O Coordenador Geral da Funai de Barra do Garças, no Mato Grosso, afirmou em reunião fechada que o presidente do órgão, Marcelo Xavier, pretende legalizar o garimpo e a extração de madeira em terras indígenas. As informações são do The Intercept aliado ao site O Joio e o Trigo.
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Em gravação obtida pelo veículos, o capitão da reserva Álvaro Carvalho Peres diz que Xavier está estudando duas instruções normativas: “Uma que permite o indígena a fazer o manejo florestal, vender a madeira, cultivar a madeira. E a segunda é o garimpo em terra indígena, que já existe hoje de forma irregular”.
As declarações foram dadas em uma reunião realizada em 23 de agosto entre servidores de alto nível da Funai e indígenas ligados ao projeto Independência Indígena — que desenvolvem, junto a fazendeiros vizinhos, plantio de soja, milho e arroz dentro da Terra Indígena Sangradouro, no leste do Mato Grosso. Ouça abaixo:
“E é isso aí que o indígena quer. Indígena não quer mais a roça de toco, não, eles ficarem no sol com a enxada, não”, afirmou Peres, em outro momento. “Ele quer é o maquinário, ele quer a colheitadeira, ele quer a plantadeira, ele quer o trator”.
Marcelo Xavier também defendeu a liberação da mineração nas TIs em entrevista à Rádio Jovem Pan em agosto, dizendo que “a vontade da mineração em terras indígenas” consta na Constituição Federal, que estaria sendo descumprida. O artigo 231 o contradiz. “A lavra das riquezas minerais em terras indígenas só pode ser efetivada com autorização do Congresso Nacional”, afirma o texto constitucional — que dá ainda aos povos indígenas “usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes”.
Curiosidade macabra: Xavier, presidente do órgão nomeado por Bolsonaro, é acusado por organizações que atuam na área de ter construído uma política anti-indígena na Funai, que desde a posse do chefe do Estado não demarcou novas terras indígenas. Ele também é acusado de ser responsável pelo assassinato de Bruno Pereira e Dom Phillips.
Governo Bolsonaro já quis liberar garimpo em terras indígenas anteriormente
Em 2020, o governo federal encaminhou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei 191, que abre espaço para atividades de mineração em terras indígenas e coloca a Funai na posição de mediadora entre comunidades indígenas e empreendedores – o PL também prevê compensação financeira e participação das comunidades nos lucros.
“Esse projeto não é impositivo”, declarou o presidente Jair Bolsonaro (PL) durante visita a uma estação de garimpo ilegal na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, em outubro do ano passado. “Se vocês quiserem plantar, vão plantar. Se vão garimpar, vão garimpar. Se quiserem fazer algumas barragens no vale do rio, vão poder fazer”.
Ouvida sob sigilo, uma fonte que atuou na Diretoria de Promoção ao Desenvolvimento Social da Funai de Brasília durante a gestão Xavier lembrou que a autarquia estava sim trabalhando em uma instrução normativa de liberação da extração de madeira nas terras indígenas, mas que o entendimento geral no órgão era de que a liberação de garimpo dependeria da aprovação de uma lei complementar no Congresso Nacional.
O presidente da ONG Indigenistas Associados, que reúne funcionários da Funai, afirmou ao The Intercept que não se surpreenderia caso a cúpula da fundação tentasse editar uma instrução normativa liberando o garimpo em terras indígenas.
“Se encaixaria nessa tendência mais geral de infralegalismo autoritário que tem sido a marca do governo Bolsonaro”, afirmou Fernando Vianna.
Para o secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário, o Cimi, Antônio Eduardo de Oliveira, a atual administração da Funai tem se excedido na edição de normas infralegais que vão, em sua opinião, contra os direitos dos povos indígenas. “Esse procedimento é ilegal”, criticou. “Permite que os territórios sejam totalmente desprovidos de vida, inviabilizando a existência das gerações presentes e futuras”.