
O superintendente da sucursal Bahia do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Rodrigo Santos Alves, cancelou atos de sua própria equipe técnica para liberar obras de um resort de luxo, na Praia do Forte. No cargo desde junho de 2019, o superintendente do órgão também é sócio de uma empresa imobiliária que atua na oferta de imóveis de luxo no litoral.
Nomeado pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, ele retirou uma multa de R$ 7,5 milhões que havia sido aplicada por técnicos do Ibama contra o hotel e anulou a decisão que paralisava a obra. A área onde o hotel está sendo construída é conhecida pela procriação de tartarugas marinhas.
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O Tivoli Ecoresort, cujas diárias vão de R$ 1,5 mil a R$ 7 mil, iniciou a construção de um muro na areia da praia para conter o processo de erosão em frente ao hotel. A situação é causada pela deterioração das restingas, vegetação que cobre a areia. O muro de gabião, montado com pedras acumuladas em armações de aço, começou a ser instalado em uma faixa da areia, diretamente na praia, diante das instalações do hotel.
A estrutura que fica submersa, enterrada na areia, no entanto, compromete a procriação das tartarugas, que avançam para a margem para desovar, de acordo com especialistas. O resort está localizado na mesma praia do Projeto Tamar, programa do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) de proteção aos animais marinhos.
O Tivoli Ecoresort tem origem portuguesa e faz parte do Grupo Hoteleiro Minor Hotels, que opera 13 propriedades em Portugal, Brasil e Qatar. É um dos maiores grupos hoteleiros do mundo.
Autuação em julho pelo Ibama
Em julho deste ano, após vistoria no local, os técnicos do Ibama autuaram a empresa e determinaram o embargo de “todas e quaisquer atividades relacionadas à construção em faixa de areia da praia do empreendimento”. Àquela altura, a Secretaria de Patrimônio da União (SPU), órgão vinculado ao Ministério do Planejamento, também tinha embargado a obra pelo mesmo motivo.
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Em setembro, porém, Rodrigo Santos Alves rejeitou as notificações do Ibama, sob o argumento de que o hotel já possui licença ambiental dada pelo município de Mata de São João, onde está instalado, e que o Ibama não pode se sobrepor a essa autorização. Apesar de as obras ocorrerem diretamente na faixa de areia da praia, que pertence à União, o superintendente do Ibama alegou que se trata de uma intervenção que acontece em área de domínio do hotel.
O município, afirmou Alves, licenciou “a obra de construção de muro dentro dos limites do imóvel” e considerou “o baixo impacto ambiental da obra, a importância socioeconômica do empreendimento”, além de “questões próprias de quem deve pensar no meio ambiente urbano em toda sua complexidade”.
Sócio de corretora
Além do cargo no Ibama, Alves também é sócio da corretora de imóveis Remax Jazz, que atua em gestão de imóveis de luxo no litoral baiano.
Ele não esteve no local das obras, não viu a intervenção pessoalmente, mas decidiu que “no caso concreto, em que há nos autos referências (inclusive fotos) de licenças e alvarás que o município entendeu suficientes para autorizar a obra”, não cabe ao Ibama “o papel de corregedor do processo municipal” e suas licenças locais.
“Falta sustentação à ação fiscal, por falta mesmo de materialidade”, concluiu.
Caso chegou ao MPF
Depois de analisar a obra, a equipe técnica do Ibama, acompanhada de membros do ICMBio, entendeu que a construção tinha de ser paralisada.
O Ministério Público Federal, que passou a atuar no caso, também tem o mesmo entendimento. “Estão acontecendo várias intervenções desse tipo no litoral. Não podemos deixar que isso se imponha de qualquer forma. Há um afrouxamento legal, que deve ser combatido”, diz a procuradora Bartira Araújo Góes.
Questionado sobre o assunto pelo jornal Estadão, Alves afirmou que não há acusação sobre o hotel “estar executando obras além do licenciamento existente”. “O que há é um inconformismo com o licenciamento, que desafia a via judicial, e não administrativa”, comentou.
Com informações do Estadão