
O Brasil voltou às manchetes dos jornais internacionais depois de registrar um novo pico de casos da Covid-19 na quinta-feira (25), quando o Ministério da Saúde confirmou mais 100.158 casos da doença em apenas 24 horas. É o máximo já registrado em 24 horas. O país tem agora 12.320.169 de infectados e 303.462 mortes no total, com o acréscimo de 2.777 em relação ao dia anterior.
Chamando a atenção para a crescente pressão sobre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), a agência de notícias britânica Reuters destacou, no fim da noite de ontem, que o surto no Brasil tem batido recordes semanais em razão de uma vacinação irregular, da falta de coordenação nacional e de uma nova variante do vírus.
“Os críticos, incluindo legisladores próximos ao presidente, vêm culpando cada vez mais Bolsonaro por sua forma de lidar com a pandemia. Ele recebeu duras críticas por seus esforços para impedir medidas de isolamento, por seu desprezo pelo uso de máscaras e por semear dúvidas sobre as vacinas”, diz o site.
Colapso hospitalar e isolamento do Brasil
Na mesma quinta-feira, o diário norte-americano The Washington Post estampou o colapso hospitalar vivido pelo Brasil e a situação dos médicos brasileiros, que precisam escolher quem vive e quem morre no atual momento da pandemia. Segundo o jornal, além de vagas e oxigênio, “agora o país está ficando também sem médicos” e frisou: “Eles que em muitos casos, nas últimas semanas, passaram a ‘bombear pulmões manualmente, com válvulas de silicone’.
Já a agência de notícias alemã Deutsche Welle repercutiu a medida adotada pelo governo da Argentina de suspender voos provenientes do Brasil, Chile e do México. A medida, que começa a valer a partir deste sábado (27), quer evitar a entrada de diferentes cepas do coronavírus no país e controlar a segunda onda da pandemia, após o país ultrapassar as 55 mil mortes pela doença.
Sucessivos erros do governo Bolsonaro
Citando o negacionismo bolsonarista, o austríaco Die Presse noticiou que o governo brasileiro ‘adiou repetidamente o início da vacinação e corrigiu a quantidade de doses de vacinação’.
“Isso é ainda mais trágico porque o país realmente tem o potencial para uma campanha de vacinação bem-sucedida – um sistema de saúde público abrangente e gratuito que vacinou 80 milhões de pessoas contra o vírus da gripe em três meses em 2019”, relatou.
Com o título “A má gestão da Covid-19 pelo Brasil ameaça o mundo”, o jornal inglês The Economist afirmou que Jair Bolsonaro tem muito a responder sobre a condução da epidemia.
A publicação liberal afirmou que “Bolsonaro apregoou curas charlatanescas, protestou contra medidas de isolamento e tentou impedir a publicação de dados. Ele acaba de despedir o terceiro ministro da saúde (um general do exército) desde o início da pandemia’.
‘“As vacinas não são para mim, afirmou Bolsonaro”. ‘Seu governo demorou a encomendá-los, embora fabricantes como Pfizer e Janssen os tivessem testado no Brasil’, relatou.
Drama que já afeta os vizinhos
Les Echos, o primeiro diário financeiro francês, estampou uma matéria com o título “Covid: Brasil à deriva”. No texto, o diário aponta que o ‘país registra mais de 300 mil mortes e que o risco de escassez de medicamentos e oxigênio é óbvio’, reforçando que apenas um ano depois da pandemia, Jair Bolsonaro anunciou a criação de um comitê anti-Covid.
“Até agora, ele sempre se opôs às medidas de contenção propostas pelos governadores e prefeitos (até tentou, sem sucesso, apelar ao Supremo Tribunal Federal para impedir o aplicação de tais medidas restritivas). Por falta de consenso entre os políticos, o Brasil até agora combateu a Covid de forma dispersa”, afirmou.
A rede de televisão francesa TV5 ressaltou o ‘drama brasileiro que infecta vizinhos sul-americanos’. De acordo com a emissora, uma das três maiores do mundo, ‘com número recorde de mortes diárias e um sistema de saúde à beira da ruptura, países vizinhos estão vendo o número de novos casos explodir com a circulação da variante brasileira’.
O canal sublinhou, ainda, que vários países, incluindo Uruguai, Venezuela e Peru, culparam o aumento acentuado das infecções ao país. Enquanto isso, ‘o presidente de extrema direita Jair Bolsonaro está sob pressão de todos os lados para finalmente enfrentar a pandemia agora fora de controle: 23 dos 27 estados do país relatam uma taxa de ocupação de 85% de suas unidades de cuidados intensivos e falta de oxigênio’.
Colapso sanitário e político
Também referindo-se a um país fora de controle, o francês Le Figaro, narrou as cenas o colapso sanitário em São Paulo, a metrópole de 12 milhões de habitantes, “a cidade mais rica do Brasil”, lembrando que o caos detectado em unidades de saúde reacendeu a memória do pesadelo vivido em Manaus quando, em janeiro deste ano, quando a grande cidade do coração da Amazônia foi sufocada.
“Esgotado nos hospitais, o oxigênio de 50 litros começou a ser traficado. Este precioso bem foi negociado no mercado negro por até R$ 6 mil (€ 920), seis vezes o seu preço normal. ‘É desumano ouvir alguém te pedir R$ 6 mil’”, narrou em um trecho.
O português Público.pt viu como um “cartão amarelo” os últimos recados enviados pelo Congresso a Jair Bolsonaro e disse que o presidente está a um passo do impeachment. O portal afirmou que “o presidente da Câmara dos Deputados mencionou uma ‘espiral de erros de avaliação’ no combate à pandemia pelo governo, e espera mudanças e cargos para os seus aliados”.
‘Brasil é exemplo de tudo que pode dar errado’
Em outra manchete, a BBC internacional repercutiu a opinião de Denise Garrett, epidemiologista que trabalhou por mais de 20 anos no Center for Disease Control (CDC) do Departamento de Saúde dos Estados Unidos e hoje é vice-presidente do Institute of Sabin Vaccines (Washington).
“O Brasil é um exemplo de tudo que pode dar errado em uma pandemia. Temos um país com lideranças que, além de não implementarem medidas de controle, minaram as medidas que tínhamos, como distância social, uso de máscaras e, durante muito tempo, vacinas também. Nos tornamos uma ameaça global.”
O conservador La Nación, da Argentina, estampou a tragédia brasileira com o título “Colapso no Brasil: governo admite que as mortes ‘ultrapassaram o limite do bom senso’”, em matéria na qual repercute a fala do vice-presidente Hamilton Mourão, que na quinta-feira disse ser necessário “tentar por todos os meios reduzir o número de infectados” no país.
O Página 12, também argentino, reforçou o dramático prognóstico para a pandemia no Brasil. No texto, o diário aponta que especialistas já estimam um aumento significativo no número de mortes se Jair Bolsonaro insistir em sua recusa em implementar uma quarentena nacional.
“Eles também alertam que, se as coisas permanecerem como estão, a variante amazônica pode sofrer mutação para uma ainda mais agressiva”.
Principal agência pública de notícia da Argentina, a Telám reafirmou que o Brasil pode ultrapassar 400 mil mortes em maio. Segundo o site, “as autoridades de saúde alertam que as mortes podem chegar a 400 mil em dois meses ou até antes, se o governo do presidente Jair Bolsonaro continuar a se recusar a adotar a quarentena nacional”.