O Brasil terminou a última semana com 21.172 mortes por Covid-19, de acordo com o consórcio de veículos de imprensa. O número é uma marca assombrosa e ultrapassa em 8% os 19.604 óbitos registrados na semana anterior. O total entre os dias 4 e 10 de abril equivale à quantidade de mortes de 300 aviões do time da Chapecoense, ocorrido em novembro de 2016, ou ao número de vítimas de 78 desastres de Brumadinho, que aconteceu em janeiro de 2019.
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Pior país do mundo no enfrentamento à Covid-19
A situação do país é a pior do mundo, de acordo com esses indicadores. Desde 9 de março que o Brasil registra o maior número de mortes por Covid-19 todos os dias. A semana encerrada neste sábado (10) foi a mais letal em quase todas as regiões, exceto no Sul, que teve 4,5% menos vítimas em relação ao período com mais óbitos, ocorrido em meados no mês anterior, e no Norte, onde a pior semana ocorreu em maio do ano passado, ainda na “primeira onda”.
A variante mais presente no país hoje foi identificada pela primeira vez em Manaus, no Amazonas. Chamado de P1, esse tipo de coronavírus chega a ser 2,5 vezes mais transmissível que as primeiras cepas – o que ajuda a explicar a gravidade do atual momento.
Somado a isso, o Brasil tem apresentado ritmo lento de vacinação, dificultando ainda mais o avanço do combate à Covid-19. De acordo com o portal UOL, apenas 1 de cada 9 pessoas havia recebido a primeira dose do imunizante no país até este domingo (11).
Mau exemplo do presidente
Mesmo com a gravidade do cenário, o presidente Bolsonaro tem incentivado ações de descuido em relação ao vírus: promove aglomerações e evita o uso de máscara. Neste domingo (11), quando o Brasil chegou a 350 mil mortes por Covid-19, o chefe do Executivo esteve em uma comunidade de Brasília, onde deixou de utilizar o item de segurança em boa parte da visita. Ele também tirou foto ao lado de diversas pessoas, todos sem o item de proteção. “Continua em casa e daí morre de fome”, disse, com ironia, ao falar sobre medidas de isolamento social para impedir a disseminação do vírus.
Reação da comunidade científica
Os números da Covid-19 no Brasil têm sido objeto de preocupação da comunidade científica. A falta de uma política eficaz de enfrentamento pode levar não apenas o país a ter um quadro ainda mais crítico, como também agravar a situação no mundo, dizem os especialistas.
“Eu temo que o Brasil tenha perdido completamente o controle da Covid-19 nesse momento. E agora irá colocar o resto do mundo em perigo #sosbrasil”, tuitou neste domingo o epidemiologista Eric Feigl-Ding. Ele foi pesquisador da Universidade de Harvard por 16 anos, até 2020.
A demógrafa brasileira Márcia Castro, chefe do Departamento de Saúde Pública e População de Harvard classificou a situação no país como “crise humanitária”. “Nós estamos quebrando recordes todos os dias (…) Estamos em uma situação caótica, é realmente uma crise humanitária”, disse a cientista durante evento internacional na última sexta-feira (9).
Márcia publicou recentemene um estudo mostrando que a expectativa de vida no Brasil deve cair em quase dois anos, devido às mortes por Covid-19 . O número significa um retrocesso de sete anos, aponta a pesquisadora.
Punido por criticar Bolsonaro, o epidemiologista Pedro Curi Hallal declarou que “a curva de 2021 está engolindo a curva de 2020”. Para conter o avanço do vírus, ele sugeriu duas medidas imediatas: “a) 1,5 milhão de doses (de vacina) por dia; b) Lockdown nacional de três semanas, com proteção social para pessoas e empresas. Do contrário, seguimos caminhando em direção ao precipício”.
Apartheid de vacinas contra a Covid-19
Mais de 190 países iniciaram suas campanhas para imunizar a população contra a Covid-19, mas a distribuição de imunizantes tem sido desigual. O mundo tem vivido uma espécie de “apartheid de vacinas”.
Das 700 milhões de doses distribuídas no planeta até a última sexta-feira (9), 87% do total estavam concentradas nos países ricos ou considerados emergentes; apenas 0,2% das doses foi enviada aos países mais pobres. Os números são da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Se considerados os 29 países mais pobres, o número cai para 0,1%. A título de comparação, 49% das vacinas foram adquiridas pelos países mais ricos, que concentram apenas 13% da população mundial. No continente africano, onde vivem 1,2 bilhão de pessoas, foram encaminhados só 2% dos imunizantes produzidos até o momento.
A OMS sabia do risco de desigualdade na distribuição de vacinas, por isso criou ao lado de governos internacionais o consórcio Covax. O intuito era levar 2 bilhões de doses aos países mais pobres do mundo.
A meta do consórcio para o primeiro trimestre de 2021 era distribuir 100 milhões de doses, porém apenas 37 milhões foram enviadas. Segundo a OMS, os países mais pobres têm estrutura montada e estão prontos para receberem os produtos.
“O problema não é esse, mas a falta de doses”, disse o diretor-geral da OMS, Tedros Ghebreyesus. O dirigente chamou a disparidade na distribuição de doses de “grotesta” e “escândalo moral”. A falta de imunizantes ocorre devido à compra da maior parte dos produtos por parte dos países mais ricos, à baixa produção de imunizantes e à falta de recursos internacionais, aponta a organização.
O presidente da Namíbia, Hage Geingob, também fala nesse “apartheid”. “Depositamos nossa confiança nas vacinas. Mas ficamos de fora. Há um apartheid de vacinas. Lutamos contra o apartheid e agora lutamos de novo”, disse. Os dados oficiais apontam que os estadunidentes aplicaram em sua população 15 vezes mais vacinas que todo o continente africano.
“Hoje estamos testemunhando um apartheid de vacinas que apenas serve aos interesses das empresas farmacêuticas, poderosas e lucrativas”, afirmou a a diretora-executiva da UNAids, Winnie Byanyima.
A Organização Mundial do Comércio (OMS) prevê para esta semana uma reunião entre governos e empresas para tentar um acordo por uma distribuição menos desigual dos imunizantes. O temor dos países emergentes é de que as doses só comecem a ser encaminhadas quando Estados Unidos e os países europeus tiverem concluído seus programas de vacinação.
A OMS havia projetado, no início de 2021, que todos os países do mundo deveriam iniciar suas campanhas de vacinação contra a Covid-19 em cem dias. A ideia era pressionar governos e empresas a trabalhar a intensificarem as ações para imunização da população.
Com informações do UOL e O Globo