
Demetrius Gomes Cavalcanti, desembargador do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), mandou o portal UOL retirar imediatamente as matérias sobre os 51 imóveis do clã Bolsonaro comprados com dinheiro vivo. O nome disso é censura.
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O desembargador aceitou as alegações dos advogados do filho do presidente, Flávio Bolsonaro (PL), em decisão liminar. A ação revogou a decisão anterior do juiz Aimar Neres de Matos da 4ª Vara Criminal de Brasília, que tinha autorizado o UOL a manter a matéria no site, uma vez que não havia motivos para sua suspensão.
Cavalcanti, por sua vez, afirmou que a reportagem “excedia o direito de livre informar”, por usar informações sigilosas, de um processo também sigiloso, que já tinha sido anulado pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ).
Trata-se de um absurdo porque uma das tarefas da imprensa é exatamente revelar ilícitos mantidos em sigilo. Não há na decisão do desembargador nenhuma contestação aos fatos narrados na reportagem.
Outra justificativa dada para retirar as matérias do ar é de que ela continha suposições indevidas sobre a origem do dinheiro vivo usado para comprar os imóveis, dando a entender que era proveniente de operações ilícitas, como as “rachadinhas”.
Censura é vista como ‘absurda’ por ministros do STF
A censura foi vista como “absurda” por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e contra o que a maioria da Corte já decidiu em diversas outras ocasiões. A previsão é de que, caso chegue aos tribunais superiores, a decisão seja derrubada.
Segundo publicou o UOL, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) “vê com muita preocupação uma decisão judicial que manda retirar um conteúdo que é baseado em fatos, em documentos”.
“Não há nenhuma inverdade nesse conteúdo. A gente acha que o Judiciário extrapola quando toma esse tipo de decisão porque cerceia o debate e impede que as pessoas tenham acesso a informações importantes. Inclusive a inicial, o pedido, é baseado no fato de que essas informações já são públicas”, diz Katia Brembatti, presidente da associação.
Em nota, a Associação Nacional de Jornais (ANJ) protestou contra a medida, que seria “mais um ato contra a liberdade de imprensa no Brasil” e estaria “privando os cidadãos do direito de serem livremente informados”.
“A ANJ espera que a decisão seja revista o quanto antes, de modo que a população tenha restabelecido o seu direito de acesso à informação”, afirmou a organização.
Posicionamento do UOL
O UOL se posicionou nessa sexta (23), e afirmou ter sofrido censura, mas ainda assim acatou a decisão. Mas irá recorrer. A Folha de S.Paulo, que faz parte do mesmo grupo que o portal UOL, publicou uma coluna humorística criticando a liminar da justiça. O texto assinado por Renato Terra afirma ser “uma coluna contendo apenas informações” citando diversos episódios de corrupção envolvendo a família Bolsonaro.
No final, a coluna adiciona um parágrafo com uma receita, uma clara referência ao período da ditadura militar no Brasil, quando havia censores a serviço do governo para impedir a publicação de textos críticos. O jornal “O Estado de S.Paulo”, toda vez que era censurado, substituía a reportagem cortada por receitas culinárias e versos de Camões.