A substituição de um projeto nacional revolucionário por programas fragmentados, embora de grande valia, não seriam, como não foram, capazes de transformar profundamente a sociedade brasileira. E foi isso o que levou a esquerda brasileira ao grande equívoco de imaginar que poderia mudar a sociedade usando os mesmos métodos das classes dominantes.
Não havendo um projeto nacional de caráter democrático e revolucionário, os avanços sociais setoriais – importantíssimos, volto a repetir – aparecem como dádivas dos governos liderados pelo PT e com a participação da esquerda (PSB, PCdoB, PDT). E o povo ficou muito grato ao PT e a Lula pelo salário mínimo, pelo Bolsa Família, pelo Minha Casa Minha Vida, pelas vagas nas escolas técnicas, pelo recurso do FIES. Gratidão que, sem dúvida, é um bom capital eleitoral.
Mas gratidão não é engajamento. Não é conquista. Não é realização de um projeto em que todo o povo se sinta protagonista.
Aliás, um projeto que não poderia ser de um governo, mas de uma representação social e política do povo: um partido, ou uma frente de partidos, num movimento. Um projeto de mudanças crescentes que incluísse as que já foram realizadas. Mas contemplasse também uma transformação profunda da sociedade com reformas progressivas e estruturais nas áreas tributária, da educação, do sistema financeiro, da comunicação, da estrutura agrária, das áreas urbanas, da pesquisa e desenvolvimento, da tecnologia e inovação. E porque não das leis trabalhistas e do sistema previdenciário que terão mesmo que ser reformados para se adaptar aos tempos modernos, a nova realidade? Obviamente seria melhor que essas reformas fossem uma iniciativa da esquerda, para evitar a barbárie capitalista vinda por exemplo do governo Temer.
A esquerda teria que propor a reforma das instituições políticas valorizando a democracia participativa direta, o controle social dos governos através da lei de transparência e outros mecanismos de acesso às contas públicas. Mas, principalmente, uma reforma radical do sistema eleitoral.
A delicada questão dos monopólios das telecomunicações precisaria ser enfrentada com a lógica-democrática e não como reação política aos “meios adversários”, quando esses se colocavam contra os interesses do governo.
Se um projeto nacional contemplando todas essas áreas existisse, formando um conjunto de reformas e traduzido em linguagem popular, de forma a ser compreendido pela população, cada avanço teria sido reconhecido, não como uma dádiva, como uma conquista de toda, ou de parte, da sociedade. E se constituiria numa catapulta para novos avanços. Até o limite máximo de avanços possíveis dentro do capitalismo e a perspectiva da mudança qualitativa, quando fosse momento histórico, para uma sociedade socialista.
O projeto nacional transformador é a substancia do sentido da revolução. Apropriado pelas pessoas comuns da sociedade, dirigentes políticos, líderes sociais comunitários e profissionais, pelos intelectuais e artistas, pela juventude, possibilitaria aos governos de esquerda, legitimidade e posição de força para os embates oriundos da luta de classes e para os entraves meramente corporativos do capital e do trabalho. Seria, também, um anteparo para deslumbramentos com o poder e para desvios éticos, inclusive a corrupção.
Esse o sentido da revolução, ao menos temporariamente, perdido.
Um projeto nacional transformador para o Brasil de hoje, pressupõe um conjunto de objetivos imediatos, de médio e longo prazos, pois se trata, evidentemente, de uma Revolução democrática e processual e não de uma insurreição de caráter violento e sanguinário.
Esses objetivos estariam numa lógica de transformação que os interligassem. E, é claro, com um objetivo histórico que daria sentido a todos os outros. Um sonho. Uma utopia. Na minha visão pessoal o objetivo histórico seria uma sociedade socialista, sustentável, moderna e democrática.
15 de maio de 2017
Domingos Leonelli
Presidente do Instituto Pensar
Ex-Deputado Federal