
O acompanhamento do cenário epidemiológico da pandemia de covid-19 é essencial para a definição, por parte de gestores e de autoridades de saúde, de estratégias de controle e redução de danos pela doença. Indicadores como os números de casos e de óbitos, dados de hospitalização e de atendimento por sintomas respiratórios e o percentual da população vacinada deveriam ajudam a compor o contexto da doença no país.
No entanto, desde o início da pandemia, em março de 2020, o Ministério da Saúde enfrenta dificuldades para manter a divulgação das estatísticas da pandemia de maneira linear e constante.
No dia 05 de junho, o portal do Ministério da Saúde com dados sobre a pandemia de coronavírus no país ficou fora do ar. O site voltou a funcionar só no dia seguinte, mostrando apenas os casos registrados no dia – ficaram de fora o número total de mortos e contaminados pela doença e o histórico dos dados. Na ocasião, o órgão anunciou que voltaria a publicar as informações retiradas do ar, mas continuaria dando destaque aos números das últimas 24h.
Na época, em resposta ao posicionamento do Ministério da Saúde, se intensificaram iniciativas da sociedade civil para divulgação dos dados omitidos pelo governo: repositório de dados, boletins e painéis com os números da doença. Até mesmo grandes veículos de imprensa anunciaram uma parceria para divulgação de números completos sobre o novo coronavírus no Brasil.
Já no caso mais recente, em 10 de dezembro, as plataformas digitais do Ministério da Saúde ficaram fora do ar mais uma vez. Nesse episódio, os dados sofreram um ataque cibernético que comprometeu alguns sistemas, como o e-SUS Notifica, o Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunização (SI-PNI), o ConecteSUS e funcionalidades como a emissão do Certificado Nacional de Vacinação Covid-19 e da Carteira Nacional de Vacinação Digital, que ficaram temporariamente indisponíveis.
O Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e a Polícia Federal (PF) foram acionados pelo ministério para apoio nas investigações. A PF abriu inquérito e informou que os dados do site não foram criptografados após o ataque, mas confirmou o comprometimento dos sistemas.
Dois dias depois, o ministério informou que o processo para recuperação dos registros de vacinados havia sido finalizado, sem perda de informações.
No dia 23 de dezembro, a pasta informou em publicação no Twitter que o aplicativo ConecteSUS foi restabelecido. A plataforma permaneceu fora do ar desde por 13 dias.
O ataque cibernético também prejudicou a atualização do boletim diário com a situação epidemiológica da doença. Nas últimas semanas, vários estados enfrentaram dificuldades para atualizar os dados referentes aos casos e mortes, devido à instabilidade dos sistemas, incluindo o e-SUS Notifica.
A dificuldade de atualização das informações refletiu na queda dos índices do balanço diário da pandemia divulgado pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e pelo Ministério da Saúde.
Logo nos primeiros dias após o ataque cibernético, por exemplo, o número de óbitos pela doença ficou bem abaixo do padrão que vinha sendo registrado (em torno de 150 mortes por dia). No dia 11 de dezembro, foram computadas 53 mortes e, no dia seguinte, 86. O mesmo aconteceu com o número de casos: da média de 7 mil infecções diárias, o número diário caiu para 3.355, no dia 11 de dezembro, e para 1.688 no dia seguinte.
Os balanços diários da doença no país permaneceram com defasagens em relação a diferentes estados ao longo de dezembro e no início de 2022.
Em nota enviada à imprensa, o Ministério da Saúde informou que a instabilidade nos sistemas da pasta não interfere na vigilância epidemiológica de síndromes agudas respiratórias e da covid-19.
“A pasta continua realizando o monitoramento no Brasil para as tomadas de decisões frente ao cenário atual. A pasta informa, ainda, que na última semana foram restabelecidas as plataformas e-SUS Notifica, SI-PNI e Conecte SUS, possibilitando a inclusão de dados por estados e munícipios”, disse o ministério.
Segundo a Saúde, na última semana foram restabelecidas as plataformas e-SUS Notifica, SI-PNI e ConecteSUS, possibilitando a inclusão de dados por estados e munícipios. Em relação aos registros de casos e de mortes pela covid-19 no país no período de instabilidade dos sistemas, o ministério informou que os dados lançados após o dia 10 de dezembro ainda não constam nas plataformas.
“Entretanto, todas as informações podem ser registradas pelos gestores locais e, assim que a integração de dados for restabelecida, os registros poderão ser acessados pelos usuários. A pasta reforça, ainda, que os dados não foram comprometidos e não houve perda de dados durante o incidente de segurança. Esclarece também que tem um fluxo de backup consolidado”, diz a nota.
Notificação dos casos e óbitos
A notificação dos casos de covid-19 no Brasil é regulamentada pela portaria nº 1.792, de 17 de julho de 2020. O texto define como obrigatória a notificação ao Ministério da Saúde de todos os resultados de testes diagnósticos para a detecção da covid-19, realizados por laboratórios da rede pública ou privada em todo território nacional.
Em relação aos óbitos por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), o ministério orienta que, independentemente de hospitalização, devem ser notificados pelo Sivep-Gripe. O registro do óbito também deve ocorrer, obrigatoriamente, no Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM).
Os impactos das oscilações dos sistemas de informação do Ministério da Saúde também impactaram a elaboração do boletim do Observatório Covid-19, da Fiocruz. O documento tem como objetivo orientar e disseminar informações sobre a pandemia baseadas em dados.
Falhas na testagem no país
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda como medida sanitária essencial para o enfrentamento da pandemia as ações de testar, tratar, isolar e rastrear – ou seja, a partir do diagnóstico oportuno da doença, deve-se providenciar o tratamento adequado dos pacientes, orientar o distanciamento social e promover o rastreamento dos contatos, que são aquelas pessoas que podem ter sido expostas à infecção.
Em setembro de 2021, o Ministério da Saúde lançou o Plano Nacional de Expansão da Testagem para Covid-19, com previsão inicial de ampliar a realização do diagnóstico da doença no país a partir da distribuição de cerca de 60 milhões de testes de antígeno.
Coordenação das ações de vigilância
Um dos primeiros passos para a vigilância da covid-19 acontece nos serviços de saúde, que realizam a triagem e o atendimento de pacientes com suspeita da doença. Os médicos investigam os sintomas, avaliam a necessidade dos testes de diagnóstico para confirmar a infecção, recomendam os cuidados e orientam os pacientes sobre a necessidade de isolamento.
Parte das amostras dos pacientes com suspeita de covid-19 coletadas é enviada aos Laboratórios Centrais de Saúde Pública (LACENs) dos estados. Desse conjunto, uma parcela ainda menor é encaminhada para um dos três laboratórios de referência nacional, onde são realizadas análises como o sequenciamento genômico, que revela a origem da cepa e as principais informações genéticas do vírus presente em cada amostra.
O Brasil conta com três laboratórios de referência nacional para essa identificação – o Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), no Rio de Janeiro, o Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo, e o Instituto Evandro Chagas, no Pará.
As medidas de isolamento e quarentena, que têm como objetivo evitar a transmissão do vírus foram definidas pelo Ministério da Saúde em março de 2020.
O documento dispõe sobre o isolamento de pessoas com ou sem sintomas, em investigação clínica laboratorial, por um prazo máximo de 14 dias, que pode se estender pelo mesmo período. Segundo o texto, a determinação do isolamento só pode ser feita por prescrição médica ou recomendação de agente de vigilância epidemiológica.