A simbologia nazista criada durante o Terceiro Reich é uma dos signos mais fortes e identificáveis da história. A suástica e a cruz de ferro, as duas das mais famosas, são imagens facilmente reconhecíveis. Contudo, simpatizantes desses movimentos extremistas têm buscado alternativas para se expressar.
Recentemente, após a eclosão da guerra entre Rússia e Ucrânia, tem se falado sobre a atuação de grupos neonazistas ucranianos. Eles ganharam projeção durante os protestos no país em 2014 e, sob leniência do presidente do presidente Volodymyr Zelensky, atualmente estão nas fileiras das Forças Armadas ucranianas. Os mais conhecidos são o Batalhão de Azov e o Pravyi Sektor que, inclusive, se tornou um partido político.
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Nos últimos dias, começaram a vir à tona imagens de militares ucranianos utilizando símbolos extremistas. Um soldado da Ucrânia, por exemplo, foi fotografado, no último domingo (6), em Irpin, usando um bordado com um símbolo nazista conhecido como “sol negro” em sua farda.
O sol negro, também conhecido como “Black Sun”, remete ao ocultismo nazista. Uma representação desse símbolo antigo se encontra incorporada em um mosaico de um piso no castelo Wewelsburg, na Alemanha, feito durante o regime de Adolf Hitler. A figura é composta de três suásticas sobrepostas, aumentando a identificação com o nazismo.
A Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), inclusive, escolheu a imagem de uma militar ucraniana com um sol negro no uniforme para simbolizar o Dia Internacional da Mulher, celebrado em 8 de março. Após diversas críticas, vindas de usuários das redes sociais de diferentes países, a entidade removeu a imagem e a postagem de suas redes.
O agrupamento nazista do exército ucraniano, o Batalhão de Azov, por exemplo, leva o sol negro em sua bandeira, que também contém uma figura que se assemelha a um tridente — outro símbolo associado ao nazismo na Ucrânia, que se parece com o design da SS, sigla para Schutzstaffel, a polícia especial de Hitler, e a própria suástica.
Esses são apenas alguns exemplos de simbologias adotadas por grupos neonazistas que vão para além das óbvias. Há, no entanto, inúmeras outras figuras e gestos que ligam simpatizantes do nazismo em todo mundo, e esses código são chamados de “dog whistle” (em português, “apito de cachorro”) — um tipo de linguagem que, para a população geral ou leigos, parece significar uma coisa, mas que na prática quer dizer outra.
No Brasil também houveram manifestações nazistas com a utilização de símbolos ou gestos menos conhecidos pela sociedade. Uma dessas situações foi observada quando o assessor de Bolsonaro para assuntos internacionais, Filipe Martins, fez com as mãos, em uma sessão do Senado, o símbolo de “white power” (em português, “poder branco”), e se justificou dizendo que estava ajeitando a lapela do paletó. Outro exemplo conhecido é quando o blogueiro bolsonarista Allan dos Santos fez uma live tomando um copo de leite – outro gesto encampado por neonazistas em todo o mundo.
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É importante ressaltar que, assim como em boa parte do mundo, a apologia ao nazismo é crime no Brasil previsto no artigo 1º da Lei 7.716/89, com pena de reclusão de 1 a 3 anos, além de multa. A legislação considera apologia ao nazismo fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas e objetos de divulgação nazistas.
E para saber identificar e reconhecer símbolos que são identidade de grupos ou manifestações extremistas, é necessário conhecê-los antes.
Númerologia extremista
Os números 14 e 88 também são comumente encontrados como simbologia em grupos de extrema-direita. Segundo David, o 14 representa um discurso do teórico neonazista estadunidense David Lane, conhecido como “As 14 Palavras”, que são “Devemos assegurar a existência de nosso povo e um futuro para as crianças brancas”.
O 88 é uma referência ao H, oitava letra do alfabeto, que em dupla forma HH, abreviação de “Heil Hitler“, famosa saudação nazista.
Resgate e resignificação de símbolos pagãos
Uma das alternativas dos neonazistas foi recorrer às insígnias pagãs. “Desde a época do Terceiro Reich, os nazistas cultuavam o paganismo. Existia uma organização secreta chamada Sociedade Thule, da qual Hitler fazia parte e que realizava rituais pagãos entre outras posturas que remetiam ao nacionalismo germânico. As runas do alfabeto nórdico eram muito utilizadas como símbolo, e mais tarde, o neonazismo resgatou-as para usar como símbolo, porque são menos identificáveis”, conta o sociólogo e pesquisador histórico David Vega.
