Uma pesquisa realizada pelo movimento Girl Up aponta que uma em cada quatro adolescentes brasileiras não tem acesso a absorventes durante o período menstrual. O estudo, denominado Livre para Menstruar, também investigou as condições de higiene destas meninas e descobriu que 20% delas não tem água em casa. Além disso, cerca de 213 mil estudam em escolas nas quais os banheiros não estão em condições de uso e apresentam falta de sabonete, papel higiênico e, até mesmo, de uma pia.
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O saneamento básico, o acesso aos produtos de higiene e, principalmente, a informação, são as soluções possíveis para reduzir o número de adolescentes que passam por este problema mensalmente. Beatriz Diniz, 19, uma das líderes do Girl Up, afirmou em entrevista ao jornal Folha de São Paulo que a chamada pobreza menstrual afeta diretamente o desempenho escolar das garotas.
“Muitas meninas faltam às aulas todos os meses por não ter absorvente”, citou ela. A estimativa da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre esse fato é de que uma a cada 10 meninas no mundo deixe de ir a escola durante a menstruação.
#AbsorventeUrgente
Foi durante uma campanha de distribuição de alimentos, realizada no ano passado pelo Girl Up em comunidades vulneráveis, que Beatriz percebeu que, por serem considerados artigos de beleza, os absorventes não faziam parte das cestas básicas. Mas, para ela, nenhuma mulher deve ser privada de um item tão importante. “Se feijão é essencial, por que absorvente não é?”, questionou.
Pensando em uma forma efetiva de ajudá-las, Beatriz criou o movimento #AbsorventeUrgente, que arrecadou e distribuiu 60 mil absorventes de diversos tipos. Porém, como a menstruação é um evento mensal, seria necessário uma ação mais efetiva e contínua para garantir a dignidade menstrual dessas mulheres.
“Vimos que seria preciso uma nova vaquinha para o mês seguinte, então entendemos que o estado deveria garantir o direito à higiene menstrual e botamos o pé no assunto”, conta Beatriz.
Deputado socialista parceiro
Elas então decidiram que iriam lutar para que fosse desenvolvida uma política pública que atendesse essa demanda. Começaram a fazer contato com diversos partidos políticos e parlamentares para conseguir apoio. Com alguns, conseguiram se encontrar, ou conversar por videoconferência, o que as ajudava a aprender cada vez mais sobre os caminhos da aprovação de um projeto tão significativo.
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“Estávamos sempre nervosas, pois não sabíamos o que era um Projeto de Lei; era algo inédito para um grupo de meninas entre 14 e 19 anos”.
Após várias reuniões, se encontraram com o então deputado estadual Renan Ferreirinha (PSB-RJ). Ele é o atual secretário municipal de Educação do Rio de Janeiro e se uniu ao grupo para que a ideia se tornasse lei. Em julho, a Lei 8924/2020 foi aprovada por unanimidade. Desde então, o absorvente é considerado um item básico e obrigatório nas cestas básicas de todo o estado.
@absorvidas
Por meio dos dados, já está claro que diversas mulheres na sociedade não têm condições de manter a higiene menstrual. Junto com elas, as que estão marginalizadas ou abandonadas em penitenciárias de todo o Brasil também pouco podem fazer para escapar desta realidade. Pensando nisso, Giullia Caldeira, 18, se sensibilizou e resolveu ajudar.
“É degradante porque elas se veem obrigadas a usar qualquer pedaço de pano, jornal e até miolo de pão para conter o sangramento”, dise a ativista à Folha.
A jovem mobilizou suas redes e conseguiu arrecadar R$ 30 mil na campanha “Absorvidas”. Todo o dinheiro foi utilizado na compra de absorventes que foram distribuídos para as apenadas. Porém, assim como Beatriz, Giullia buscou uma solução permanente para a questão. Com isso já está em andamento a utilização do bioabsorvente. Ele é feito de tecido, portanto reutilizável, e pode ser confeccionado com material que impede a proliferação de bactérias.
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O novo projeto também vai atender ao critério educacional necessário para empoderar essas mulheres em relação aos seus ciclos menstruais. Segundo Beatriz, assim que as condições sanitárias do país se normalizarem, vai ser iniciada a distribuição dos artigos e os ciclos de palestras informativas nas unidades. Outra ideia que, se depender da obstinação de Giullia, vai sair do papel, é a utilização das máquinas de costura das prisões. Desta forma, além de uma ocupação as próprias detentas cuidariam da produção desses bioabsorventes, garantindo assim a distribuição ampla entre as internas.
“Se não for assim, daqui a dois anos lutaremos a mesma batalha. Eu não quero que o projeto seja um curativo bonito em um sistema que não funciona”, afirmou ela.