por Claudia de Castro Lima em 19 mar 2018
Passamos uma semana na WeWork, empresa de US$ 20 bi considerada a quarta maior Startup do mundo, que reúne no Brasil gigantes como Amazon e McKinsey.
Passamos uma semana na WeWork, empresa avaliada em 20 bilhões de dólares e considerada a quarta maior startup do mundo, que reúne no Brasil gigantes como Amazon, McKinsey e Porto Seguro.
Nos últimos oito anos, os funcionários da Keyrus, uma consultoria presente em mais de 20 países que atua na área de inteligência de dados e transformação digital de empresas, dirigiam-se a um prédio no bairro da Saúde, na zona sul de São Paulo, para trabalhar.
Lá, seus escritórios ocupavam três andares inteiros, num “ambiente mais tradicional”, segundo o CEO Javier Riera.
Em 2017, porém, a empresa cresceu muito, 60% – hoje, tem mais de 500 pessoas. “Avaliamos a possibilidade de alugar uma laje inteira em um edifício mais moderno, mas também a de irmos à WeWork.
E vimos que, em um prazo de cinco anos, teríamos o mesmo custo. Optamos então pelo modelo de escritório compartilhado.”
Todos os colaboradores da Keyrus estão alocados agora em um andar inteiro da WeWork da Avenida Paulista, a primeira unidade da startup americana inaugurada no Brasil, no começo de 2017.
Eles têm à disposição, além do mobiliário do escritório, que é fechado com paredes de vidro, limpeza, internet de alta velocidade e uma área comum com copa, onde há água saborizada, café, leite e chope de graça.
Há ainda várias salas de reunião, além de phone boots (pequenas cabines para telefonemas). Em toda unidade também existem redes, confortáveis sofás e poltronas, mesas de pebolim e de pingue-pongue.
O ambiente, embora mais refinado, pode até lembrar aqueles tradicionais coworkings.
Mas dizer que a WeWork é um deles é simplificar demais o negócio dessa empresa nova-iorquina avaliada no fim do ano passado em incríveis 20 bilhões de dólares.
Esqueça a ideia de que é um local procurado por desempregados ou autônomos.
As hot desks, mesas coletivas em espaços abertos que custam a partir de 750 reais por mês por pessoa e nas quais não há lugar fixo, geralmente usadas por empresa de uma pessoa só, representam só cerca de 10% do negócio da WeWork no país.
O grosso vem de quem aluga os espaços privados: pequenas e médias companhias ou peixes grandes como a Keyrus ou a 99 (ex-99Táxi), e o site de compras coletivas Groupon, por exemplo.
Além deles, a seguradora Porto Seguro, as gigantes Amazon e Facebook e a consultoria McKinsey, entre outras, que têm algumas áreas (a McKinsey, por exemplo, a de inovação) ou estão inteiras no espaço da startup.
Coworking ou não?
Durante uma semana, trabalhei todas as tardes em duas unidades da WeWork em São Paulo, a Berrini e a Faria Lima, para entender o que a empresa tem.
Numa quinta-feira à tarde, por volta das 16h, me encontrei na área comum da Berrini com Lucas Mendes, diretor-geral da WeWork no Brasil.
Mineiro de fala rápida e advogado de formação, Lucas contou que conheceu a empresa por volta de 2013, quando trabalhava na área de inovação do Itaú e começou a fazer pesquisas para a criação do Cubo, espaço para startups aceleradas pelo banco.
“Fui acompanhando o que acontecia com eles e mantendo conversas. E apareceu a oportunidade de ser o diretor dela bem quando a WeWork decidiu, de fato, vir para o Brasil”, disse.
A primeira unidade, a Paulista, foi inaugurada em julho de 2017 já com a lotação máxima então, 850 pessoas. Hoje, ampliada, conta com mais de 2 mil membros.
Depois, em apenas sete meses, vieram as unidades Faria Lima (980 pessoas), JK Iguatemi (700 membros), Berrini (800, mas ampliando para 1 700 com a aquisição de novos andares), Carioca (no centro do Rio, atualmente com 700 ocupantes) e Ipanema – esta, o primeiro prédio inteiro da startup no país, com nove andares mais o rooftop.
Os planos agora incluem a primeira WeWork em Belo Horizonte, ainda sem previsão de inauguração.
“Coworking é uma definição pobre para o que fazemos”, explicou Lucas.
“Aqui não é a casinha em que as pessoas vão trabalhar de chinelo. É um edifício AAA, mais da metade das empresas que estão aqui tem mais de mil funcionários.
Estamos criando o futuro do trabalho. Mas uma das coisas mais importantes, que até figura num censo que fizemos, é a ideia de comunidade: 40% de nossos membros disseram isso.”
A palavra “comunidade” é, de fato, amplamente usada por lá. Cada unidade tem um time de quatro membros, cujo líder é chamado de “community manager” e funciona como uma mescla de CEO, zelador e síndico.
A principal função dessa equipe é promover o tal sentido de pertencimento de todas as pessoas que trabalham no local.
O time sabe o que cada empresa faz, do que precisa, como uma pode se conectar com a outra. “Eles auxiliam a fazer negócios, mas também a se ligar pelo lado social”, disse Lucas.
Também ajudam as empresas-membros a organizar eventos não só em suas unidades, mas em qualquer outra da WeWork.
Na tarde de uma terça-feira, a empresária Delia Zefiro, criadora da OneLady, planejou um coquetel na unidade JK para apresentar sua marca, um e-commerce de moda feminina que usa mulheres reais como cocriadoras dos vestidos e macacões que vende.
Nos murais há os eventos da semana. Quando eu estava lá, ocorreu também um curso de ioga corporativa, para ser feita no escritório.