Segundo o pesquisador, uma das mais utilizadas é a Runa de Odal. O símbolo significa sangue e solo. “Não importa em qual lugar do mundo a pessoa nasça, se ela tem sangue ariano, pertence ao seu solo de origem. É um ideal de nacionalismo racialista”, completa.
Em sua origem, a runa era um signo de uma religião pagã chamada Odinismo, que não possuía nenhuma relação com manifestações nazifacistas. Entretanto, após a apropriação por parte destes grupos, o símbolo recebeu significação extremista.
Uma variação da cruz celta é outro símbolo pagão bastante utilizado pelos grupos extremistas. “Os Celtas foram uma civilização com diversas tribos que existiram praticamente em toda a Europa, desde os lusitanos e celtiberos na península ibérica, até os caledônios, bretões e gauleses. Esse símbolo que remete às cruzes dos antigos cemitérios celtas praticamente substituiu a suástica hoje. Todos os grupos white power e nacionalistas raciais usam ela”, afirma Vega.
O Wolfsangel, ou Runa do Lobo, que remete a uma armadilha de lobos usada pelos vikings, é um símbolo associado ao nazismo desde a época de Hitler. A marca, mais tarde, foi resgatada pelos neonazistas.
Variações de símbolos antigos
O Totenkopf — caveira em alemão —, é um símbolo militar da Prússia, e foi resgatado durante o terceiro Reich como insígnia da SS, o braço armado do Partido Nazista. Apesar de não ser tão famoso quanto a suástica, é um ícone bastante comum entre os grupos extremistas.
O “sol negro”, que é formado por várias suásticas juntas, era o símbolo da Thule, a organização secreta ocultista criada antes do Terceiro Reich e continua sendo usada até hoje como símbolo nazista, afirma David. “Na manifestação da Virgínia, várias bandeiras com o sol negro foram vista”, completa Vega.
O “sigma” (Σ), oitava letra do alfabeto grego, é também o símbolo da principal vertente do fascismo no Brasil, o Integralismo. A organização foi criada em 1932 por Plínio Salgado, o movimento integralista tinha adotado algumas características dos movimentos europeus de massa da época, especificamente do fascismo italiano.
Crescimento do neonazismo no Brasil
Grupos neonazistas trazem de volta a sombra da suástica nazista, que avança no Brasil do presidente Jair Bolsonaro (PL). Empoderados pelo discurso racista, anticomunista, armamentista e LGBTfóbico do mandatário, grupos radicais de extrema direita e de inspiração em Hitler proliferam nas redes e até se arriscam a se mostrar em pequenos grupos nas ruas com bandeiras, palavras de ordem e, por vezes, violência. O crescimento dessa vertente de ultradireita no país durante o governo Bolsonaro pode ser quantificado na internet.
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Em entrevista ao Fantástico exibida em janeiro, a antropóloga Adriana Dias revelou que existem atualmente pelo menos 530 núcleos neonazistas no Brasil com cerca de 10 mil pessoas ativas.
Um mapa elaborado por uma equipe de estudiosos revelou que as células de grupos neonazistas cresceram 270,6% no Brasil entre janeiro de 2019 e maio de 2021, e se espalharam por todas as regiões do país, impulsionadas pelos discursos de ódio da extrema-direita contra as minorias representativas, amparados pela falta de punição.
Segundo a antropóloga, a maioria dessas pessoas se identificam abertamente como neonazistas e têm em comum o ódio contra feministas, judeus, negros e a população LGBTQIAP+.
“Eles começam sempre com um ódio ao feminino. Eles têm antissemitismo, eles têm ódio a negro, eles têm ódio a gays, ódio a nordestinos, ódio a imigrantes, negação do holocausto”, declarou.
Em outro levantamento realizado em junho de 2020 pela ONG Safernet, que promove os direitos humanos na rede e monitora sites radicais, em maio do mesmo ano foram criadas 204 novas páginas de conteúdo neonazista. Em maio de 2019 eram 42 páginas e 28 páginas em maio de 2018. Segundo a organização, há uma relação de causalidade entre o que diz e faz o presidente e esta radicalização nas redes. Em nota, a entidade afirmou ser “inegável que as reiteradas manifestações de ódio contra minorias por membros do Governo Bolsonaro têm empoderado as células neonazistas no Brasil”.
Com informações da Revista Fórum e UOL