“O país vai parar”. A ameaça é de Wallace Landim, o “Chorão”, presidente da Associação Brasileira de Condutores de Veículos Automotores (Abrava), que afirma que os caminhoneiros veem como “provável” uma greve após o anúncio de mais um aumento nos preços dos combustíveis pela Petrobras.
De acordo com o anúncio feito na sexta (17), o diesel ficou 14,2% mais caro nas refinarias desde ontem (18). O preço médio para as distribuidoras vai passar de R$ 4,91 para R$ 5,61 por litro. Para o consumidor final, a estatal prevê um aumento de R$ 0,63 por litro.
“A verdade é que, de uma forma ou de outra, mantendo-se essa política cruel de preços da Petrobras, o país vai parar novamente. Se não for por greve, será pelo fato de se pagar para trabalhar. A greve é o mais provável”, afirmou Chorão, em nota enviada à imprensa.
Chorão disse que a Abrava recebeu a notícia do aumento “com indignação”. Ex-apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL), o presidente da associação dos caminhoneiros disse que o governo foi incompetente ao “não ter reestruturado a Petrobras”, e acrescentou, ainda, que “o governo se acomodou”.
“Por ironia do destino o ministro apelidado de ‘Posto Ipiranga’, que deveria resolver esse problema, é o grande culpado desse caos”, disse, em referência ao ministro da Economia, Paulo Guedes. “Hoje chegamos nesse ponto crítico, sendo que ainda temos sérios riscos de falta de diesel. Bolsonaro precisa entender que ficar dando ‘xilique’ não vai resolver o problema”, afirmou.
Chorão alertou, ainda, que a alta nos preços dos combustíveis e a inflação em geral estão fazendo com que a categoria deixe de fazer a manutenção correta nos caminhões, já que os gastos com moradia e os combustíveis estão consumindo todo o orçamento. “O caminhoneiro está sendo esmagado pela inflação e pela alta do diesel”, completou.
Reajuste também na gasolina
O reajuste de 14,2% no preço do diesel nas refinarias foi anunciado nesta sexta-feira (17) pela Petrobras, que informou, ainda, aumento de 5,1% no preço da gasolina a partir de sábado (18).
Só em 2022, a gasolina vendida pela Petrobras acumula alta de 31%. Já o diesel, 68% de aumento. Segundo a estatal, as altas estão relacionadas a impactos da guerra entre Rússia e Ucrânia no valor do barril do petróleo.
O reajuste desta sexta foi discutido numa reunião emergencial do conselho de administração da estatal realizada na quinta-feira (16). O governo federal, sócio-controlador da Petrobras, tem seis dos 11 membros do conselho.
Presidente da Petrobras é a bola da vez
Para o presidente Jair Bolsonaro (PL), entretanto, o culpado pelas altas é o presidente da Petrobras, que assumiu o cargo há pouco mais de dois meses.
O químico José Mauro Ferreira foi indicado à presidência da Petrobras pelo próprio governo em abril, quando o diesel já havia subido 35% só em 2022. Ferreira agradeceu Bolsonaro em seu discurso de posse. Dois meses depois, foi escolhido como o novo “vilão” da disparada no preço dos combustíveis justamente por aqueles que o colocaram na chefia da estatal.
Horas depois de a Petrobras comunicar o aumento, o próprio presidente Bolsonaro afirmou, em entrevista concedida no Rio Grande do Norte, defender a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar Ferreira, junto com os diretores da estatal e membros de seus conselhos de administração e fiscal.
“A ideia nossa é propor uma CPI para investigar o presidente da Petrobras, os seus diretores e também o conselho administrativo e fiscal”, afirmou o presidente. “Nós queremos saber se tem algo errado nessa conduta deles.”
Ferreira faz parte do conselho de administração da Petrobras. O órgão tem 11 membros. Seis deles foram indicados pelo governo, o qual é acionista controlador da Petrobras.
