoso comemorar a vacina do Butantan e que a Fiocruz está produzindo a vacina da Oxford/AstraZeneca. Mas a gente não pode achar que ciência e tecnologia só se faz quando tem pandemia. Porque o Brasil não teve vacina rápido? Porque nossos laboratórios não estavam em condições de concorrer na corrida mundial das vacinas. Por isso que a China, Índia, Inglaterra e Estados Unidos lançaram as primeiras vacinas. Porque a corrida das vacinas não se faz só quando chega o vírus”
Pedro Hallal
Por isso, ele ressalta que a revolução na ciência e no esporte é um investimento ininterrupto por meio de políticas de Estado: “contínuas, sustentáveis e que não dependam dos gostos, sabores ou dissabores de cada governo. A revolução no Brasil passa por fortalecer e não enfraquecer as instituições, como hoje é a política do governo federal. Para as instituições estarem empoderadas é preciso ter investimento”.
Pedro Hallal é ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e foi o convidado da 15ª live da série “Revolução Brasileira no Século 21”, que nesta quarta-feira (18) debateu “Ciência, esporte e pandemia”.
A série de lives integra as discussões sobre a Autorreforma do PSB é promovida pelo Instituto Pensar, o site Socialismo Criativo e o Partido Socialista Brasileiro (PSB). O evento também contou com a presença do presidente nacional do partido, Carlos Siqueira; do membro do Diretório Nacional do PSB, Domingos Leonelli; e da integrante da direção da Juventude Socialista Brasileira (JSB) Juliene Silva. A mediação foi feita por James Lewis.
Hallal defende escala de investimentos no esporte
Pedro Hallal defende um sistema de investimentos em esporte que a cada dez investimentos no esporte, um seja focado em alto rendimento, como atletas olímpicos, três no esporte escolar e seis no modelo de participação.
“A gente sabe que se a gente introduzir o esporte na vida de dez crianças, a gente trabalha com a ideia de que uma delas vai levar o esporte como algo para vida, como carreira, como no caso do alto rendimento. As outras nove, vão usar o esporte tanto no componente educacional, como ocorre com o boxe na Bahia, e o componente participação que entra muito forte na saúde”, explica.
O modelo educacional do esporte no país inclui apenas quatro esportes: futebol, vôlei, basquete e handball. O que para Hallal é uma falha grave.
“O esporte precisa partir de um modelo com maior diversidade para que as crianças criem o gosto pela participação”
Pedro Hallal
Por isso, Hallal acredita que uma política pública que foque na escala de investimentos proposta por ele tenha resultados concretos.
“O processo para chegar no alto rendimento é consequência de uma base bem feita. Nosso problema é a base da pirâmide”, ressalta.
Hallal destaca experiência socialista
No esporte, Hallal defende que o primeiro passo é olhar o histórico do PSB. O programa Academia da Cidade, implantado primeiro em Recife e depois expandido para Pernambuco, foi levado para todo o país como as Academias da Saúde.
“É um dos modelos mais bem sucedidos do mundo e foi noticiado pela Lancet”, observa ao se referir à publicação científica.
Caio Prado Junior e a Revolução Brasileira
Domingos Leonelli observa a revolução como processo de construção contínua – como defende Caio prado Junior – e o aproveitamento do esporte não como entretenimento ou negócio, que também são impotantes, mas principalmente, como parte da educação.
“Nós temos um capítulo denominado Revolução Criativa da Educação onde temos uma proposta concreta – que considero a mais revolucionária das nossas propostas: tornar o ensino fundamental gratuito e obrigatório para todas as crianças brasileiras. O que equivale dizer que nenhuma criança – pobre ou rica – terá que pagar para aprender. Essa educação sendo totalmente pública naturalmente levará à pressão popular”, afirma.
A pressão da classe média, afirma o socialista, obrigará os governos a elevar os níveis da educação primária e do ensino fundamental.
