O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux, defendeu a harmonia entre os poderes, mas que isso não significa impunidade contra atentados às instituições. As afirmações foram feitas durante a abertura dos trabalhos do segundo semestre do Judiciário, nesta segunda-feira (2). No mesmo dia, ex-presidentes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) divulgaram carta criticando a adoção de voto impresso.
A posição dos magistrados vem em resposta aos ataques do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) às instituições e ao sistema eleitoral do país, intensificados nos últimos dias. Ocorre ainda um dia após manifestantes irem às ruas em algumas cidades do país em atos a favor do voto impresso e de Bolsonaro.
Mesmo admitindo não ter provas sobre as ilações que faz, ele continuar a propagar desinformação e ameaças.
“Harmonia e independência entre os poderes não implicam impunidade de atos que exorbitem o necessário respeito às instituições”
Luiz Fux
Fux afirmou que a população não aceita que crises sejam resolvidas de formas contrárias ao que determina a Constituição.
“O povo brasileiro jamais aceitaria que qualquer crise, por mais severa, fosse solucionada mediante mecanismos fora da Constituição”, continuou Fux.
Fux fez a defesa das instituições
Em seu discurso, Fux ressaltou que, em uma democracia, nos momentos de crise, é preciso “fortalecer – e não deslegitimar – a confiança da sociedade nas instituições”.
Sem citar nomes, Fux declarou que ataques de “inverdades à honra dos cidadãos que se dedicam à causa pública” acabam por deslegitimar “veladamente as instituições do país”.
“Permanecemos atentos aos ataques de inverdades à honra dos cidadãos que se dedicam à causa pública. Atitudes desse jaez deslegitimam veladamente as instituições do país; ferem não apenas biografias individuais, mas corroem sorrateiramente os valores democráticos consolidados ao longo de séculos pelo suor e pelo sangue dos brasileiros que viveram em prol da construção da democracia de nosso país”, ressaltou Fux.
Fortalecimento da democracia
O ministro argumentou que a democracia é um regime que precisa ser sempre cultivado e reforçado. Se isso não for feito, as democracias, segundo ele, “tendem a ruir”.
“Tratando-se de higidez democrática, não há nada automático, natural ou perpétuo. Ao revés, o regime democrático necessita ser reiteradamente cultivado e reforçado, com civilidade, respeito às instituições e àqueles que se dedicam à causa pública. Ausentes essas deferências constitucionais, as democracias tendem a ruir”, disse.
Constituição
O presidente também falou do papel do STF em manter a defesa da Constituição e garantir a estabilidade institucional do país.
“Movido por esse espírito, o Supremo Tribunal Federal, seja nos momentos de calmaria, seja nos momentos de turbulência, tem cumprido o seu papel de salvaguardar a Constituição, atuando em prol da estabilidade institucional da nação, da harmonia entre os Poderes e da proteção da democracia, sempre pelo povo e para o povo brasileiro”.
Fux fala em tempo da Justiça x tempo da política
Fux citou ainda o papel dos juízes na democracia e fez questão de diferenciar a atuação em relação aos políticos.
“Por outro lado, a sociedade não espera de magistrados o comportamento que é próprio e típico de atores políticos. O bom juiz tem como predicados a prudência de ânimos e o silêncio na língua. Sabe o seu lugar de fala e o seu vocabulário próprio”, afirmou.
“Igualmente, o tempo da Justiça não é o tempo da política. Embora diuturnamente vigilantes para com a democracia e as instituições do país, os juízes precisam vislumbrar o momento adequado para erguer a voz diante de eventuais ameaças. Afinal, numa democracia, juízes não são talhados para tensionar”, completou o ministro.
Fux defendeu ainda o diálogo entre as instituições. “Por fim, como protagonistas de nossos tempos, não olvidemos que o maior símbolo da democracia é o diálogo. Nunca é tarde para o diálogo e para a razão. Sempre há tempo para o aprendizado mútuo, para o debate público compromissado com o desenvolvimento do país, e para a cooperação entre os cidadãos bem-intencionados”.
Carta dos ex-presidentes do TSE
Também nesta segunda, o atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, o vice-presidente do tribunal, Edson Fachin e todos os ex-presidentes do tribunal desde 1988 assinaram uma nota pública em defesa do modelo de eleições no Brasil.
