
A revelação feita nesta quarta-feira (16) pelo Estadão de que o presidente Jair Bolsonaro foi munido de informações pelo embaixador Nestor Forster Junior para protelar o reconhecimento da vitória do democrata Joe Biden deixou diplomatas brasileiros no país e no exterior ainda mais constrangidos com o episódio.
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O Brasil foi o último país do grupo das 20 maiores economias do globo (G-20) a parabenizar o próximo presidente norte-americano.
“O quadro já era vergonhoso por demorarmos tanto a reconhecer algo que era óbvio, mas a constatação de que isso se deu com base no suporte do Itamaraty é ainda pior”, comentou um diplomata, sob condição de anonimato. O Estadão entrevistou quatro diplomatas ontem e nenhum se sentiu confortável em fazer declarações abertas. Argumentaram que o anonimato era a única forma de se protegerem neste momento, pois temem uma “caça às bruxas”.
Até por dever de ofício, qualquer membro do corpo diplomático costuma ser muito reservado em suas avaliações, mas o quadro de pressão tem ficado cada vez pior, segundo relataram à reportagem.
Ponto de partida: fake news
Um dos diplomatas se disse atônito com o fato de muitos telegramas enviados por Forster ao governo brasileiro terem como ponto de partida “fake news”. Esse diplomata enxergou nisso uma incoerência, uma vez que Brasília determinou a todas as embaixadas no exterior que tivessem uma atuação mais proativa em relação ao noticiário internacional envolvendo o Brasil, justamente para evitar que circulem notícias falsas sobre o País.
Nos últimos meses, embaixadores entraram em contatos com veículos de imprensa dos países onde atuam para fornecer os dados oficiais – e apontados como os corretos – sobre vários temas. Os assuntos relacionados ao desmatamento na Amazônia e outras questões ambientais são os mais comuns por atraírem atenção dos jornais internacionais.
No total, o Estadão revelou 22 páginas de telegramas enviados entre os dias 5 a 12 de novembro por Forster ao governo brasileiro. Todas obtidas por meio da Lei de Acesso à Informação. Nas mensagens, ele levou adiante o discurso de Donald Trump, de que haveria “diversos relatos” de fraudes em alguns Estados americanos.
Com base nisso, Bolsonaro apenas reconheceu o triunfo de Biden na terça-feira, 38 dias após a eleição nos EUA. Os diplomatas dizem acreditar que a posição do Planalto terá pouca influência sobre os negócios entre os dois países, mas pode pesar na relação, que já começa desgastada.
Resposta
Procurado, Forster não se manifestou antes da publicação da reportagem. Nesta quarta, em nota, afirmou que a reportagem é “falsa” e “os relatórios produzidos pela embaixada, como se constata nos próprios trechos citados na reportagem, se limitam a transmitir aspectos relevantes do processo eleitoral americano, sem emitir juízo de valor”.
A notícia do Estadão foi publicada no dia seguinte à rejeição pelo plenário do Senado da indicação do embaixador Fabio Marzano para assumir a delegação brasileira na Organização das Nações Unidas (ONU), em Genebra. A derrota caiu diretamente na conta de Ernesto Araújo e reforçou os apelos por sua demissão. A rejeição de Marzano foi um recado do Senado sobre a insatisfação dos parlamentares com sua gestão.
Com informações do Estadão