
A ideia do presidente Jair Bolsonaro (PL) de, se reeleito, ampliar de 11 para 16 o número de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) foi colocada em prática apenas uma vez na história da República: durante 4 dos 21 anos da ditadura militar (1964-1985).
Leia também: Brasil é rebaixado no ranking de combate à corrupção da OCDE
A medida, imposta pelo Ato Institucional nº 2 (AI-2), de 27 de outubro de 1965, e durou até 1969. Neste período, três ministros da Corte sem ligação com os militares foram cassados, diminuindo ainda mais o poder de atuação do Judiciário.
“Apesar de a pressão constante dos militares sobre a Corte — inclusive na nomeação de novos ministros —, não era interessante ao regime chegar ao ponto de fechá-lo, porque isso configuraria a ditadura na sua forma mais primitiva. Por isso, o Supremo permaneceu aberto, mas sob a extrema ingerência dos militares”, diz o site do STF.
Bolsonaro nega querer controlar o Judiciário. Segundo ele, a ideia é combater um suposto “ativismo judicial”, principalmente por parte do ministro do Supremo Alexandre de Moraes, que também preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Mudanças para o bel-prazer de Bolsonaro
Caso Bolsonaro se reeleja e consiga essa ampliação, contaria com maioria ampla na Corte: além dos já indicados Nunes Marques e André Mendonça, ele teria mais dois nomes para escolher para as vagas de Ricardo Lewandowski e de Rosa Weber, que se aposentam no ano que vem.
Com mais cinco vagas, teria nove indicações diretas — em uma possível corte de 16 —, diminuindo a independência do Judiciário.
Ministros aposentados criticam proposta
Para o ministro aposentado do STF, Marco Aurélio Mello, a proposta de elevar a quantidade de ministros para 16 é “saudosismo puro” da ditadura militar. “No regime de exceção houve o aumento para 16 (AI-2). Logo a seguir a razão imperou.”
Celso de Mello, também ministro aposentado do Supremo, disse em nota nesta segunda-feira (10) que a proposta de Bolsonaro tem como objetivo, na realidade, a “perversa e inconstitucional finalidade de controlar o STF e de comprometer o grau de plena e necessária independência” do sistema Judiciário.
No domingo (9), Bolsonaro ameaçou, afirmando que se o tribunal “baixar um pouco a temperatura“, pode desistir da ideia.
Venezuela e Hungria
A ideia de mudar a composição de magistrados remete a ações tomadas por ditaduras pelo mundo. Na Hungria, o autocrata Victor Orban voltou a liderar seu país em 2010. Desde então, ele tomou uma série de medidas que sufocaram a independência do Judiciário, entre elas estão a transferência de atribuições para um órgão liderado por aliados de seu regime e a redução da idade de aposentadoria compulsória de juízes de 70 para 62 anos.
Isso abre espaço para a presença de nomes alinhados com o governo.
Sob pressão da União Europeia, a redução da idade foi revogada, mas, como não foram dadas garantias aos magistrados que haviam sido retirados, a maioria deles optou por não voltar à ativa.
Na Venezuela, dirigida pelo ditador Nicolás Maduro, a Suprema Corte assumiu as funções do Legislativo. Na prática, o tribunal pôde escrever as próprias leis ou indicar um órgão que passe a legislar no lugar da Assembleia.