“A contagem pública manual de cerca de 150 milhões de votos significará a volta ao tempo das mesas apuradoras, cenário das fraudes generalizadas que marcaram a história do Brasil”
Nota pública do presidente e ex-presidentes do TSE
Os ex-presidentes do TSE e a atual cúpula da Corte ressaltaram que o voto eletrônico é, sim, auditável, ao contrário do que prega Bolsonaro a seus aliados.
“As urnas eletrônicas são auditáveis em todas as etapas do processo, antes, durante e depois das eleições. Todos os passos, da elaboração do programa à divulgação dos resultados, podem ser acompanhados pelos partidos políticos, Procuradoria-Geral da República, Ordem dos Advogados do Brasil, Polícia Federal, universidades e outros que são especialmente convidados. É importante observar, ainda, que as urnas eletrônicas não entram em rede e não são passíveis de acesso remoto, por não estarem conectadas à internet.”
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Leia a nota pública na íntegra
O Presidente, Vice-Presidente, futuro Presidente e todos os ex-Presidentes do Tribunal Superior Eleitoral desde a Constituição de 1988 vêm perante a sociedade brasileira afirmar o que se segue:Eleições livres, seguras e limpas são da essência da democracia. No Brasil, o Congresso Nacional, por meio de legislação própria, e o Tribunal Superior Eleitoral, como organizador das eleições, conseguiram eliminar um passado de fraudes eleitorais que marcaram a história do Brasil, no Império e na República.
- Desde 1996, quando da implantação do sistema de votação eletrônica, jamais se documentou qualquer episódio de fraude nas eleições. Nesse período, o TSE já foi presidido por 15 ministros do Supremo Tribunal Federal. Ao longo dos seus 25 anos de existência, a urna eletrônica passou por sucessivos processos de modernização e aprimoramento, contando com diversas camadas de segurança.
- As urnas eletrônicas são auditáveis em todas as etapas do processo, antes, durante e depois das eleições. Todos os passos, da elaboração do programa à divulgação dos resultados, podem ser acompanhados pelos partidos políticos, Procuradoria-Geral da República, Ordem dos Advogados do Brasil, Polícia Federal, universidades e outros que são especialmente convidados. É importante observar, ainda, que as urnas eletrônicas não entram em rede e não são passíveis de acesso remoto, por não estarem conectadas à internet.
- O voto impresso não é um mecanismo adequado de auditoria a se somar aos já existentes por ser menos seguro do que o voto eletrônico, em razão dos riscos decorrentes da manipulação humana e da quebra de sigilo. Muitos países que optaram por não adotar o voto puramente eletrônico tiveram experiências históricas diferentes das nossas, sem os problemas de fraude ocorridos no Brasil com o voto em papel. Em muitos outros, a existência de voto em papel não impediu as constantes alegações de fraude, como revelam episódios recentes.
- A contagem pública manual de cerca de 150 milhões de votos significará a volta ao tempo das mesas apuradoras, cenário das fraudes generalizadas que marcaram a história do Brasil.
- A Justiça Eleitoral, por seus representantes de ontem, de hoje e do futuro, garante à sociedade brasileira a segurança, transparência e auditabilidade do sistema. Todos os ministros, juízes e servidores que a compõem continuam comprometidos com a democracia brasileira, com integridade, dedicação e responsabilidade.
Ministro LUÍS ROBERTO BARROSO
Ministro LUIZ EDSON FACHIN
Ministro ALEXANDRE DE MORAES
Ministra ROSA WEBER
Ministro LUIZ FUX
Ministro GILMAR MENDES
Ministro DIAS TOFFOLI
Ministra CÁRMEN LÚCIA
Ministro RICARDO LEWANDOWSKI
Ministro MARCO AURÉLIO MELLO
Ministro CARLOS AYRES BRITTO
Ministro CARLOS MÁRIO DA SILVA VELLOSO
Ministro JOSÉ PAULO SEPÚLVEDA PERTENCE
Ministro NELSON JOBIM
Ministro ILMAR GALVÃO
Ministro SYDNEY SANCHES
Ministro FRANCISCO REZEK
Ministro NÉRI DA SILVEIRA
Com informações da Folha de S. Paulo e G1