
Um dos maiores centros históricos e turísticos da Bahia, Salvador vem sofrendo de males estruturais que estão muito além dos olhos de turistas. A capital baiana vem registrando um aumento alarmante dos chamados “furtos famélicos“, que quando uma pessoa em situação de vulnerabilidade furta itens necessários à sobrevivência.
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Dados da Defensoria Pública da Bahia (DPE-BA) apontam que prisões por furtos famélicos dobraram nos últimos cinco anos na cidade.
“É um furto motivado pela fome, necessidade básica de sobreviver. São furtos relacionados a alimentos, remédio, materiais de higiene, seja em estabelecimento comercial ou não, desde que não haja violência ou coação”, explica o defensor público Pedro Casali, coordenador da Especializada Criminal e de Execução Penal da DPE/BA.
Em números absolutos, foram registrados 287 casos de prisões por furtos famélicos nos últimos cinco anos.
De 2017 a 2021, se comparado ao número de furtos gerais em Salvador, o número de prisões por furto famélico subiu de 11,5% para 20,25%. No ano passado, dos 237 casos de furtos gerais, 20,25% correspondiam a furtos famélicos. Em 2017, foram 554 furtos gerais, sendo 11,5% famélicos. Só nos primeiros dois meses de 2022, a DPE-BA já contabiliza seis furtos famélicos.
Das 287 casos de prisões por furto famélico, 25 pessoas foram mantidas em cárcere pela justiça. Já as demais tiveram as prisões flexibilizadas e respondem o processo em liberdade.
Maioria dos presos eram negros
Segundo dados da DPE-BA, solicitado pelo jornal Alma Preta, das pessoas mantidas em cárcere, 16 pessoas eram pardas, 4 pretas e 5 não constavam a informação.
Números coletados pela Defensoria apontam que a população negra é a que mais se encontra em situação de vulnerabilidade, inclusive dentro do sistema de justiça.
Em 2019, das 5.153 prisões em flagrante, 97,8% do público preso foram pessoas negras. Quando observado o número de liberdade provisória, o percentual é quase igual entre pretos/pardos (50%) e brancos (49%), porém quando a medida é de prisão preventiva os pretos/pardos respondem por 41,4% do total e os brancos totalizam 33,7% destes registros.
“O perfil de 2020 é praticamente igual, senão piorado: 98% são pretos e pardos. Então, você vê que é uma realidade em que a população negra é a clientela da realidade das prisões brasileiras. Em Salvador, apesar de ser uma cidade negra, quando assistimos 98% de flagranteados negros, a gente percebe que não há uma proporcionalidade”, pontua o defensor Pedro Casali.
Conforme levantamento feito pela Alma Preta através de dados do site do Tribunal de Justiça da Bahia, a maioria das pessoas mantidas em cárcere são homens e 40% dos casos envolvem denúncias de furto em supermercados e lojas varejistas.