O escritor anglo-indiano Salman Rushdie, de 75 anos, foi esfaqueado no palco de um evento em Nova York, nos Estados Unidos, na sexta-feira (12). O agente literário do escritor fez uma atualização sobre o estado de saúde do autor de Versos Satânicos. De acordo com Andrew Wylie, Rushdie estava em um respirador. “As notícias não são boas”, disse. “Salman provavelmente perderá um olho; os nervos de seu braço foram cortados; e seu fígado foi esfaqueado e danificado”, completou o comunicado.
A polícia de Nova York identificou o agressor de Salman Rushdie como Hadi Matar, um homem de 24 anos, que permanece sob custódia, segundo declarou a polícia estadual de Nova York nesta sexta-feira, 12, em uma coletiva de imprensa para dar detalhes do ataque em Chautauqua, noroeste do estado de Nova York, nesta manhã.
O jovem é um residente de Fairview, Nova Jersey, disse o porta-voz da polícia, que estava falando de Jamestown, a cidade de Nova York. Neste momento “não temos indicação de um motivo” para a agressão, disse o porta-voz.
Ele acrescentou que Matar esfaqueou Rushdie pelo menos uma vez no pescoço e uma vez no abdômen, e que o escritor passou por cirurgia em um hospital em Erie, Pennsylvania, mas sua condição não é conhecida.
O porta-voz disse que Rushdie foi inicialmente atendido por um médico que estava na platéia da conferência, que também atendeu ao outro orador Henry Reese, que também foi agredido e sofreu ferimentos no rosto, mas que já teve alta.
Um repórter da agência Associated Press testemunhou o momento em que homem invadiu o palco da Chautauqua Institution e começar a agredir Rushdie enquanto ele estava sendo apresentado. O autor caiu no chão no mesmo instante e o homem foi controlado.
Segundo a governadora de Nova York, Kathy Hochul, o escritor foi salvo por um policial local. De acordo com Hochul, “ele está vivo” e “sendo cuidado conforme necessário”. A governadora veio a público fazer uma declaração cerca de duas horas depois do ataque. “Foi um policial estatal que se levantou e salvou sua vida, o protegeu e ao moderador (da conferência)”, disse.
Rushdie se tornou um inimigo público do Irã em 1988, quando sua obra Versos Satânicos foi proibida. Era o regime de Khomenei e suas palavras foram consideradas uma blasfêmia. Um ano depois, o aiatolá Ruhollah Khomeini emitiu uma fatwa pedindo a morte de Rushdie. O Irã também ofereceu também mais de US$ 3 milhões em recompensa para quem matar Rushdie.
Ativistas responsabilizam Irã pelo ataque
Defensores da liberdade de expressão e dissidentes acusaram neste sábado,13, as autoridades iranianas de serem moralmente responsáveis pelo ataque a Salman Rushdie, já que o Irã nunca revogou a fatwa emitida pelo líder iraniano Khomeini em 1989, que pedia a morte do escritor britânico.
“Independentemente de a tentativa de assassinato ter sido ordenada diretamente por Teerã ou não, o que é quase certo é que isso é o resultado de 30 anos de incitação do regime à violência contra esse famoso perpetrador”, disse a União Nacional. (NUFDI), um grupo de oposição com sede em Washington.
Durante anos, o discurso político no Irã deixou de lado a fatwa emitida pelo aiatolá Ruhollah Khomeini em 1989 na esteira de Versos Satânicos, um romance que rendeu a Rushdie o rótulo de “apóstata” na República Islâmica.
No entanto, o sucessor de Khomeini, o líder supremo Ali Khamenei, fez saber nos últimos anos que a ordem continua em vigor.
Assim, uma resposta a uma pergunta no site oficial de Khamenei afirmou em fevereiro de 2017 que a fatwa ainda era válida. “Resposta: o decreto permanece como foi emitido pelo Imam Khomeini”, dizia a mensagem. Da mesma forma, a conta no Twitter de Khamenei indicou em 2019 que a fatwa era “sólida e irrevogável”.
Defensores da liberdade de expressão acrescentam que uma recompensa de mais de US$ 3 milhões pela cabeça de Rushdie oferecida pela Fundação Jordad 15 do Irã, também permanece em vigor.
“Ali Khamenei e outros líderes do regime clerical sempre prometeram cumprir essa fatwa anti-islâmica nos últimos 34 anos”, acrescentou o Conselho Nacional de Resistência do Irã (NCRI), outro grupo de oposição proibido no Irã.
‘A verdadeira República Islâmica’
O esfaqueamento de Rushdie em um evento público no estado de Nova York, no entanto, ocorre em um momento diplomático sensível para o Irã, que está considerando uma oferta de várias potências para ressuscitar o acordo de 2015 sobre seu programa nuclear. Tal cenário aliviaria as sanções que pesam sobre a economia iraniana..
Vários comentaristas apontaram para uma conta no Facebook pertencente a um homem chamado Hadi Matar, repleta de imagens de líderes iranianos. A conta foi desativada horas após o ataque, e até o momento não foi confirmado que ela pertencia ao agressor.
Uma fonte próxima à investigação disse ao canal NBC que Matar “simpatiza com o extremismo xiita e os Guardiões da Revolução”, sem que haja evidências conclusivas de uma relação entre o agressor e aquela força iraniana.
“Esta é a verdadeira República Islâmica; você negocia com tal regime e permite que seus apoiadores entrem em sua sociedade. Entendem como nos sentimos como reféns desse regime?”, disse no Twitter Hossein Ronaghi, um defensor da República Islâmica e um dos críticos mais ferrenhos da liderança iraniana dentro do país.
Teerã, sob a lupa dos EUA
As ações do Irã estão sob escrutínio de Washington, que nas últimas semanas acusou Teerã de traçar um plano para assassinar o ex-conselheiro de Segurança Nacional John Bolton e também o dissidente iraniano Masih Alinejad, que vive nos Estados Unidos.
“Desde 1989 tem havido uma fatwa de Khomeini contra Salman Rushdie, e a República Islâmica do Irã nunca revogou essa fatwa. @khamenei_ir repetiu isso no Twitter também. Agora os apoiadores da República Islâmica estão elogiando o assassinato e me ameaçando de executar o mesmo destino como Salman Rushdie”, comentou Alinejad.
Em seu artigo sobre o ataque, a agência oficial iraniana IRNA apresentou Rushdie como “o autor apóstata” de Versos Satânicos e lembrou a fatwa emitida contra ele.
O jornal Kayhan, cujo editor é indicado por Khamenei, elogiou o agressor como um “homem corajoso e consciente do dever” que “cortou o pescoço do inimigo de Deus com uma faca”.
As autoridades iranianas não fizeram comentários oficiais neste momento. Mohammad Marandi, conselheiro da equipe de negociação do programa nuclear, escreveu no Twitter que, embora “não derrame lágrimas” por Rushdie, o que aconteceu é “estranho” em um momento crítico para a crise em torno do programa nuclear iraniano.
Com informações do jornal O Globo e O Estado de S. Paulo