Uma reunião extraordinária deste conselho foi realizada na quinta-feira (17) para discutir o reajuste dos combustíveis anunciado nesta sexta. Apesar dos protestos de Bolsonaro contra o aumento, todos os indicados por seu governo deram seu aval ao aumento, segundo noticiou o colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo.
Independentemente disso, o presidente da Câmara dos Deputados também atacou Ferreira por conta do reajuste da Petrobras e pediu que ele renuncie imediatamente à presidência da Petrobras.
“O presidente da Petrobras tem que renunciar imediatamente”, escreveu Lira, no Twitter, logo após o anúncio do reajuste. “Ele só representa a si mesmo e o que faz deixará um legado de destruição para a empresa, para o país e para o povo. Saia!!!”
Hipocrisia e ineditismo
O ex-governador do Maranhão, Flávio Dino (PSB), disse que a suposta revolta de Bolsonaro pode criar um caso inédito na história do Direito: “o presidente da República quer uma CPI para investigar a Petrobras, que integra o governo que ele chefia. E por conseguinte investigar os presidentes da Petrobras que ele mesmo nomeou. Ou seja, ele quer investigar a si próprio?”, ironizou Dino, também no Twitter.
Para a presidenta do Partido dos Trabalhadores (PT), deputada federal Gleisi Hoffmann, a eleição de um novo culpado para a alta dos preços faz parte de uma estratégia do governo para tentar afastar sua responsabilidade sobre o aumento às vésperas da eleição. Gleisi afirmou que a política de preços da Petrobras poderia ter sido alterada há muito tempo caso Bolsonaro quisesse. Para ela, a revolta não passa de hipocrisia.
“Faltando pouco mais de 100 dias para as eleições, o presidente da Câmara, Arthur Lira, faz coro com Bolsonaro para culpar exclusivamente a diretoria da Petrobrás pela extorsão nos preços dos combustíveis. Grande hipocrisia”, escreveu ela, no twitter.
O presidente da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar, reforçou que a alta dos combustíveis está ligada à política de preços da Petrobras, implantada em 2016, durante o governo de Michel Temer (MDB) e mantida na gestão Bolsonaro. Essa política atrela os preços da gasolina, diesel e gás vendidos no Brasil ao custo do petróleo no exterior, apesar de a Petrobras produzir aqui boa parte das necessidades do país.
Durante os três anos de governo Bolsonaro, a Petrobras já teve três presidentes. Nenhum deles agiu para alterar essa política. Antes de Ferreira assumir a chefia da estatal, o governo chegou a indicar o consultor Adriano Pires para o cargo. Ele desistiu de assumir a Petrobras justamente por ter trabalhado para empresas que se beneficiam dos preços altos.
No mês passado, Bolsonaro anunciou a demissão de Ferreira e indicou Caio Paes de Andrade para a presidência da Petrobras. Ele ainda não assumiu a estatal pois aguarda trâmites internos. Paes de Andrade é o atual secretário de desburocratização do Ministério da Economia, comandado por Paulo Guedes. Guedes já defendeu inúmeras vezes que estatais atuem como empresas privadas, relegando sua função social.
E o ICMS?
Antes de culpar o presidente da Petrobras pela alta dos combustíveis, Bolsonaro costumava responsabilizar o Imposto sobre Circulação de Mercado e Serviços pelos aumentos. O presidente foi um dos grandes defensores da proposta que limitou em 17% a alíquota do imposto cobrado por estados sobre gasolina e diesel – há estados que cobram 30%.
O projeto de lei sobre o assunto foi aprovado pelo Congresso Nacional nesta semana. O texto aguarda a sanção do presidente Bolsonaro para virar lei e entrar em vigor.
Na sexta, a Petrobras reajustou o diesel em 14,2% e a gasolina em 5,2%. Isso implica que, dependendo do estado, é possível que o limite do ICMS não tenha nenhum efeito prático para baixar o combustível, principalmente no caso do diesel.
Com informações do Brasil de Fato