
A corregedoria da Controladoria-Geral da União (CGU) instaurou um processo administrativo disciplinar contra dois professores da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) por terem preferido “manifestação desrespeitosa e de desapreço” contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Os docentes em questão, Eraldo dos Santos Pinheiro e Pedro Rodrigues Curi Hallal, assinaram nesta semana, como consta no Diário Oficial, um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) — instrumento de natureza consensual e que não possui caráter punitivo.
Segundo a CGU, as declarações foram dadas pelos professores durante transmissão ao vivo nos canais oficiais do Youtube e do Facebook da UFPel. O que, na prática, afirma o órgão, configura como “local de trabalho” por ser um meio digital de comunicação online disponibilizado pela universidade. Uma das falas que motivou a abertura do processo afirmava que Bolsonaro “tentou dar um golpe na comunidade”.
“Nada disso estaria acontecendo [suposta intervenção nas eleições para reitor] se a população não tivesse votado em defensor de torturador, em alguém que diz que mulher não merecia ser estuprada ou no único chefe de Estado do mundo que defende a não vacinação da população”, afirmou.
Nas redes sociais, a medida inquisitória contrária a liberdade de expressão do órgão gerou diversas críticas.
Bolsonarismo:
— João P. Romero (@Joao_P_Romero) March 3, 2021
23:59- Liberdade de expressão é sagrada, mesmo q pra espalhar mentiras e apologia à violência!
00:00- Censura pra quem nos criticar!
Mas o mais grave é a CGU dar suporte à censura bolsonarista e ajudar na ameaça à autonomia universitária.https://t.co/fJHCMHj47s
Enquanto rios de dinheiro público são tragados por corruptos, a “CGU do Bolsonaro” resolveu gastar seu tempo perseguindo professores críticos ao Presidente. Bons tempos quando a CGU não era instrumentalizada por bajuladores com vocação pra censura! https://t.co/Ky3UDjly1f
— Fabiano Contarato (@ContaratoSenado) March 3, 2021
Punição por “desapreço”
De acordo com o Globo, documentos mostraram que a CGU estabelecia que poderiam ser punidos os servidores públicos federais que usarem as redes sociais para criticar seus superiores ou órgãos que ocupam. Um dos pontos levantados pelo órgão na época foi justamente o artigo que trata de manifestações de “desapreço“.
Entretanto, a posição não é unânime dentro do governo federal. Pelo menos um ministério já expôs entendimento divergente: também no ano passado, a consultoria jurídica do Ministério da Defesa emitiu parecer reconhecendo que os servidores civis não podem ser punidos administrativamente por criticarem o presidente.
“Imoralidade administrativa”
Em 7 de fevereiro, a Rede de Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes), do Ministério da Educação (MEC), encaminhou um ofício em que pede a tomada de providências com objetivo de “prevenir e punir atos político-partidários nas instituições públicas federais de ensino“. A orientação aos dirigentes das universidades é baseada numa recomendação de 2019 do procurador-chefe da República em Goiás, Ailton Benedito de Souza.
No ofício de 2019, Ailton Benedito diz que uma manifestação política contrária ou favorável ao governo representa malferir “o princípio da impessoalidade”.
Segundo a citação do MEC ao texto do procurador, caberia punição a comentário ou ato político ocorrido “no espaço físico onde funcionam os serviços públicos; bem assim, ao se utilizarem páginas eletrônicas oficiais, redes de comunicações e outros meios institucionais para promover atos dessa natureza”.
Em outra passagem com referência ao ofício do Ministério Público Federal (MPF), é dito que “a promoção de eventos, protestos, manifestações etc. de natureza político-partidária, contrários ou favoráveis ao governo, caracteriza imoralidade administrativa”. O documento é assinado por Eduardo Gomes Salgado, diretor de Desenvolvimento da Rede de Ifes.
Com informações do jornal O Globo e G1