O ex-governador do Rio de Janeiro Wilson Witzel afirmou nesta quarta-feira (16), em depoimento à CPI da Pandemia do Senado, que os prefeitos e governadores ficaram “desamparados” e sem canal de diálogo com o governo federal durante a pandemia do coronavírus, que se iniciou entre fevereiro e março de 2020.
Witzel, cujo mandato foi cassado devido a acusações de corrupção na área da saúde, criticou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), a quem ele se opõe no cenário político. Na versão do depoente, o chefe do Executivo federal “politizou” a pandemia e criou “narrativas” de enfrentamento aos governos locais por divergências em relação a temas como o isolamento social.
O ex-governador fluminense compareceu à comissão na condição de testemunha convocada. Ele optou por não fazer uso do direito a habeas corpus deferido na terça-feira (15) pelo ministro Kassio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF).
A decisão da Corte autorizava o depoente a se ausentar, sob argumento de que ele teria o direito de “não produzir provas contra si mesmo”, pois já é investigado pelo Ministério Público Federal do Rio de Janeiro (MPF-RJ).
“Os governadores, prefeitos de grandes capitais e de pequenas cidades, ficaram totalmente desamparados do apoio do governo federal. É uma realidade inequívoca que está documentada em várias cartas que nós encaminhamos ao presidente. Fizemos várias reuniões suplicando ao presidente da República que nos atendesse, que pudéssemos conversar para encontrar soluções em conjunto, soluções que outros países encontraram”.
Wilson Witzel
Witzel diz que foi atacado por governo Bolsonaro
Segundo Witzel, nas poucas reuniões que teriam ocorrido com Bolsonaro, houve percepção coletiva de que a chefia do governo federal se empenhava em politizar o assunto e transformar governadores em rivais. “[O governador de São Paulo João] Doria foi frontalmente atacado de forma descortês”.
Witzel disse ainda ter feito pedidos de ação conjunta entre o Executivo e os governos estaduais, o que, segundo ele, não foi acatado. O depoente também defendeu a ação de governadores.
“Desde o início do controle da pandemia, buscamos tomar as medidas de acordo com as orientações da OMS (Organização Mundial da Saúde)”.
Wilson Witzel
Witzel diz que caso Marielle provocou cassação
O ex-governador também usou o espaço de fala na abertura da audiência da CPI da Pandemia para se defender das acusações pelas quais teve o mandato cassado. Na versão dele, o impeachment foi resultante de uma suposta tentativa de perseguição política relacionada às investigações do caso Marielle Franco, vereadora carioca assassinada em 2018.
“Tudo isso começou porque eu mandei investigar sem parcialidade o caso Marielle. Quando foram presos os dois executores da Marielle, o meu calvário e a perseguição conta mim (foram) inexoráveis”. Wilson Witzel
A argumentação de Witzel, que faz parte de uma estratégia de defesa, não é baseada em fatos apurados pelas instituições competentes.
Anielle Franco rebate Witzel nas redes
A irmã de Marielle Franco, a professora Anielle Franco, rebateu as declarações de Wilson Witzel à CPI da Pandemia nas redes sociais. A diretora do instituto que leva o nome da vereadora executada em 2018, relembrou que Witzel participou de um ato de vandalismo, quebrando a placa da rua com o nome de Marielle Franco e escreveu que o ex-governador deveria assumir seus atos.
Impeachment
A cassação do mandato de Witzel foi confirmada por um tribunal especial misto (formado por deputado estaduais do Rio e desembargadores) em 30 de abril deste ano. Ele foi condenado, por unanimidade, pelo crime de responsabilidade após denúncias de corrupção durante a pandemia. Witzel nega ter cometido irregularidades.
Na CPI da Pandemia, senadores esperam ouvir de Witzel detalhes sobre a destinação e aplicação de verbas federais para custeio de ações de enfrentamento à covid-19. Esse é um dos pontos de interesse da comissão, sobretudo da ala formada por congressistas aliados ao governo Bolsonaro.
