Na última quinta (30), a Prefeitura de S. Paulo divulgou dados que expõem um perigo elevado de morte entre negros por Covid-19 maior em relação aos brancos. Segundo o boletim epidemiológico, o risco de morte é aumentado em 62% em pessoas de pele escura. Especialistas afirmam que questões socioeconômicas, como saneamento básico precário, insegurança alimentar e dificuldade de acesso à assistência médica aumentam a taxa de mortalidade.
Os dados, coletados até 24 de abril, considera o número de óbitos (suspeitos e confirmados) por coronavírus entre brancos, pretos, amarelos, pardos e indígenas, de acordo com a classificação de raça/cor do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Considerando-se 100 mil habitantes na capital, a taxa de mortalidade por idade é de 9,6 para brancos, de 15,6 para negros e de 11,88 para pardos.
Especialistas
O jornal Estado de S. Paulo ouviu diversos especialistas de várias áreas. Embora análises estratificadas por etnias sejam escassas no Brasil, estudiosos dizem que a desigualdade social é também um fator a mais de exposição à doença. Questões sociais e históricas ajudam a explicar a presença dos negros como grupo de risco da Covid-19.
“Piores condições de vida e trabalho determinam o maior risco de adoecimento e morte, não apenas pela Covid-19, mas por outras doenças. A dificuldade de acesso aos serviços de saúde é um fator crucial para aumentar o risco de complicações e óbitos”, afirma a biomédica Joilda Silva Nery, professora adjunta do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e integrante do grupo de trabalho Racismo e Saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco).
Essa dificuldade de exercer o direito à saúde não está localizada apenas no momento dramático de procurar o hospital. De acordo com a professora Márcia Alves dos Santos, pesquisadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o problema é estrutural e foi identificado, por exemplo, em um estudo do IBGE de 2019.
“A população negra demonstrou os piores indicadores no que tange à estrutura econômica, mercado de trabalho, padrão de vida e distribuição de renda e educação”, enumera. “Esses indicadores corroboram o racismo, que é um determinante em saúde. E isto está refletido no boletim epidemiológico da Prefeitura.”
A médica Denize Ornelas traduz os índices do IBGE para o dia a dia. “Uma pessoa negra não consegue fazer o isolamento social quando está doente porque tem uma casa menor que as casas de classe média, com menos cômodos, um banheiro só e até falta de água. Com isso, uma pessoa infectada traz maior risco de contaminação das pessoas ao redor”, diz a diretora de Comunicação da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade.
Celso Athayde, um dos criadores da Central Única das Favelas, acrescenta que a população negra tem poucas condições de seguir a quarentena. “O colapso do sistema acerta em cheio os mais vulneráveis, aqueles que têm cor”, avalia.
O médico e infectologista da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Paulo Olzon sugere outro recorte, diferente da questão étnica. “(O maior risco de morte entre os negros) pode não ser em relação à cor, mas sim em relação à situação socioeconômica. Provavelmente os que moram em situação pior e ganham menos são negros e pardos, se comparados aos de cor branca”, argumenta.
Com informações do Estado de S. Paulo.