
O Partido Socialista Brasileiro (PSB) anunciou que vai protocolar no início desta semana uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para suspender a execução das emendas do “orçamento secreto”. O esquema foi criado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para aumentar sua base de apoio no Congresso em troca de liberação de recursos.
O Cidadania e o PSOL também vão ingressar com ações na Suprema Corte. Os partidos apontam inconstitucionalidade na utilização de verbas reunidas por emenda de relator-geral (RP9).
Segundo o líder da Oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) que o PSB irá apresentar, o partido solicitará ao STF que determine a publicidade das indicações enviadas ao governo pelo relator-geral. O objetivo é que o Congresso ou o próprio governo sejam obrigados a divulgar a lista com os autores reais dos convênios e contratos de repasse e termos de execução descentralizadas firmados pelo Executivo com recursos de emenda de relator-geral.
“Pediremos uma liminar para impedir a execução de todas as emendas de relator (RP9). No mérito, o PSB pedirá o reconhecimento da inconstitucionalidade da prática de se desvirtuar as emendas de relator, que não possuem previsão constitucional para dotação orçamentária e não atendem à regra da transparência e impessoalidade da administração”.
Alessandro Molon
Outros partidos querem travar “orçamento secreto”
O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) contou ao jornal O Estado de S. Paulo o teor da ADPF que o partido Cidadania deve protocolar. O objetivo é paralisar os repasses de RP9 previstos para 2021.
Para o senador, a execução favorece políticos, estados e municípios sem que haja nenhum controle efetivo, o que desrespeita princípios básicos da gestão pública, como o da impessoalidade e da eficiência, ambos com previsão constitucional.
“Pedimos, como liminar, que seja suspensa a execução de verbas RP9 até que haja uma regulamentação administrativa ou legal, com critérios objetivos mínimos para que esse repasse respeite os princípios da impessoalidade e eficiência”, diz o Vieira.
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Em entrevista ao Estadão, o professor de Direito Tributário da Universidade de São Paulo (USP) Heleno Taveira Torres disse que a utilização de emenda de relator para essa finalidade é inconstitucional por serem regimes excepcionais ao Orçamento.
“Cabe ao STF, se provocado, suspender de imediato a execução. A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) não tem competência para criar despesas por ‘emendas de relator’, que só serviram para evitar as restrições quantitativas e materiais, como a de reservar 50% para a Saúde”, afirmou.
O PSOL também vai ingressar com ADPF, determinando a ampla transparência e publicidade da destinação dos recursos, inclusive os beneficiários e o detalhamento dos critérios de distribuição.
TCU quer explicações sobre o “Bolsolão”
O ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Walton Alencar Rodrigues, relator das contas de 2020 da Presidência da República, exigiu que o Palácio do Planalto e o Ministério da Economia entreguem cópias dos documentos ainda ocultos do orçamento secreto.
A decisão de abrir a caixa-preta do “Bolsolão” inclui a exigência de entrega de ofícios de deputados e senadores, papéis até agora mantidos em sigilo, que formalizaram o direcionamento de bilhões de recursos de emendas de relator-geral do orçamento a redutos eleitorais.
O ministro atendeu recomendação da área técnica que apontou “possível afronta aos princípios da impessoalidade, imparcialidade e equidade na distribuição dos recursos da União” e destacou que “a LDO proíbe a utilização das emendas para influenciar votos no Congresso”.
Especialistas comentam o “Bolsolão”
O Estadão entrevistou 16 renomados advogados, professores e economistas especializados em contas públicas para discutir o esquema. Todos defendem investigação rigorosa e, entre eles, incluindo o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, há quem fale em indícios de crime de responsabilidade. A configuração pode levar ao impeachment do presidente Jair Bolsonaro por infração às leis orçamentárias e à Constituição.
Também é unânime a opinião segundo a qual o esquema criado por Bolsonaro é um retrocesso nos avanços obtidos após o escândalo dos Anões do Orçamento, que, na década de 1990, desviou recursos de emendas.
Em 2019, Bolsonaro criou um mecanismo que permitiu a um grupo mandar bilhões de reais de emendas de relator (RP9) para suas bases eleitorais, tudo de forma sigilosa. Uma engenharia questionada pelos analistas. Isso contraria a Constituição, que estabeleceu que o princípio da transparência deve reger a elaboração e a execução do Orçamento.
Entre as atribuições do Congresso, uma das mais nobres é a aprovação do orçamento federal. É na lei orçamentária que, a cada ano, o País decide suas prioridades, em termos de alocação de recursos para políticas públicas, na busca do desenvolvimento e da melhoria do padrão de vida de seus habitantes.
Com informações do jornal O Estado de S. Paulo