“E, assim, dar uma chance de igualdade a milhões de crianças brasileiras. A pressão da classe média obrigará os governos a elevar os níveis da educação primária, do ensino fundamental e, assim, dar uma chance de igualdade a milhões de crianças brasileiras. Até os filhos dos professores das escolas públicas são matriculados nas escolas particularidades, o que vai alargando esse abismo”, defende o socialista.
Estrutura do SUS é ‘espetacular’, diz Hallal
Na saúde, Pedro Hallal observa que o Sistema Único de Saúde (SUS) tem uma estrutura “espetacular”. Porém, ao passo que o atendimento básico funciona bem, o atendimento especializado continua a ser um gargalo.
“O processo entre as Unidades Básicas de Saúde (UBS) e o próximo estágio é falho”, observa.
Se não houvesse esse atendimento básico, contudo, o epidemiologista afirma que os impactos da pandemia da covid-19 no país seriam ainda mais trágicos.
Pandemia e negacionismo
A mortalidade no mundo por covid-19 é de cerca de 500 para cada um milhão de pessoas. No Brasil, são 2,6 mil mortes para cada um milhão de pessoas.
“A mortalidade por covid no Brasil é cinco vezes maior do que a média mundial. Um país que tinha tudo para estar melhor que a média mundial. Em números absolutos, é o segundo com mais mortes. Em mortalidade relativa, o Brasil é o quinto”, ressalta.
“Esse governo é diretamente responsável por uma parcela importante por essas mortes e o presidente da República também é individualmente responsável por diversas outras mortes”, critica o epidemiologista.
Além disso, ele reforça a necessidade de responsabilização pessoal de Bolsonaro como chefe do Executivo.
“Não foi o governo federal que pediu para uma criança tirar a máscara, foi o presidente da República, que falou que vacina é perigoso e que não iria comprar vacina da China”, exemplificou.
Em audiência na CPI da Pandemia, Hallal afirmou que o país poderia ter evitado 400 mil mortes se o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) tivesse tomado as medidas sanitárias necessárias para conter a pandemia.
O presidente do PSB Carlos Siqueira lembra que a pandemia é uma tragédia para a humanidade inteira, mas no Brasil poderia ter sido bem menor.
“Temos todas as condições de sobra para fazer isso de maneira bem feita. Temos uma rede de saúde que a China, que é a segunda economia do mundo, não tem que é o SUS”, afirma.
Da universidade para o Senado
O nome de Pedro Hallal tem sido muito citado para concorrer a uma vaga no Senado nas próximas eleições. O epidemiologista ganhou projeção nacional tanto por seu trabalho como coordenador do Epicovid-19, o maior estudo epidemiológico sobre coronavírus no Brasil como por seu firme combate à desinformação promovido por Bolsonaro.
Durante a live, o presidente do PSB Carlos Siqueira fez o convite para que Hallal se filie e possa disputar as próximas eleições.
Ele defendeu a importância de pessoas ligadas à área da saúde e formalizou o convite de filiação para Hallal.
“Ajude os socialistas do PSB a pensarem e defenderem uma conquista fundamental para o povo brasileiro que é o SUS. Ficaremos muito felizes se aceitar o nosso convite para fazermos a renovação Congresso Nacional e darmos a nossa contribuição, que depende de pessoas como você, de ter a coragem de entrar na política, sabendo do momento difícil, em que o sistema político está necrosado, corrompido, mas que nós não podemos viver sem a política. Já que não podemos viver sem a política, vamos procurar os melhores para formar as bancadas e defender a população”, disse Siqueira que adiantou que receberá na próxima semana reitores de universidades e institutos federais para tratar de filiações.
Hallal disse que embora não tenha vontade de ingressar em um processo eleitoral, afirma ver necessidade de vencer o negacionismo.
“Se não tivermos uma vitória acachapante, vamos entrar num processo irreversível”, disse Hallal.