
O âncora e comentarista da Fox News estadunidense Tucker Carlson ganhou destaque nas redes sociais no Brasil após visita ao presidente Jair Bolsonaro (PL) no Palácio do Alvorada nesta quarta-feira, 29, para realizar uma entrevista (a terceira com governistas brasileiros). Nome central do conservadorismo na imprensa dos EUA, Carlson bateu recordes de audiência com seu programa Tucker Carlson Tonight, da Fox News, em que reitera uma postura contra políticas de imigração e pautas chamadas de identitárias.
Na entrevista ao jornalista estadunidense, divulgada em trechos traduzidos para o inglês, Bolsonaro falou que “se a esquerda voltar ao poder, (…) toda a América do Sul vai se tornar vermelha”, e citou os governos da Venezuela, Argentina, Chile e Colômbia.
Em seu programa, Carlson costuma defender que os Estados Unidos foram prejudicados pelo partido Democrata, do atual presidente Joe Biden, e “enfraquecidos” pelos recentes protestos contra o racismo, pelas autoridades de saúde durante a pandemia da covid-19 e por imigrantes.
O apresentador também alega que cresce no país o que chama de “racismo anti-brancos” e advoga contra as teses científicas sobre mudanças climáticas. Ao longo da pandemia de covid-19, se tornou um dos nomes a questionar a eficácia de vacinas contra a doença.
Um levantamento feito pelo jornal estadunidense The New York Times mostra, por exemplo, que em 600 de 1150 episódios de sua programação o apresentador citou a existência do que chama de “discriminação contra pessoas brancas” nos EUA. Por declarações como essa, críticos o acusam de flertar com a defesa de um “nacionalismo branco” – tal qual prega o nazismo – e pediram diversas vezes sua demissão do canal, o que nunca ocorreu.
As reações negativas às análises do comentarista são sempre confrontadas com a explosão de audiência angariada por Carlson, que mantém uma base fiel de 3 milhões de espectadores. Os números o colocam no topo da lista de apresentadores mais vistos do país.
O apresentador também se tornou uma voz contrária às políticas de imigração – chamada por ele de “invasão” – nos Estados Unidos. Carlson alega que existe uma conspiração das elites democratas, que chama de “classe dominante”, para “substituir” eleitores. Ele já defendeu, ainda, que movimentos feministas “atacam a masculinidade” e contribuem para uma diminuição das taxas de nascimento no mundo, além de estarem paralelos a uma diminuição do nível de testosterona dos homens. “Se você destruir os homens, que estão próximos de serem destruídos, como isso ajuda as mulheres?”, perguntou em um episódio.
Graduado em História, Carlson começou sua carreira no jornalismo sempre fazendo contrapontos conservadores em periódicos importantes nos Estados Unidos, como o Policy Review, e também na televisão em canais como CNN e MSNBC.
Em 2009, foi contratado pela Fox News, onde atuou em diversos programas até novembro de 2016. No mesmo mês em que Donald Trump foi eleito presidente nos Estados Unidos, Carlson emplacou um programa próprio no canal, o Tucker Carlson Tonight.
Na revisão do trabalho de Carlson organizada pelo New York Times, analistas apontam que o apresentador evitou se alinhar automaticamente ao ex-presidente Trump, mas foi abraçado pelo movimento “trumpista”, de apoiadores do republicano. Trump repetidamente compartilhava vídeos e publicações de Carlson, antes de ser banido do Twitter. Nas eleições presidenciais de 2020, o nome do apresentador foi estudado como um possível vice na chapa do republicano.
No ano passado, um documentário de Carlson sobre a invasão do Capitólio nos Estados Unidos motivou jornalistas da Fox News a pedirem demissão da empresa. Eles acusaram a emissora de ecoar teses contra o sistema eleitoral estadunidense e incentivar a violência.
Em uma de suas últimas apresentações, minimizou a ação de Vladmir Putin na guerra da Ucrânia. “Putin já me chamou de racista, (…) já ameaçou me demitir por discordar dele, (…) manufaturou uma pandemia, come cachorros? Não”, afirmou, ao defender que “o verdadeiro risco” seria a China.
Entrevista com Bolsonaro
Na terça-feira (28), o Tucker Carlson afirmou que o Brasil é “a única grande economia do hemisfério Sul que continua pró-América”. O comentário foi feito enquanto ele entrevistava Filipe Martins, assessor especial da Presidência que já foi acusado de fazer um gesto usado por supremacistas brancos estadunidenses ao participar de reunião no Congresso Nacional.
Bolsonaro afirmou na entrevista que os Estados Unidos podem se tornar um país isolado no mundo se a esquerda vencer as eleições presidenciais em outubro. Já o apresentador defendeu que Bolsonaro tem como oponentes uma “coalizão de bilionários, professores universitários” e o canal de televisão CNN.
Os três erros de Bolsonaro
Durante a entrevista, Tucker Carlson e Jair Bolsonaro tiraram uma foto juntos para marcar o encontro. O retrato, que foi publicado pelo apresentador e compartilhada pelo presidente nas redes sociais, tem ao menos três curiosidades, todas ligadas a fatos que marcaram negativamente a imagem do governo ou do país nos últimos tempos.
A primeira é o cocar indígena que Carlson está usando. Ele foi um presente de Bolsonaro, que é bastante criticado pela forma como lida com questões ambientais e pela negligência com os povos indígenas, críticas que se agravaram, inclusive internacionalmente, após o assassinato do indigenista brasileiro Bruno Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips no Vale do Javari, no Amazonas.
Especialistas defendem que a indevida utilização de artefatos e vestimentas de outros povos é uma forma de apropriação cultural.
Na estante, atrás de Bolsonaro e Carlson, aparece em destaque também um logo da Caixa Econômica Federal, cujo chefe, Pedro Guimarães, foi acusado de assédio sexual por várias funcionárias da instituição financeira . Pedro sempre pareceu muito próximo de Bolsonaro, inclusive aparecia nas lives semanais do presidente.
As denúncias de assédio sexual contra Pedro Guimarães caíram como uma bomba em meio à crise instalada no Planalto. Irritado, Jair Bolsonaro (PL) se reuniu com Guimarães, com membros da área de comunicação do governo e com o filho, Flávio Bolsonaro (PL-RJ), coordenador da campanha, na noite de terça-feira (28). No encontro com Guimarães, Bolsonaro teria dito que as denúncias de assédio são “inadmissíveis”, segundo interlocutores. Acuado, Guimarães prometeu “se defender na Justiça”.
No entanto, de acordo com a coluna do jornalista Igor Gadelha, do Metrópoles, Bolsonaro só queria efetivar a saída de Guimarães quando estivesse convencido de que as denúncias contra o executivo não eram uma armação contra o governo. Pedro Guimarães pediu demissão na quarta-feira (29).
Na mesma estante há também um boneco do ex-piloto de F1 Nelson Piquet, tricampeão mundial da categoria, e que, nos últimos tempos, tem sido mais lembrado como um entusiasta de Bolsonaro. Ele já chegou até a bancar o chofer do presidente nas comemorações do último 7 de Setembro. Nesta semana, Piquet se referiu ao piloto britânico Lewis Hamilton, sete vezes campeão mundial, como “neguinho” em uma entrevista a um canal na internet. A referência racista foi repudiada por várias entidades, ligadas ou não ao automobilismo, e pelo próprio Hamilton, que respondeu ao brasileiro com um post em português nas redes sociais.
A coincidência de referências desabonadoras na foto de Bolsonaro e Carlson não passou batida pelos usuários de redes sociais.
Com informações do Estadão e Revista Veja