Com a pressão para ampliar o escopo da investigação e abranger governadores e prefeitos, os parlamentares da “tropa de choque bolsonarista” tentam amortecer o impacto do foco nas ações e eventuais omissões do Ministério da Saúde no decorrer da crise sanitária.
Quebra de sigilos de Carlos Wizard
Os senadores da CPI da Pandemia aprovaram nesta quarta-feira (16) uma série de requerimentos, entre eles o que promove a quebra de sigilos fiscal e bancário do empresário Carlos Wizard. O empresário já teve na semana passada seus sigilos telefônicos e telemáticos quebrados pela comissão. A nova quebra é vista como uma forma de pressão, uma vez que enxergam que o empresário busca obstruir a apuração dos fatos que o envolvem.
O empresário bilionário é apontado como um dos integrantes do chamado “gabinete paralelo”, centro de aconselhamento do presidente Jair Bolsonaro na pandemia e que pregava o negacionismo, em particular a defesa da hidroxicloroquina e a recusa à vacina.
O “gabinete paralelo”, ao largo do Ministério da Saúde, são médicos, atuais e ex-assessores palacianos, um empresário bilionário e até um congressista que desprezaram a importância da vacina e enalteceram, em sintonia com Bolsonaro, a defesa de medicamentos sem eficácia comprovada contra a covid.
Wizard tem depoimento marcado na comissão para esta quinta-feira (17), mas se encontra fora do país e pediu para que sua oitiva fosse no formato virtual. O presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM), recusou o pedido e afirmou que todos os que se ausentarem terão suas intimações solicitadas ao um juiz penal da localidade. Essa solicitação deve conter pedido de condução coercitiva e a retenção do passaporte.
Retirada de outros sigilos
A CPI também aprovou a retirada do sigilo de parte dos documentos encaminhados à comissão como “sigilosos” pelos órgãos de origem. O objetivo da medida é facilitar a análise das informações pelos senadores.
A reclassificação dos documentos, requerida pelo relator da comissão, senador Renan Calheiros (MDB-AL), já havia sido aprovada; na reunião desta quinta foi aprovada uma proposta de reclassificação, feita após análise dos documentos pela Consultoria Legislativa e pela secretaria da comissão. Da lista constam documentos enviados pelos ministério da Saúde e das Relações Exteriores, pela Fiocruz e por empresas privadas. Eles foram considerados de interesse público, sem justificativa para o sigilo.
Otto Alencar critica Bolsonaro na CPI
Em entrevista à SIC TV, afiliada à RecordTV, em Rondônia, cedida na terça-feira (15), Bolsonaro voltou a atacar a CoronaVac e mentiu mais uma vez ao dizer que a vacina contra a covid-19 desenvolvida pelo Instituto Butantan em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac não tem comprovação científica. A entrevista foi favorável ao presidente, sem contestações às suas falas.
“A segunda mais usada aqui no país, a CoronaVac, o prazo de validade dela é em torno de 6 meses, e muita gente tem tomado e não desenvolve anticorpo nenhum. Então, essa vacina não tem comprovação científica ainda.”
Jair Bolsonaro
O senador Otto Alencar (PSD-BA) criticou a declaração de Jair Bolsonaro contra a vacina CoronaVac na CPI da Pandemia. Alencar comentou que o presidente da República colocou em dúvida a eficácia da vacina. O senador avalia que Bolsonaro não sabe como é fazer uma vacina e que a população que o segue pode achar que não imuniza.
“Ele não tem conhecimento, não é médico, e fala de forma irresponsável para confundir o povo brasileiro”. Otto Alencar
Alencar reforçou que o embate com o Estado chinês pode, inclusive, afetar a chegada de insumos para o Brasil. Pede que os brasileiros não levem em conta as afirmações do presidente.
Com informações do Uol, Folha de S. Paulo e Agência Senado