Em menos de uma semana, a holding brasileira Americanas trocou de presidente, viu suas ações despencarem na Bolsa e teve que recorrer à Justiça para evitar a execução antecipada de dívidas após crise fiscal bilionária. O escândalo na varejista, que é a mais antiga operação do grupo 3G Capital e capitaneada pelo empresário Jorge Paulo Lemann — o homem mais rico do Brasil —, expõe as mazelas do capitalismo no Brasil.
Leia também: Três acionistas das Americanas faturam milhões com fraude
Com o rombo que é mais que o dobro do caixa da Americanas (R$ 8 bilhões) e superior até mesmo que o patrimônio da loja, reportado em R$ 14 bilhões, a situação da rede de lojas evidencia uma fraude que vem se avolumando há décadas, ocultada pelos executivos com o propósito de melhorar seus balanços e se valorizar no mercado.
Como resultado disso, as ações das Americanas caíram 77% na quinta-feira (13), para uma inacreditável valorização de 58,8% no dia seguinte. Na manhã desta segunda-feira (16), os papéis da empresa recuavam 38,73%. Um pedido de recuperação judicial é uma das poucas possibilidades para evitar a falência.
Os grandes prejudicados até aqui são os pequenos investidores, que viram suas ações virarem pó da noite para o dia. Nesse rol se incluem correntistas do banco digital Nubank, que promoveu um fundo de renda fixa que expôs mais de 20% da carteira a títulos corporativos. Entre eles, o das Americanas. Cerca de 1,3 milhão de cotistas foram prejudicados.
Até mesmo tubarões do mercado estão em guerra contra Lemann e equipe. André Esteves, do BTG Pactual, um dos credores das Americanas, luta na Justiça para reverter decisão que impede a execução de dívidas da companhia, afirma a Folha de S. Paulo.
Na visão do BTG, “fraude contábil não é função social legítima, merecedora de proteção da lei” e o ato “deve ser punido severamente, com suas potenciais consequências criminais”. Conforme o jornal Valor Econômico, nesta semana, os bancos Bradesco, Santander, Itaú e Safra também devem judicializar o caso. À Justiça, a Americanas S.A declarou endividamento total de R$ 40 bilhões, dos quais R$ 18,8 bilhões são com instituições financeiras.
A apelação apresentada pelo BTG ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) contra a decisão favorável às Americanas traz acusações incomuns — pelo menos no meio empresarial —, contra o trio por trás da empresa.
A ação descreve a atuação de Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira — “donos” da 3G Capital —, em outras companhias nas últimas décadas, e os acusa de agir com má-fé. Destacam ainda tentativa de retirada de R$ 800 milhões em investimentos do banco horas antes da divulgação do rombo “de maneira sorrateira”.
“O objetivo era simplesmente concluir a fraude sem exposição dos verdadeiros atores por trás do fracasso. O escândalo da Americanas não se trata de um rombo recente, mas construído ano a ano há mais de década, tudo parte de um plano engendrado para lucrar às custas de todo o mercado financeiro e sair ileso, com bens blindados no Exterior”, afirma a defesa do banco.
Essa não é uma acusação isolada. Há décadas, analistas, economistas e mesmo políticos acusam Lemann, em particular, de práticas como fraudes, corrupção, concorrência desleal, e superexploração de trabalhadores.
Caso fosse uma empresa pública, o rombo das Americanas suscitaria, ao menos, pedidos de CPI e prisões. Resta saber os próximos passos da CVM a respeito dos controladores e ex-diretores da empresa. A comissão abriu três processos administrativos para investigar as condutas dos investidores e possíveis infrações.
“Após a investigação e apuração dos atos, fatos e eventos, caso venham a ser formalmente caracterizados ilícitos e/ou infrações, cada um dos responsáveis poderá ser devidamente responsabilizado com o rigor da lei e na extensão que lhe for aplicável, sendo facultado à CVM recorrer também aos convênios e acordos de cooperação com Polícia Federal e Ministério Público Federal”, aponta a autarquia em nota.
Com informações da CNN, O Globo e Revista Movimento