Depois de muito matutar, resolvi dividir com companheiros, e eventuais leitores, algumas reflexões sobre o estágio atual do imbróglio de 2022. Claro que muita água vai rolar até abril e maio do próximo ano, quando teremos, enfim, um quadro mais aproximado da disputa das eleições presidenciais, parlamentares e dos governos de estado. Mas, no momento atual, as atenções voltam-se mais para a eleição presidencial e a questão da federação, que diz respeito a eleição de deputados federais, elementos centrais para o futuro dessa democracia insuficiente que temos em nosso Brasil.
As perguntas a se fazer são: a direita, a ultradireita e parte do centro (ão) vão se juntar novamente em 2022, como fizeram em 2018, em torno da candidatura de Bolsonaro? Ou vão sair divididas em 2022 com as candidaturas de Bolsonaro, Moro, Doria e outros menos votados? O grande capital financeiro, a Rede Globo e demais gigantes oligopolistas, vão ter força para forçar a união? Se essa união se der, tenho a impressão que o candidato mais forte a se enfrentar será o ex-juiz. Mais inteligente, mais educado, ainda mais entreguista e mais racional que Bolsonaro. Porém, menos verbalmente radical, menos “subversivo” e menos “contrarrevolucionário” no sentido de ser contra tudo o que está aí, do que o atual presidente. E foi esse radicalismo puramente ideológico que ganhou as eleições. Isso do lado de lá.
Do lado de cá, os movimentos de Lula, agora praticamente inimputável pelos erros e desonestidades jurídicas da Lava Jato, sem precisar fazer autocrítica pelos erros do PT e da esquerda, dando um show de competência política. Ele junta dois elementos aparentemente óbvios: o salvamento da democracia e o desastre administrativo, econômico e social do governo Bolsonaro-Guedes. Com o primeiro elemento, fala com o mundo político nacional e internacional. Com o segundo, com a população brasileira. E faz isso com a maestria dos gênios políticos. O argumento do salvamento da democracia parte do princípio de que a contradição principal no Brasil atual não é entre esquerda e direita. Mas, sim, entre democracia e ditadura fascista.
Este argumento coloca em segundo plano o projeto nacional de desenvolvimento moderno, sustentável, tecnológico, soberano – principal fator da argumentação de Ciro Gomes e das novas Teses da Autorreforma do PSB. E, conduz ao primeiro plano da cena as questões referentes à escolha do vice-presidente de Lula, da federação de partidos, das alianças eleitorais nos estados e nacional. Nessa lógica de que a contradição principal consiste na dicotomia democracia versus ditadura, é normal que Lula representando “naturalmente” a esquerda pretenda rachar o centro, trazendo Geraldo Alckmin para sua chapa. Assim argumentam os políticos e intelectuais de esquerda que defendem essa aliança. já o próprio Lula, pragmático, sabe que essa é a mesma fórmula que deu a vitória eleitoral ao PT em plena vigência democrática do governo de FHC.
Mas Lula está certo. Alckmin é o melhor representante do centro para compor a sua chapa como vice-presidente. Ambos são sociais-democratas, sendo que Alckmin um pouco mais ao centro. Geraldo, como Lula, é um homem simples que nunca se deixou deslumbrar pelo cargo de governador do maior estado da federação. Político sério, cumpridor da palavra empenhada, leal aos seus amigos e companheiros, extremamente trabalhador. Mil vezes melhor que o candidato a vice que Lula arranjou para Dilma. Se por outro lado Geraldo Alckmin desejasse evoluir de sua posição de socialdemocrata de centro para uma postura socialista democrática de esquerda, concordando com as teses da Autorreforma do PSB, eu ficaria muito feliz de contar em nossas fileiras com meu ex-colega deputado constituinte progressista e correto.
O que não me agrada muito é Lula querer fazer do PSB uma barriga de aluguel para o seu bom candidato a vice. Se ele quiser dar a vice ao PSB, temos excelentes nomes como Marcio França, Flavio Dino, Paulo Câmara, Renato Casagrande e o próprio presidente do partido, Carlos Siqueira. Reconheço, porém, que a possibilidade da federação de partidos – juntando PT, PSB, PCdoB, PSOL, PV, Rede e outros – talvez torne irrelevante a filiação partidária de qualquer liderança política. Novos alinhamentos podem ocorrer ao interior da federação, inclusive no desenho do programa de governo e no seu futuro cumprimento em caso de vitória.
Reforma Tributária, inclusive, com a taxação dos ganhos de capital; ensino fundamental exclusivamente gratuito para todas as crianças brasileiras; renascimento criativo da indústria; Amazônia 4.0; reforma agrária moderna; reforma urbana e cidades criativas, entre outros temas. Não posso deixar de saudar como muito positiva para a Revolução Brasileira a hipótese lançada pelo jornalista Juan Arias do El País de uma chapa formada por Lula e Ciro. Essa hipótese ensejaria a formação de uma grande federação de esquerda como uma alavanca para as profundas transformações que o Brasil precisa realizar na sua democracia.
Leia também: Negros e brancos na luta contra o racismo