Por Domingos Leonelli
SEPARAR AS ELEIÇÕES PARA VALORIZAR A DEMOCRACIA E OS PARTIDOS
Os governantes da área executiva, como prefeitos, governadores, ministros e secretários, não gostam de vincular suas realizações aos programas dos partidos. Preferem que os seus feitos sejam caracterizados como originais ou até pessoais. E como a maioria dos partidos não divulga seus próprios programas e as eleições no Brasil são personalíssimas e misturadas para cargos executivos e legislativos, os partidos vão se tornando cada vez mais irrelevantes no imaginário popular. Na maioria das vezes, são lembrados apenas como as siglas de fulano ou beltrano: PDT de Brizola, PSB de Arraes, PT de Lula, PSDB de Fernando Henrique. Mais recentemente, PL de Bolsonaro. Claro que há exceções e relativizações. O PSOL, por exemplo, é uma exceção na medida em que até agora é uma sigla maior que seus líderes mais importantes. E procura realçar em sua propaganda os compromissos com o socialismo do seu título e com as demandas identitárias. A mim me parece que o seu crescimento na juventude se deve a isso.
No caso do PT, a relativização se dá pela apropriação das realizações do governo como se fossem parte do programa do partido. Serve, assim, ao governo, ao seu líder maior que, no caso presente, é o presidente Lula, e à sua própria organização partidária.
O PT é também a grande exceção pois é o único partido no Brasil lembrado (recall) enquanto partido. O MDB já teve esse privilégio quando representava a luta contra a ditadura. Não é à toa que o PT é, disparado, o partido com maior número de votos na legenda em todas as eleições. Mas a grande maioria dos partidos no Brasil são meras siglas sem nenhuma relação de forma (título) e conteúdo (programa). São, aos olhos do povo, sopas de letras. Mesmo partidos históricos como o PSB, o PCdoB e o PCB tem dificuldade de se projetar no cenário e no imaginário do nosso povo.
Surgiu desde as eleições de 2018 um novo fenômeno um pouco semelhante ao que foi o MDB mas em sentido contrário que é o bolsonarismo. Mais que um partido é um movimento de ultra-direita,contra o sistema político, baseado em valores morais e ideológicos simplificados inicialmente reativos à corrupção e à “pouca vergonha” da política. Mesmo depois que se associou ao Centrão e perpetrou a maior corrupção eleitoral da história, conseguiu manter o impulso inicial “anti-sistema”. O principal partido desse movimento nascido das redes sociais, é o PL que já é um grande partido parlamentar mas que não tem expressão própria enquanto organização partidária. Tende a ser também o partido de Bolsonaro.
Não pretendo analisar aqui as causas sociológicas e políticas do bolsonarismo, dentre elas a despolitização e o esvaziamento ideológico dos partidos de esquerda, mas sim caracterizar o quadro partidário brasileiro.
Pretendo também demonstrar a desimportância da grande maioria dos partidos para o eleitorado e a pequeníssima importância dos deputados que constituem a base formadora dos partidos na cabeça dos eleitores. Mais de 80% deles não recorda o nome do deputado federal que votou seis meses depois das eleições.
O que realmente importa para os eleitores é o prefeito, o governador e o presidente da república. Eles representam o poder real de construir estradas, hospitais, escolas, proporcionar empregos e aumentar, ou diminuir, salários.
Deputados e vereadores ou são eleitos como auxiliares dos executivos, ou são votados mediante alguma vantagem material proporcionada pelos candidatos ou pelos cabos eleitorais. Os brasileiros na sua grande maioria talvez saiba, através da mídia, da importância da Câmara dos Deputados para a governabilidade. Mas não liga essa importância à eleição do “seu” deputado federal. E muito menos tem consciência de que o seu voto num candidato de um partido vai ajudar a eleger outro do mesmo partido da mesma coligação ou federação. E menos ainda que o deputado eleito estaria, em princípio, comprometido com o programa do partido ao qual ele pertence. E que em certos casos o partido é que determinará o comportamento daquele deputado na casa legislativa à qual pertence.
E dessa forma, nem eleitores e nem os próprios eleitos parecem compreender a importância dos partidos e dos parlamentos.
Por tudo isso é que o novo Programa do PSB no capítulo referente à Reforma Política defende que “para assegurar o fortalecimento dos partidos e dos Poderes Legislativos Municipais, Estaduais e Federal, as eleições legislativas ocorram em períodos distintos das eleições que elegem os cargos executivos- prefeitos , governadores e presidente da república”.
Separar as eleições legislativas das que se destinam a eleger os cargos executivos seria, assim, um primeiro passo para valorizar os partidos enquanto organizações políticas ideologicamente definidas, reduzir os fatores de corrupção eleitoral, proporcionar maior legitimidade aos mandatos parlamentares e aos próprios poderes legislativos.
Nas eleições legislativas os programas dos partidos teriam naturalmente um maior destaque e seriam legitimados democraticamente pela sociedade.E isso significa valorizar e fortalecer a democracia.
Domingos Leonelli
Secretário Nacional de Formação Política do PSB