
O Instituição Fiscal Independente (IFI) rebateu as duras críticas feitas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, durante audiência pública organizada pela Comissão Temporária Covid-19 (CTCovid-19), no Senado Federal, nesta quinta-feira (25).
Convidado a falar sobre o Plano Nacional de Imunização (PNI) e o cumprimento de prazos, além da situação fiscal do país, na reunião o chefe da Economia do governo de Jair Bolsonaro (sem partido) questionou a atuação da IFI e pôs em dúvida as projeções do órgão do Legislativo quanto ao Produto Interno Bruto (PIB) e ao teto de gastos.
Contrapartidas para auxílio emergencial digno
Durante a audiência, o ministro da Economia foi questionado por senadores sobre a possibilidade de aumentar o valor do auxílio emergencial para R$ 600, patamar que chegou a ser pago no ano passado, no contexto do estado de calamidade decretado em razão da pandemia da Covid-19. Guedes respondeu que não descarta um benefício mais alto, mas que isso dependeria de contrapartidas como a venda de empresas públicas que dão prejuízo.
“O estado está financeiramente quebrado, mas cheio de ativos. Vimos que é possível aumentar o valor, mas tem que ser em bases sustentáveis. Se aumentar o valor sem por outro lado ter as fontes de recursos corretas, traz a superinflação ou a inflação de dois dígitos como era antigamente. O resultado final é desemprego em massa e o imposto mais cruel sobre os mais pobres que é a inflação.”
Paulo Guedes, ministro da Economia
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Os senadores também perguntaram a avaliação de Guedes sobre a carta assinada por mais de 500 economistas, empresários e banqueiros em defesa de medidas de isolamento e vacinação. Ele concordou com a necessidade de acelerar a vacinação e também em pagar o auxílio emergencial, mas para isso ele afirma que é preciso prosseguir com a agenda privatista do governo Bolsonaro.
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O argumento de Guedes é que vender as estatais não lucrativas pode ser uma fonte de recursos para garantir uma renda mínima aos trabalhadores informais e à população carente. A proposta surgiu após o ministro anunciar que o auxílio emergencial deve ser pago em quatro parcelas de R$ 250 a partir de abril, num total de R$ 44 bilhões.
“Fundo Brasil”
O ministro, então, sugeriu a criação do “Fundo Brasil”, abastecido com recursos do “patrimônio brasileiro”, oriundo da venda de estatais que dão prejuízo e até mesmo da distribuição de participações das empresas lucrativas, para distribuir renda de forma direta aos informais, os chamados “invisíveis” pelo ministro, e aos mais pobres, como foi feito com o auxílio emergencial.
“Vamos pegar o patrimônio que o Estado brasileiro tem e vamos entregar uma parte para os mais pobres e outra parte para reduzir a dívida. Vamos aliviar as gerações futuras, de um lado, garantindo justamente que nós liquidemos uma parte dessa dívida, e, por outro lado, vamos ajudar os pobres contemporâneos nossos. Vamos pegar esse patrimônio e, em vez de ele ficar participando de maracutaia, de aparelhamento político, de caixa dois, de corrupção, vamos pegar esse patrimônio e vamos dar para os mais pobres. Fundo Brasil: vamos pagar dividendos sociais para os mais frágeis.”
Paulo Guedes
Ao final da audiência, Guedes explicou como seria esse acesso à renda “sem intermediários”, via programas sociais mais robustos, abastecidos com recursos das vendas e dividendos de empresas públicas. O patrimônio do Fundo Brasil seria divido então para o Renda Brasil — que substituiria o programa Bolsa Família; para investimentos, infraestrutura, recursos hídricos; uma terça parte poderia ser direcionada para abater a dívida; e, com a última parte, poderia haver renegociação da dívida dos estados com a União.
Paulo Guedes também mencionou outra medida de auxílio econômico a ser implantada assim que o Congresso aprovar o Orçamento para 2021, o que pode ocorrer esta semana — ele fez um apelo aos parlamentares pela aprovação rápida.
Após a sanção, será possível antecipar benefícios para aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), como o 13o salário. A previsão é de R$ 50 bilhões sejam colocados em circulação, melhorando a vida dos cidadãos e aquecendo a economia.
IFI desmonta críticas sobre projeções do PIB
Na nota técnica divulgada nesta quinta, a IFI afirmou que as declarações de Guedes não são condizentes com a análise do Relatório de Acompanhamento Fiscal (RAF), divulgado em março, e reiterou que não se projeta recessão para o ano de 2021.
“Mostra-se apenas que medidas de restrição, no âmbito do combate à pandemia, geram efeitos negativos sobre a projeção de 3% de crescimento econômico. A título de exemplo, a análise mostra que a necessidade de isolamento e/ou de medidas afeitas ao chamado “lockdown”, por quatro semanas, para 50% dos setores de produção, levaria a uma redução de 1 ponto percentual no crescimento previsto para 2021. São simulações e, como tais, podem ser tecnicamente discutidas.”
Nota técnica da IFI
Quanto aos comentários de Guedes sobre as projeções para o teto de gastos e para a dívida bruta, a IFI esclareceu que mantém uma metodologia própria e transparente, também passível de avaliações. A instituição garantiu que nunca se projetou uma relação dívida/PIB de 100% para 2021.
De acordo com o texto divulgado, o teto de gastos é acompanhado pela IFI, já que uma de suas principais atribuições legais é seguir as metas fiscais (déficit primário, teto de gastos e outras). Segundo o documento, os cenários preditivos são feitos com base em dados realizados e modelos matemáticos.
“É evidente que projeções podem ser frustradas, e isso não é demérito. Nossos cenários são baseados em metodologia que classifica o risco em elevado, moderado ou baixo. Para tanto, projeta-se o nível mínimo de despesas discricionárias e, quando elas ficam abaixo desse patamar, com uma margem de 10%, o risco é considerado elevado.”
IFI
Segundo a IFI, entre 2021 e 2024, no cenário base atual, o teto tem risco moderado de ser rompido, passando a elevado em 2025. O risco mudou de elevado a moderado, em 2022, principalmente, com base na expectativa de que a inflação que corrige o teto (acumulada em 12 meses até junho deste ano) ficará mais alta do que a inflação que indexa as despesas primárias.
IFI foi inspirada em modelos dos EUA e Reino Unido
A IFI é um órgão vinculado ao Legislativo criado em 2016. A criação foi inspirada em instituições como o Congressional Budget Office (CBO), dos Estados Unidos, e o Office for Budget Responsibility (OBR), do Reino Unido.
O trabalho dessas instituições é, eminentemente, produzir informação, ampliar a transparência das contas públicas e colaborar para a disciplina fiscal do país.
Com informações da Agência Senado