É o networking, promovido pelo community manager e sua equipe, e levado a sério pelos membros, que fez com que Jeff Fernandes, 26 anos, criador da produtora de vídeo Noise, escolhesse a WeWork Berrini para instalar sua empresa, que conta hoje com cinco funcionários.
“Trabalhei em vários coworkings antes. Em nenhum encontrei tanta oportunidade de negócio como aqui”, ele me contou.
Em apenas um mês, Jeff já fechou duas sociedades, uma com um marketplace de venda de arte, que precisava de conteúdo, e outra com uma fintech de “black money”, a primeira conta digital para negros do país.
Outro serviço da WeWork é o aplicativo do qual todos os seus membros podem participar. Mistura de Facebook com LinkedIn, ele conecta as pessoas das 64 cidades de 20 países em que a startup funciona.
Para João Zanocelo, um jovem de 21 anos que é sócio da Bossabox, empresa que desenvolve e gerencia softwares on-line, o app é o principal ativo de lá.
Sua empresa, que foi acelerada pela GVentures, usa muito a ferramenta especialmente para fazer consultas e aprender com o conhecimento das outras empresas.
“Claro que fomos atraídos pela estrutura, pelo ambiente, pela comodidade, por não termos custos com limpeza, com café. E pelo chope de graça e pelas happy hours, que começam lá pelas 18 horas. Mas acreditamos muito no senso de comunidade que a WeWork proporciona”, me contou, sentado em uma das poltronas da área comum da Berrini.
De acordo com dados da WeWork, de 45% a 50% dos usuários do app já fizeram negócios entre eles.
A possibilidade de se comunicar diretamente com pessoas da comunidade WeWork mundial atraiu o advogado mineiro Gabriel Senra, 30 anos, proprietário da Linte.
O negócio é uma plataforma jurídica que promete ajudar as empresas a reduzir tempo e dinheiro gastos na gestão dos processos e contratos.
Sua empresa, criada em 2015 no Vale do Silício, foi acelerada no Cubo, do Itaú, até não caber mais lá, com 25 funcionários.
Foi então para a WeWork Faria Lima. Hoje tem 30 funcionários e 12 vagas abertas. “Estar aqui é muito importante para nossa perspectiva de internacionalização”, disse ele.
“O cartão preto que abre nossa porta aqui também abre a de qualquer WeWork no mundo. Em dezembro último, por exemplo, eu trabalhei de Nova York. Em janeiro, de São Francisco.”
Espaço é dinheiro
A WeWork nasceu em 2010, em Nova York, cocriada por Adam Neumann e Miguel McKelvey.
O primeiro, que cresceu em um kibutz em Israel, teve vários negócios antes: uma startup de sapatos femininos com saltos dobráveis, uma empresa de roupas de bebês com joelheiras embutidas e uma marca fashion infantil.
Em 2008, como projeto paralelo, quis montar com uns amigos uma sala para escritórios compartilhados, pensando em sublocá-los.
A demanda foi bastante alta: Ele e Miguel, um arquiteto criado no Oregon, decidiram então investir apenas nisso.
A avaliação em 20 bilhões de dólares da WeWork, que tem receita anual de 1 bilhão de dólares, foi considerada exagerada por críticos.
Para eles, a startup, que não é proprietária de seus prédios, nada mais é do que uma imobiliária que subloca lugares moderninhos. Adam Neumann discorda e posiciona sua cria como uma “rede social física”.
Os investidores acreditam nele.
A WeWork é, hoje, a quarta startup americana mais valiosa, atrás apenas da Uber, Airbnb e SpaceX, uma companhia de foguetes, e conta com mais de 175 mil usuários globalmente.
Ela é, segundo a revista Wired, a maior inquilina privada de Manhattan, com mais de 250 mil metros quadrados de escritórios, e está prestes a conquistar o mesmo feito em Londres.
Nos EUA, andares inteiros da WeWork são ocupados por megacorporações como Amazon, Microsoft, GE e IBM.
Para as empresas menores, o benefício é evidente.
O que, no entanto, ela oferece de tão extraordinário para as grandes?
O diretor-geral do Brasil, Lucas Mendes, enumera: “Flexibilidade quando a empresa está crescendo: basta ela nos avisar que precisa, por exemplo, de mais 20 posições”
Comenta, ainda: “E também quando ela diminui. Faz sentido financeiramente estar aqui: não se gasta com mobiliário. Nós fazemos gestão do prédio, que não é a atividade-fim da empresa – e ela pode se preocupar apenas com seu negócio, aliviando as áreas de suporte”.
E continua: “O networking aqui é muito mais proveitoso. O executivo de uma grande empresa está no mesmo espaço físico que vários outros de diferentes companhias ou até do fundador de uma menor, e daí podem nascer negócios”.
Durante a semana em que trabalhei na WeWork, quebrei vários preconceitos.
Não encontrei apenas millennials, como imaginava – a média de idade é bem mais alta.
O café gratuito é incrivelmente bom: na unidade Faria Lima, é orgânico e fornecido pela Unyc; na Berrini, é da rede Suplicy (ambas controlam, respectivamente, o ponto de venda de comidinhas de cada unidade).
O local não é barulhento, dá até para ouvir a música baixinha que toca ao fundo.
Ninguém fica jogando pebolim ou pingue-pongue nem bebendo chope o dia todo, só bem no fim de tarde. Eu mesma, um copo na quinta-feira e dois na sexta – porque, afinal, era véspera de Carnaval.
E vi muita gente interagindo, se conhecendo, fazendo reuniões. Sim, de fato as pessoas labutam por lá.
Se a WeWork é, como propaga, o futuro do trabalho, só ele, o futuro, irá dizer. Se for mesmo, ele vai ser bem produtivo. E, melhor, bastante divertido.
Fonte: https://vip.abril.com.br