Uma das principais linhas de investigação da CPI da Pandemia no Senado é como o governo Bolsonaro apostou na teoria de que a livre circulação do novo coronavírus iria gerar uma imunidade natural de rebanho pela ampla contaminação das pessoas. Um discurso do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em um evento, em outubro do ano passado, no Palácio do Planalto, reforça essa suspeita.
No dia 19 de outubro, Bolsonaro discursou em um evento sobre a situação da covid-19 e reclamou do preço das vacinas, além de dizer que quem já tinha contraído a doença não precisaria se vacinar. O discurso foi gravado em vídeo e postado nas redes sociais do presidente.
“A vacina contra o covid, como cabe ao Ministério da Saúde definir essa questão, e já foi definida, ela não será obrigatória”, afirmou Bolsonaro. Depois, continuou: “Isso não é a toque de caixa, nem de uma hora para a outra; e nós sabemos que muita gente contraiu (covid-19) e nem sabe que contraiu, já está imunizado; vão obrigar essa pessoa a tomar essa vacina? Que inclusive por parte dessa fonte custa mais de 10 dólares, por outro lado, o nosso lado custa menos de quatro.”
Jair Bolsonaro
Bolsonaro mandou desfazer contrato com Butantan
Na semana em que Bolsonaro fez esse discurso, o Ministério da Saúde ia assinar um contrato de vacinas com o Instituto Butantan e o presidente anunciou publicamente, dias depois desse evento no Palácio, que tinha determinado que Pazuello desfizesse o contrato.
No entanto, no depoimento que prestou à CPI, o ex-ministro Eduardo Pazuello falou mais de uma vez que nunca discutiu sobre vacina com o presidente e que Bolsonaro não falou para desfazer o contrato.
“Nunca o presidente da República me mandou desfazer qualquer contrato, qualquer acordo com o Butantan, em nenhuma vez. Eu gostaria de colocar aqui uma coisa aqui diretamente, ou por documento ou por qualquer um”.
Eduardo Pazuello
Evento divulgou outro medicamento sem eficácia
No mesmo evento, em outubro do ano passado, Bolsonaro também admitiu que discutiu sobre o uso de cloroquina com o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta.
“Fui massacrado pela mídia, não tem problema, eu tenho que estar com a minha consciência em paz e quem criticava a hidroxicloroquina não apresentava alternativas. Eu falei para o Mandetta, certa vez, por que que no seu protocolo só pode ser usada a hidroxicloroquina quando o paciente está em situação grave? Deixa o médico decidir e cada médico pode decidir de maneira diferente do outro. Lógico que foi um ponto de atrito, mas não foi o mais importante”.
Jair Bolsonaro
O presidente fez as declarações em um evento junto com o ministro Marcos Pontes, da Ciência e Tecnologia, para apresentar um estudo que indicaria o uso do medicamento nitazoxanida, popularmente conhecido como ‘Annita’, em pacientes na fase precoce da covid-19.
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No entanto, em janeiro deste ano, em resposta a um requerimento da deputada Sâmia Bonfim (PSOL-SP), o Ministério da Saúde informou que “a nitazoxanida não consta nas orientações do Ministério da Saúde para o tratamento da Covid-19, e também não se encontra incluída na Relação Nacional de Medicamentos (Rename) de 2020, de forma que esse medicamento não é adquirido ou financiado com recursos federais do SUS”.
O remédio, que é um vermífugo, foi apresentado como algo que poderia reduzir a carga viral. No entanto, uma reportagem do jornal Folha de S. Paulo mostrou que o próprio estudo concluiu que a redução não significou alívio dos sintomas da doença.
Bolsonaro justifica passeios sem máscara
Em resposta ao ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), a Subchefia de Assuntos Jurídicos da Secretaria-Geral da Presidência afirmou que Bolsonaro cumpre “normas e critérios científicos e técnicos” em deslocamentos em que causa aglomerações, quase sempre sem uso de máscara de proteção facial.
O documento é uma resposta à ação relatada pelo ministro do STF em que o PSDB pede que a Justiça obrigue o presidente a respeitar medidas como uso de máscara e distanciamento social.
SinoVac pediu fim de ataques do governo Bolsonaro à China
Duas semanas após o presidente Jair Bolsonaro fazer novos ataques à China, em maio deste ano, a farmacêutica privada chinesa SinoVac cobrou uma mudança de posicionamento do governo para garantir o envio de insumos ao Instituto Butantan para a produção da vacina CoronaVac. A informação divulgada pelo jornal O Globo consta em documento sigiloso do Itamaraty enviado à CPI da Pandemia.
O ofício reproduz uma carta enviada pela Embaixada do Brasil em Pequim ao Ministério das Relações Exteriores (MRE) com o relato de uma reunião ocorrida em 19 de maio na capital chinesa entre diplomatas e representantes brasileiros com o presidente da SinoVac, Weidong Yan.
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O executivo, segundo o relato oficial, pediu uma mudança no posicionamento político do Brasil para que houvesse uma relação “mais fluida” entre os países e “fez questão de ressaltar a importância do apoio político para a realização das exportações, e mesmo a possibilidade de tratamento preferencial a determinados países”.
Na avaliação de integrantes da CPI da Pandemia, o material desmonta a tese defendida em depoimento à comissão por ministros como o titular da Saúde, Marcelo Queiroga, e o ex-chanceler Ernesto Araújo, de que as falas do presidente da República não tiveram impacto nas negociações com o país asiático para o fornecimento de imunizantes.
Pazuello e Exército ignoraram pedidos do Amazonas
O inquérito sigiloso da Polícia Federal que investiga supostos crimes do general Eduardo Pazuello reuniu evidências de que o ex-ministro da Saúde e o comando do Exército na Amazônia foram formalmente avisados sobre a “iminência de esgotamento” de oxigênio em Manaus em janeiro, cinco dias antes do colapso, com pedidos de socorro não atendidos a contento.
A existência de novos ofícios, com alertas e pedidos de ajuda detalhados, foi descoberta no curso das investigações da PF, em inquérito aberto por determinação do STF (Supremo Tribunal Federal).
Os ofícios foram enviados a Pazuello e ao comandante militar da Amazônia, general Theophilo Oliveira, que fica em Manaus. Eles são assinados pelo governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC-AM), aliado do presidente Jair Bolsonaro.
Exército, Aeronáutica e Ministério da Defesa não se pronunciaram sobre o caso. A defesa de Pazuello disse que ele não está se manifestando sobre o assunto.
Molon critica Pazuello e Exército
O líder da Oposição Alessandro Molon (PSB-RJ) criticou o posicionamento de Pazuello e do Exército Brasileiro perante o aviso do governador do Amazonas Wilson Lima (PSC-AM) sobre a “iminência de esgotamento” do oxigênio cinco dias antes do colapso em Manaus.
Com informações do jornal O Globo, Folha de S. Paulo, Revista Fórum e Uol